sábado, 27 de outubro de 2018

Em defesa da moralidade


O Supremo Tribunal Federal decretou o fim do irregular pagamento de aposentadorias concedidas aos ex-governadores e da pensão às viúvas de ex-governadores da Paraíba.
O benefício havia sido aprovado, em 2006, pela Assembleia Legislativa daquele estado e beneficiava, até então, seis ex-governadores e oito viúvas de ex-governadores.
A aludida medida havia sido impetrada pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), por meio do ajuizamento de Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin), questionando a constitucionalidade da concessão do benefício de que se trata, que tinha por base a remuneração do governador em exercício.
A OAB também ajuizou outras Adins semelhantes, com questionamento sobre a constitucionalidade do pagamento de aposentadorias e pensões a ex-governadores e viúvas de ex-governadores dos estados do Pará, Acre, Amazonas, Rondônia, Sergipe, Paraná, Rio Grande do Sul e Piauí.
Esses benefícios vinham sendo pagos, naquele estado, a ex-governadores e viúvas de ex-governadores, em valores que variavam desde R$ 2.850,00 até R$ 23.500,82.
Na verdade, a despesa pertinente à aposentadoria de ex-governadores da Paraíba e dos demais estados jamais pode ser considerada legal senão nas republiquetas, onde não são respeitados os consagrados princípios constitucional e legal, como nos casos em referência.
Ocorre que a sua fundamentação legal não se sustentava como firme, por não se conformar com os princípios constitucionais que exigem que proventos da aposentadoria e pensões devam ser se estribar no estrito e indispensável cumprimento do requisito de tempo de serviço, que, na forma da legislação previdenciária ou estatutária do servidor público gira em torno de 30 e 35 anos, respectivamente para mulheres e homens, salvo em casos especiais de insalubridades.
Não há a menor dúvida de que o pagamento dos benefícios cancelados se caracterizava como verdadeira esbórnia com o dinheiro do contribuinte, porque a situação específica de ex-governador era tratada com total excepcionalidade, por ele passar a ter direito a proventos da aposentadoria ou ainda, da pensão, no caso da viúva de ex-governador, a partir do momento que deixava o cargo, sem a exigência do tempo mínimo de trinta e cinco anos e quiçá sem o devido recolhimento da contribuição previdenciária correspondente.
Esse ex-servidor tido por diferenciado dos demais trabalhadores deveria ter a consciência cívica de entender que a sua situação era tratada completamente à margem dos trabalhadores brasileiros, em qualquer categoria, a quem não se concede proventos da aposentadoria antes dos 35 anos de tempo de serviço, observada a obrigação do recolhimento da contribuição previdenciária pertinente, salvo nos casos excepcionais previstos em lei, diante da sua qualificação como homem público, que deveria dar bons exemplos de honestidade e dignidade, não aceitando o pagamento de benefício indiscutivelmente inconstitucional.
É de se lamentar que o Supremo, já tendo firmado entendimento pela inconstitucionalidade do indecente pagamento desses benefícios, adotado em casos semelhantes ao do ex-governador em referência, deveria ser mais sensível quanto à priorização sobre os julgamentos das demandas vergonhosas e espúrias, por serem contrárias ao interesse público, quando eles fogem do regramento aplicável à espécie. em clara afronta à dignidade dos verdadeiros trabalhadores brasileiros, eis que se trata, à toda evidência, de situação completamente irregular, ilegítima e contrária aos princípios da administração pública.
O poder Judiciário tem o dever constitucional e legal de evitar que os cofres públicos continuem sendo sacrificados com pagamentos de despesas absolutamente sem o devido amparo legal, justamente por terem por base dispositivos constitucionais ou legais aprovados à margem dos conceitos de moralidade, racionalidade e de civilidade, por se tratar de casos excepcionais, diante de concessão com notório viés inaceitável e injustificável e constituir privilégio para alguma casta de servidor que não possui qualificação constitucional para ser beneficiário de tamanha diferenciação quanto ao tratamento que deve ser dado indistintamente aos servidores públicos, em conformidade com os princípios constitucionais da isonomia e da igualdade.
Tratava-se de caso esdrúxulo, imoral e desonesto, por não se compatibilizar com a situação exigida para a aposentadoria dos brasileiros, que são obrigados ao pagamento de, pelo menos, trinta e cinco anos de contribuição previdenciária para ter o direito de se aposentarem.
Infelizmente, essa inaceitável exceção à regra somente acontece com aqueles que não se envergonham de se beneficiar dos cofres públicos e se profissionalizam na política justamente em razão das vantagens e das facilidades propiciadas por ela, como, inexplicavelmente, no caso em comento, em que bastava ser governador, por contagem mínima de tempo, até mesmo por motivo de substituição, para depois se aposentar, de forma irregular.
Aliás, a essência da política poderia ser valorizada e engrandecida se as pessoas públicas tivessem por princípio o culto às salutares condutas ética e moral, como forma de satisfazer e atender somente ao interesse público.
A sociedade anseia por que os políticos brasileiros se conscientizem sobre a necessidade do supremo respeito aos regramentos constitucional e legal, não podendo se beneficiar de qualquer forma de privilégio, por haver nisso cristalina contraposição aos salutares princípios da ética, moralidade, legalidade, isonomia, dignidade, juridicidade, entre outros aplicáveis indistintamente aos brasileiros.
É evidente que a decisão em comento passa a viger a partir da data da publicação do acórdão pertinente, mas, a bem da verdade jurídica, ela deveria retroagir à data da concessão, para possibilitar o devido ressarcimento dos valores pagos indevidamente, diante da sua inconstitucionalidade e isso teria efeito jurídico e disciplinar muito importante, porque serviria de lição pedagógica, no sentido de que a despesa pública somente poderia ser autorizada com base nos regramentos constitucional e legal.   
À toda evidência, a respeitável decisão do Supremo Tribunal Federal tem o condão de corrigir, com injustificável demora, gritante aberração jurídica e recompõe a imperiosa situação de normalidade e moralidade na administração pública, que não pode continuar compactuando com situações de inconstitucionalidade repudiadas pela sociedade e pelos salutares ditames constitucional e legal. Acorda, Brasil!
Brasília, em 27 de outubro de 2018

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