sábado, 29 de julho de 2017

O código às feições da impunidade?

O novo Código de Processo Penal passa por debate na Câmara dos Deputados e já recebeu propostas de significativas mudanças nas regras de delação premiada, prisão preventiva e condução coercitiva, além da revogação do entendimento de que as penas podem começar a ser cumpridas após a condenação em segunda instância, cujas medidas, em substância, se tornaram a base dos resultados extraordinários da Operação Lava-Jato, em que pese eles serem alvo de duras críticas especialmente por parte de parlamentares.
O Ministério Público Federal classifica o instituto da delação premiada como de suma importância para o sucesso alcançada pela citada operação e considera as ações para rever os acordos como forma de enfraquecimento das investigações.
No momento, a delação é regulada pela lei que trata de organizações criminosas, que foi aprovada em 2013.
Na forma da disposição do código vigente, a prisão preventiva não tem duração determinada e a condução coercitiva não prevê punição em caso de uso considerado abusivo.
O novo CPP foi aprovado pelo Senado Federal, em 2010, mas, na Câmara, ele ficou engavetado até o ano passado e, depois disso, passou a tramitar na gestão do ex-presidente daquela Casa, que se encontra cumprindo prisão preventiva em Curitiba, decretada em outubro de 2016.
Há quem discorde do fato de preso poder fechar acordo de delação premiada e defende que o poder excessivo concentrado nas mãos dos procuradores seja diluído com o juiz, que precisa acompanhar a negociação entre o Ministério Público e o delator, e não apenas ter acesso ao acordo no final do processo.
O mesmo deputado entende que é preciso prever punições para quem desrespeitar as regras da condução coercitiva, que deve ser colocada em prática somente se houver negativa da prestação de depoimento. 
O texto propõe que haja prazo de duração para as prisões preventivas, que seria no máximo de seis meses. 
O texto contempla que a prisão preventiva “jamais” possa ser utilizada como “forma de antecipação da pena” e que o “clamor público não justifica, por si só, a decretação da prisão preventiva”.
O novo CPP prevê ainda a “proteção da imagem do preso” e a punição das autoridades que deixarem a pessoa ser fotografada ou filmada pela imprensa durante o momento em que é levada à cadeia, segundo a justificativa de que “Não se está, aqui, a regular ou restringir a atividade jornalística. Longe disso. Antes, busca-se responsabilizar as autoridades”.
O novo texto também modifica o atual entendimento do Supremo Tribunal Federal, em relação à aplicação de penas após a condenação em segunda instância, ao que se pretende que isso só deva acontecer após o chamado trânsito em julgado, isto é, após se esgotarem os recursos legais permitidos.
É muito provável que as referidas mudanças não contem, nesse particular, com o consenso dos membros da comissão pertinente, eis que, no caso do instituto da delação premiada, ela foi disciplinada há muito pouco tempo, apenas em 2013, e a sua eficácia tem sido da maior relevância para os resultados exitosos da Operação Lava-Jato. 
À vista da experiência, não é plausível que se estabeleça prazo para as prisões preventivas, visto que a soltura prematura, antes da conclusão dos levantamentos de dados e das investigações indispensáveis à obtenção das provas, tem o condão de contribuir para que o suspeito, livre, faça ameaças a testemunhas e promova o sumiço dos indícios e elementos circunscritos aos fatos em investigação, porém o novo CPP poderia exigir que as citadas medidas sejam coligidas com a máxima celeridade e de forma prioritária, de modo a abreviar o período de prisão dos suspeitos da prática de crime.
É inegável que os brasileiros precisam deixar as suas vergonhosas letargia e inércia para trás e passar a defender a eliminação da vida pública dos homens públicos que ficam engendrando ações que visam defender, de alguma forma, interesses pessoais ou, pelo menos, amenizar a situação dos que cometem crimes contra a dignidade das atividades políticas.
É absolutamente inadmissível que parlamentares fiquem legislando em causa própria, para driblar as investigações e as situações sobre iminentes prisões, por meio de manobras introduzidas em códigos que tratam do disciplinamento sobre crimes, cujos procedimentos são abrandados desde seu nascedouro, em benefício dos famosos criminosos de colarinho branco, permitindo que o Brasil continue sendo verdadeiro paraíso para bandidos.
            À luz das discussões presentes no novo CPP, que deveriam servir para aperfeiçoar as normas sobre disciplina e condenação de criminosos, os deputados pretendem rever algumas regras que já demonstraram a sua eficácia no combate à criminalidade, ou seja, há aparato penal e processual-penal no país amoldado e montado para gerar e garantir a impunidade para os criminosos, mormente dos poderosos, que contam para tanto com a influência do poder concedido pelo povo.
Prova maior disso é que os políticos, que não são poucos os criminosos entre eles, nem sempre são condenados pelo Supremo Tribunal Federal, ao contrário do que acontece com a Operação Lava-Jato, contra a ordem natural das coisas, levou à prisão vigaristas, estelionatários, ladrões e corruptos que há décadas desafiavam a Justiça, sem serem importunados, justamente porque estes agora estão ao desabrigo do famigerado foro privilegiado.
Diante da constatação de que o sistema penal se mostra desatualizado e com vulnerabilidade, resta a sua correção e o seu aperfeiçoamento, obviamente não para a tranquilidade e a bonança dos desavergonhados corruptos e ladrões da República, mas para o fortalecimento do combate à corrupção, que precisa de normas realmente duras e enérgicas contra a impunidade.
O Brasil precisa aprender e copiar as benéficas lições penais dos países evoluídos, a exemplo dos Estados Unidos da América, onde os criminosos são prontamente julgados e, se condenados, vão direto para a cadeia, podendo de ali recorrer normalmente, porém em regime de reclusão.
Contrariamente no país tupiniquim, a magnanimidade do novo Código de Processo Penal brasileiro pode prevê, pasmem, que o criminoso possa recorrer eternamente da sentença condenatória até o trânsito em julgado, ou seja, ele morre e jamais correrá o risco de ser trancafiado, a depender da absurda e inadmissível lentidão da Justiça para decidir, diante da pletora de processos que apenas se acumulam de forma progressiva.
Não há a menor dúvida de que prisão somente após o trânsito em julgado significa o mesmo que o prêmio da impunidade, tendo em vista o excessivo acúmulo de processos na Justiça, a enormidade possível de recursos processuais e a demora nos julgamentos, com certeza contribuirão para que as sentenças definitivas somente aconteçam após a morte dos criminosos, evidentemente por caduquice.
Nos países sérios, civilizados e evoluídos político e democraticamente, o Legislativo tem a função e a responsabilidade de elaborar leis para adequá-las exclusivamente à necessidade de atendimento ao interesse público, quanto ao aperfeiçoamento e à atualização indispensáveis à modernização do ordenamento jurídico, com a finalidade de combater a criminalidade e não de facilitar a impunidade, como parece que este seja o desiderato buscado pelo Parlamento tupiniquim, à luz das informações noticiadas pela mídia, nesse caso do novo Código de Processo Penal.
Urge que os brasileiros, no âmbito do seu dever cívico e patriótico, resolvam protestar e repudiar, com veemência, as ações de parlamentares que tenham por objetivo a mudança do arcabouço jurídico para facilitar a disseminação da corrupção e o robustecimento da impunidade, em cristalina demonstração de que o novo Código de Processo Penal teria sido aprovado para se amoldar aos interesses pessoais daqueles que estão sempre envolvidos com a prática de atos irregulares. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES

Brasília, em 29 de julho de 2017

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