Diante de crônica da minha autoria, versando sobre a decisão
de um ministro do Supremo Tribunal Federal, que determinou ao presidente da
República a suspensão da nomeação do diretor-geral da Polícia Federal, por ele entender
que não foram observados, no respectivo ato, os princípios constitucionais da
moralidade, da impessoalidade e do interesse público, houve manifestação de
alguns seguidores sobre o tema.
Ganha relevo entre os comentários o de um nobre conterrâneo
de Uiraúna, Paraíba, que, com muita lucidez, expôs a sua opinião nestes termos:
“Caro amigo, me angustia ver tanta intromissão no poder executivo nesse país.
tudo que o presidente quer fazer ou o congresso ou o supremo impede.se isso não
e tentativa de golpe branco não sei...desde quando o presidente não pode
indicar seu primeiro escalão? se o indicado não for qualificado tudo bem, mas
baseado em ilações e um absurdo, se quer deixam o cidadão mostrar seu trabalho
já o condenam. porque seria tanto medo? deve ser muito rabo preso! um abraço!”.
Em
resposta aos sinceros argumentos do arguto e angustiado comentarista, eu digo, com
as devidas vênias, que se trata de questão que se expõe muito apropriadamente ao
ponto de visto e à interpretação pessoal dos brasileiros, porquanto existe aquele
que entende apenas que não há, no caso vertente, intromissão no poder Executivo
e muito menos tentativa de golpe algum, mas sim a adoção de medidas jurídicas necessárias
aos esclarecimentos dos fatos denunciados por importante ex-ministro do governo,
no âmbito do pleno Estado Democrático de Direito, em que apenas se verifica o exercício
do direito à elucidação de atos administrativos da gestão pública.
Vejam-se
que o mencionado ex-ministro declarou que “O chefe do Executivo tentou interferir
na Polícia Federal para acessar inquéritos sigilosos, que correm na corporação.”.
Além
disso, segundo o ex-juiz, “o presidente teme processo em andamento no STF.”.
Ao
examinar as declarações do ex-ministro, o procurador-geral da República
concluiu que “A dimensão dos episódios narrados revela a declaração de Ministro
de Estado de atos que revelariam a prática de ilícitos, imputando a sua prática
ao Presidente da República, o que, de outra sorte, poderia caracterizar igualmente
o crime de denunciação caluniosa.”.
Uma
emérita constitucionalista declarou que, ipsis litteris: “Trata-se de um
contexto em que se pode visualizar, com absoluta clareza e precisão jurídicas,
os diversos crimes de responsabilidades cometidos pelo presidente da República.”.
A
referida autoridade jurídica mencionou a prática de “crimes contra a
probidade administrativa pública, como a expedição de ordens contrárias à
Constituição, além da infração das normas legais no provimento dos cargos públicos
culminando com procedimentos incompatíveis com a dignidade, a honra e o decoro
do cargo, todos elencados nos incisos 4, 5 e 7 do artigo nono da Lei
1.079/1050. Tudo isso sem mencionar as infrações penais comuns, como falsidade
ideológica e outras que ele já vem cometendo durante o estado de calamidade pública.
É, definitivamente, um governo voltado, acima de tudo, ao protecionismo familiar,
em detrimento do Estado brasileiro.”.
Por
seu turno, um festejado criminalista disse que, in verbis: “as declarações
são de absoluta gravidade e devem ensejar a responsabilização criminal do
presidente.”.
O
citado criminalista afirmou que, verbis: “o presidente estaria buscando
aparelhar a Polícia Federal, nomeando pessoas de sua confiança, para que a instituição
atuasse para satisfazer os seus interesses pessoais e ilegais, como a obtenção
de relatórios confidenciais.”.
Tenho
opinião de que não se questiona ato administrativo quando ele se encontra
perfeito e acabado, absolutamente revestido das formalidades legais, mas é
preciso sim que se investigue quando houver o mínimo de suspeição, porque deve
ser assim a funcionar a gestão digna e respeitada pela sociedade.
Nesse
caso da Polícia Federal, ficou muito evidente que o presidente brigou com o ex-juiz
para colocar no órgão pessoa da confiança dele, dando a entender que se tratava
de mudança de chefia para atender interesse pessoal dele, posto que até alegou
que gostaria de ver relatórios confidenciais, prática não permitida pela chefia
anterior, que vinha fazendo excelente trabalho, o que significa que não
precisava de mudança não fosse para atender interesse emergencial e circunstancial
do presidente
Isso
ficou muito claro nas explanações do ex-ministro, que até disse, em
concordância com a pretensão presidencial extemporânea, ante a inexistência de
causa aparente a justificar a medida, que a mudança fosse por outra pessoa com
qualificação técnica para o cargo, mas o presidente não concordou, porque ele queria
o servidor da sua indicação, a despeito da "carta branca" concedida
ao ex-ministro, o que significaria que o presidente não poderia mexer na
direção da Polícia Federal enquanto o ex-juiz estivesse no cargo, mas, mesmo
assim, o presidente insiste na nomeação do seu afilhado e assina o respectivo
ato.
O
ministro se rende ao desejo do presidente e entrega o cargo logo depois da nomeação
do eleito dele, dando a entender que se trata do envolvimento com questão
pessoal e não com o interesse público, talvez para a facilitação de acesso às
informações produzidas no órgão que não seria possível com a direção afastada e,
sendo assim, cheira muito ruim e desagradável o ato presidencial, por ficar
explícita forçação de barra que não condiz com a seriedade e a regularidade que
precisam imperar no âmbito da administração pública.
É
preciso ficar claro que o presidente da República tem total competência para nomear
todos os cargos do governo, desde o ministro até os diretores, mas o Brasil
sabia sobre a existência da carta branca concedida ao ex-ministro, o que
significa que somente em situação excepcional ele poderia mexer nos órgãos sob
a subordinação do ex-ministro, salvo por concordância de ambos ou necessidade resultante
de algum deslize prejudicial ao funcionamento da instituição, com prejuízo para
o interesse público, em que o ministro não demonstrasse interesse em saná-lo.
Data vênia, eu penso que o caso em comento
pode se tratar de abuso de autoridade, quando o presidente sempre aceita tudo,
desde que isso satisfaça exclusivamente a sua vontade.
As
manifestações de alguns renomados juristas, evidentemente acerca de fatos que ainda
estão sendo apurados, a exemplo da oitiva do ex-juiz, hoje, levam ao sentimento
de que se trata de questão que precisa ser analisada com cautela, sem essa de
se dizer que alguém é sempre tratado como injustiçado ou coitadinho, sem a
mínima mácula.
É
preciso que os procedimentos sejam devidamente investigados, esclarecidos e
julgados pelo órgão competente, no caso, o Supremo Tribunal Federal, para se
saber realmente quem está com a razão, à luz das celeumas suscitadas com a saída
do ministro que era considerado pelo presidente do país como patrimônio
nacional e, de repente, passa a ser descartado, posto que ele foi obrigado a se
afastar do governo em razão de simples nomeação de diretor de órgão, fato mais
do que estranho, sob o prisma da gestão competente e eficiente.
No
meu modesto modo de pensar, estando a Polícia Federal funcionando normalmente,
como vinha, apresentando resultados excelentes, no exato cumprimento das suas
funções institucionais e ainda satisfazendo plenamente o interesse público, a
par da carta branca concedida livremente ao ex-ministro para a escolha de seus
assessores, em respeito aos princípios democráticos, nada se justificaria qualquer
mudança, quanto mais para satisfazer interesse pessoal.
Até
se dizer ao contrário, por meio do inquérito em curso, a questionada nomeação,
em princípio, tem as características de ato imperfeito e ilegal, a ensejar a prática de
abuso de autoridade, sendo condenável, em termos jurídicos, por contrariar os princípios
da moralidade, impessoalidade e do interesse público, precisando que o
presidente da República reveja seus atos para que eles se enquadrem no padrão
aceitável de regularidade pela sociedade, que não suporta mais tanta truculência
na administração pública brasileira.
Brasília,
em 2 de maio de 2020
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