sexta-feira, 20 de agosto de 2021

Garantidor da paz!

 

Congressistas reagiram às declarações do ministro, que é general da reserva, do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, que disse que há possibilidade de intervenção militar, em caso de gravidade na relação entre os poderes da República.

Não obstante, o ministro afirmou que não acredita que isso possa ocorrer "neste momento" e disse que a ação das Forças Armadas nesse sentido está prevista no artigo 142 da Constituição Federal, repetindo argumentos de extremistas bolsonaristas, que “sonham” com essa absurda hipótese, por se tratar de medida de exceção, em contrariedade aos princípios democráticos.

O general declarou o seguinte: “Mas não acredito em intervenção no momento. Essa intervenção poderia acontecer num caso muito grave. Discordo até das considerações que falam sobre o 142, um artigo bastante claro. Basta ler com imparcialidade. Mas não acredito que venha ser empregado na situação atual. E espero que não seja empregado jamais. Temos que torcer para não ser empregado”.

          Para a interpretação do ministro, o disposto no artigo em causa é aplicável porque é previsto na Constituição e pode ser usado a qualquer momento.

O ministro afirmou, interpretando o citado dispositivo, que, “Se não fosse para ser usado, o nosso constituinte tem que ser chamado e perguntado: 'vem cá, por que colocaram isso aqui?'. A intenção é essa, ser um poder moderador. Tomara que não aconteça.”.  

Em entrevista a uma rádio, o general afirmou também que “a opinião pública concorda com as críticas de que o Judiciário está provocando uma tensão ainda maior".

Alguns parlamentares, de partidos distintos, cogitam convocar o mencionado ministro para dar explicações sobre as suas declarações, por entenderem que elas extrapolam os limites do seu cargo.

A propósito desse assunto, parecer da Câmara dos Deputados esclarece que o artigo 142 da Constituição não autoriza intervenção militar no país, conquanto o aludido dispositivo apenas estabelece que as Forças Armadas, sob a autoridade suprema do presidente da República, se destinam à garantia dos poderes constitucionais, da lei e da ordem e isso não significa coisa nenhuma de poder moderador.

O referido parecer conclui que é "fraude ao texto constitucional a interpretação segundo a qual as Forças Armadas teriam o poder de se sobrepor às decisões de representantes eleitos pelo povo ou de quaisquer autoridades constitucionais a pretexto de ‘restaurar a ordem’".

Esse parecer conclui que "O artigo 142 da Constituição não autoriza a realização de uma 'intervenção militar constitucional', ainda que de caráter pontual. Como instituições permanentes e regulares, as Forças Armadas se organizam de forma independente em relação ao governo e funcionam mesmo em contextos excepcionais. A 'autoridade suprema' do presidente da República em relação às Forças Armadas significa simplesmente que a direção do Chefe do Poder Executivo não pode ser contrastada por qualquer autoridade militar, o que mais uma vez revela a prevalência do Poder Civil".

Nesse caso, é bem provável que o General tenha realmente extrapolado o seu saber de intérprete da Constituição, ficando muito a desejar, porque ele foi bastante além do que realmente prevê a Lei Maior, além de ter incursionado onde em assunto que não lhe diz respeito, quanto mais em sentido não condizente com a realidade fática.

Neste governo, tem sido comum, dia sim e outro também, um general de plantão fazer declarações sobre o que bem entende e vem à mente, tendo como pano de fundo alguma forma de ameaça de golpe, possivelmente acompanhando o estapafúrdio ideário do presidente da República, que tem sido useiro e vezeiro em insinuar sobre a possibilidade de golpe, com irracionais ameaças e intolerâncias.

É verdade que a norma existe na Constituição precisamente para ser aplicada quando ela se fizer necessária, evidentemente respeitada a finalidade para a qual ela foi verdadeiramente inspirada, não como poder moderador, a exemplo como tentar indevidamente expor, mas sim como se explica, na tentativa pedagógica a seguir.

A verdade mesmo é que as Forças Armadas nunca foram nem serão poder moderador, caso em que tudo isso tem o significado de mera falácia, talvez para tentar tirar o holofote da imprensa de algum caso que incomoda o governo.

Na forma da sua destinação constitucional, ex-vi do disposto no art. 142 da Lei Maior, as Forças Armadas têm, basicamente, como função a primacial defesa da pátria, a garantia dos poderes constituídos e a manutenção da lei e da ordem pública, não se falando, em lugar algum, em nada de poder moderador, porque não é caso.

Convém ser ressaltado que nunca se ouviu de parte de integrantes do alto escalão das Forças Armadas afirmação nesse sentido, tendo em vista que as suas funções são bastantes claras, na forma bem definida no citado dispositivo constitucional.

Não se pode atribuir a elas nada que não esteja no figurino constitucional, conquanto o poder atribuído às Forças Armadas seja de maior relevância, quando diz que elas são mantidas para garantir a estabilidade dos poderes da República, o que significa a detenção de poder bem maior do que o mero agente moderador, que significa apenas a possibilidade de mediação entre partes em conflito, em discussão sobre possível desavença de poder ou interesses, onde se exige a presença da autoridade meramente conciliatória, quanto à estabilidade da ordem nacional.

Diante disso, importa  ficar bem claro que a Constituição reservou às Forças Armadas a autoridade de sublime relevância de poder garantidor de princípios nela elencados, à luz da definição a que se refere o citado art. 142.

Não se surpreende se, conforme as circunstâncias especiais, seja exigido que as Forças Armadas passem a atuar, por determinado momento, como a quarta variável entre os poderes da República, evidentemente à margem bem distinta deles, porém, em condições de superioridade por força do poder garantidor inscrito na Constituição, que nem teria validade se elas se colocassem, nos casos excepcionais, em posição inferior aos poderes da República, porque, elas acabariam sem autoridade para o exercício das garantias mencionadas no aludido art. 142, de autoridade meramente pacificadora entre os poderes em litigância.  

É evidente que, nessa circunstância de reconhecida excepcionalidade, transmutam-se as Forças Armadas, em caráter momentâneo, de poder garantidor, não se submetendo a nenhum poder, nem mesmo ao mando do presidente da República, que, na normalidade, é o comandante-em-chefe delas.

Vejam-se que o presidente da República não pode, nesse caso especial, comandar as Forças Armadas, diante, conforme o caso, de o próprio poder Executivo ser o principal causador do desequilíbrio ou do objeto da discussão a ser dirimida ou pacificada, onde se exige o afastamento dele do seu comando, enquanto não forem saneadas as questões em demanda.

Vejam-se que, nas circunstâncias, são as Forças Armadas que vão definir o momento exato e adequado para agir, evidentemente quando achar conveniente e de acordo com o interesse público.

Conforme as circunstâncias, as Forças Armadas são obrigadas a agir precisamente quando entenderem sobre a chegada do momento ideal para a garantia constitucional, nos termos e na forma previstos no art. 142 da Carta Constitucional. 

Nessas circunstâncias, após garantir o restabelecimento da ordem democrática, as Forças Armadas retirar-se-ão do cenário político, voltando a imperar o estado democrático objetivado.

Essa forma de atuação das Forças Armadas não se confunde nem com “golpe militar” nem com “intervenção militar”, porque a sua verdadeira atuação apenas decorre em estrita harmonia com a norma prevista na Constituição, de modo a se permitir a plena garantia do ordenamento jurídico pátrio, com vistas ao restabelecimento da normalidade institucional, que nada pode se confundir com poder moderador coisa alguma, mas sim como agente estritamente necessário para a rápida construção da paz institucional entre os poderes da República.

Salve as Forças Armadas, sempre no império da paz!

Brasília, em 20 de agosto de 2021

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