terça-feira, 4 de julho de 2017

Clamor por justiça?

Depois que um ministro do Supremo Tribunal Federal houve por bem revogar a decisão que o afastara do mandato, o senador tucano disse que recebeu com "absoluta serenidade" a decisão em apreço.
O senador mineiro afirmou que "Sempre acreditei na Justiça do meu país e seguirei no exercício do mandato que me foi conferido por mais de 7 milhões de mineiros, com a seriedade e a determinação que jamais me faltaram em 32 anos de vida pública".
O senador foi gravado por um empresário do grupo JBS, pedindo R$ 2 milhões e falando sobre iniciativas no Senado para frear as investigações da Operação Lava-Jato.
A citada gravação serviu de base para a decretação pelo Supremo do afastamento de seu mandato e o pedido de sua prisão pela Procuradoria Geral da República, mas ele não foi acatado pela Justiça.
O ministro do Supremo, além de revogar a decisão sobre o citado afastamento, tornou sem efeitos as medidas cautelares impostas anteriormente, sob a justificativa de que o Judiciário não poderia interferir no Legislativo.
A decisão em apreço foi tomada no último dia de atividade da Justiça antes do recesso do Judiciário, cujo fato serviu de argumento para a liberação geral das restrições impostas ao senador, que passará a ter o restabelecimento de seus vencimentos e demais benefícios inerentes ao cargo que ocupa.
A decisão em comento, além de surpreendente, causou repercussão bastante negativa no seio da opinião pública, principalmente porque não surgiu nenhum fato novo com relação ao objeto causador do afastamento dele do mandato de senador.
Tal decisão também põe por terra o pronunciamento empolgado da presidente do Supremo, que havia dito, momentos antes do decisum, que, in verbis: ‘Não seremos ausentes aos que de nós esperam atuação rigorosa para manter sua esperança de justiça”, no dia em que a Corte devolveu, sem mais nem menos, o mandato do senador tucano, contradizendo e desmoralizando o que poderia ter sido empolgante pronunciamento.
A presidente havia sido ainda mais lúcida quanto à atuação do Supremo, ao afirmar que “o clamor por justiça que hoje se ouve em todos os cantos do país não será ignorado em qualquer decisão” daquele órgão.
No seu pronunciamento, a ministra também afirmou que os ministros tiveram sempre a atribuição “de assegurar a igual observância da lei por todos. Somente então se terá equilíbrio nas relações sociais, segundo a ideia de justiça constitucionalmente definida”.
Os brasileiros se esforçam para acreditar no trabalho do Supremo, inclusive nas palavras da sua presidente, como visto acima, mas algumas decisões de determinados ministros e principalmente a morosidade nos seus julgamentos conspiram contra o desejo dela de se assegurar rigorosa atuação da Justiça.
Os referidos fatos, por certo, contribuem para o descrédito e a desesperança quanto à missão institucional daquela Corte, diante da perplexidade de muitas decisões contrárias ao interesse público, a exemplo da soltura de criminosos julgados pela Lava-Jato, como o ex-ministro da Casa Civil de governo petista, e desse caso do senador tucano, como se os crimes por eles cometidos não tivessem a menor gravidade à normalidade cívica nem afrontassem os princípios republicano e democrático.
A presidente do Supremo precisa saber que suas belas palavras devem ser ouvidas pelos ministros e tocadas nas consciências deles, para que elas possam ser efetivamente transformadas no desiderato por ela preconizado, a de que o clamor por justiça seja realmente ouvido e interpretado exatamente com a ressonância do anseio dos brasileiros de moralização geral, ampla e irrestrita, sob pena de se permitir que ministros do STF sejam guardiões e defensores dos abomináveis princípios da impunidade e da corrupção, em dissonância com a sua relevante missão institucional de zelar pela consolidação do ordenamento jurídico insculpido na Carta Magna.
Chega a ser risível o fato de o senador se referir aos sete milhões de votos recebidos de seus conterrâneos, como se isso tivesse acontecido depois desse lamentável acontecimento, onde ele se envolveu em atos de corrupção, o que vale dizer que ele simplesmente imagina ainda contar com o respaldo desses eleitores, que foram traídos infantilmente pela atitude decepcionante e inadmissível do político mineiro, ante a nítida quebra do decoro parlamentar e o calote eleitoral contra aqueles que acreditaram na sua honestidade.
O senador tucano pode até acreditar na Justiça do seu país, como ele declarou, que certamente não é essa a Justiça dos brasileiros que defendem a moralização das atividades públicas.
O senador deveria também ter a serenidade de compreender que a sua atitude de pegar dinheiro de propina não condiz nem um pouco com os princípios do decoro e muito menos da dignidade, porque o recebimento, de forma irregular de dinheiro o afasta definitivamente da decência e da compostura intrínseca da vida pública.
Mesmo tendo sido autorizado à reintegração ao exercício do mandato parlamentar, a presença do senador mineiro no Senado da República ficará marcada, de forma indelével, como o famoso corrupto que se prostituiu por dois milhões de reais, passando a ter o descrédito da opinião pública nacional, por se enquadrar como pessoa venal e susceptível à propina, em troca de favores, conforme demonstra o depoimento de um dos danos do grupo JBS. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES

Brasília, em 4 de julho de 2017

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