domingo, 15 de agosto de 2021

O olhar para o Brasil?

 

Após a prisão de aliado político, por ordem de ministro do Supremo Tribunal Federal, o presidente da República voltou a fazer ataques aos ministros dessa Corte, em publicação em rede social, tendo afirmado que vai apresentar, ao Senado Federal, pedido para a abertura de processos contra o mencionado magistrado e também o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, este por conta da rixa sobre o voto impresso.

Na publicação, o presidente do país, como de costume, volta a subir o tom, de incontida irracionalidade, e fazer ameaças de "ruptura institucional".

O presidente brasileiro afirmou que "De há muito, os ministros Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal, extrapolam com atos os limites constitucionais. Na próxima semana, levarei ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, um pedido para que instaure um processo sobre ambos, de acordo com o art. 52 da Constituição Federal".

O aludido dispositivo prevê que cabe ao Senado julgar crimes de responsabilidade de ministros do Supremo, o que poderia implicar na possível perda dos seus cargos.

Até o momento, desde a promulgação da Constituição, o citado dispositivo nunca foi acionado nem usado pelo Senado.

Em prosseguimento, o presidente do país disse que "O povo brasileiro não aceitará passivamente que direitos e garantias fundamentais (art. 5º da CF), como o da liberdade de expressão, continuem a ser violados e punidos com prisões arbitrárias, justamente por quem deveria defendê-los".

A prisão em apreço foi ordenada sob suspeita de dez crimes, após pedido formulado pela Polícia Federal, que detectou a atuação do ex-deputado em ataques e ameaças às instituições democráticas.

Já os atritos do presidente do país com o presidente do TSE se devem à defesa que este vem fazendo acerca da lisura das urnas eletrônicas e às críticas à votação da PEC do voto impresso, que terminou sendo rejeitada pela Câmara dos Deputados e o mandatário teve que engolir a seco a clamorosa derrota.

Desde logo, é preciso ficar bem cristalino de que a prisão de cidadão da sociedade civil é questão que se cinge apenas entre a Justiça e a pessoa diretamente envolvida com os seus atos questionados nas investigações, ou seja, para qualquer entendedor mediano, trata-se de questão estritamente particular, que devem ser tratadas exclusivamente entre ambos as partes, sem nenhuma interferência do Estado.

Na forma da Constituição Federal, o presidente da República tem o dever primacial de cuidar e defender exclusivamente as questões relacionadas com os interesses nacionais, ou seja, nos limites das suas funções, ele somente tem competência privativa para diligenciar em torno dos assuntos afetos à administração do Brasil, não lhe sendo facultado o direito de tomar as dores de entes particulares, mesmo que se trate de pessoa da sua afinidade pessoal, que parece ser o caso, mas isso se encontra completamente fora da sua jurisdição, como homem público que é e esse princípio precisa ser respeitado, à luz da imperiosidade constitucional.

Por força desse rudimentar entendimento, fica a evidência lógica de que falece competência institucional para o presidente da República se imiscuir em assuntos estranhos aos interesses do Estado, como é o caso de que trata a questão de contorno muito mais paroquiana, ou seja, entre o cidadão e o Poder Judiciário, por decorrência de suspeita de crime contra a ordem pública, por conta de ataques e ameaças às instituições democráticas, à vista do que foi investigado.

Em termos jurídicos, a atitude do presidente do país, se realmente ele liderar pedido de sanção a ministros do Supremo, para o fim da perda dos respectivos cargos, ele poderá incorrer em crime de responsabilidade, caso o Ministério Público assim entender, eis que ele não tem competência constitucional para se apresentar como defensor de interesse estranho ao Estado, porque isso pode caracterizar evidente abuso de autoridade, em defesa de causa estranha ao seu dever de agir.

Por seu turno, ao demonstrar vivo interesse em defender causa que não diz respeito ao Estrado, o presidente do país se expõe ao ridículo de ser interpretado muito mais como vingativo em ato de notória retaliação contra os ministros com quem ele mantém acirrada disputa de autoridade, à vista de visíveis querelas existentes entre eles, com o aproveitamento de situação distanciada da sua competência funcional, talvez com o propósito de também  continuar aparecendo, com destaque, na mídia, que tem sido um de seus fortes hábitos, no cargo.

Além disso, fica muito evidente que o presidente do país se preocupa bastante com situação de seu aliado político, mas se deixa permitir que as questões do Estado se potencializem em fortes crises e continuem a arder em chamas por todos os lados, enquanto para elas ele não dispõe de necessários disposição e tempo, porquanto ele nada contribui em interesse na real condução das medidas indispensáveis aos seus equacionamento e saneamento, em se tratando mais especificamente nos potenciais e notórios casos realmente da sua competência institucional.

Há a esperança de que a prisão desse político sirva de lição positiva para que sejam definitivamente desestimulados outros idealistas com o mesmo sentimento, extremistas como ele, que atacam a democracia, sem o menor escrúpulo, como ele vinha fazendo livremente e, o pior, imaginando erroneamente que isso poderia ser realizado sob a guarida da sublime liberdade de expressão, como ingenuamente assim foi defendido pelo presidente do país, que deveria ter evitado se associar à aquiescência de atos contrários à estabilidade das instituições democráticas, como assim foi enquadrado o caso do cidadão preso.

Por se tratar da autoridade do seu quilate, o presidente do país não poderia, em hipótese alguma, demonstrar apoio a quem propaga intransigentemente o fechamento de instituições democráticas, porque isso caracteriza ato de cumplicidade, tendo em vista que, no regime democrático, o bom senso e a racionalidade aconselham a via igualmente democrática para o debate das questões, inclusive, se for o caso, das demandas cabíveis para a tentativa da tratativa na busca da pacificação dos entendimentos sobre questões antagônicas, que parecem ser o caso, mas jamais sob uso de ataques e ameaças de violência contra pessoas e instituições democráticas.

Não se quer dizer com isso que se pretende defender as decisões do Supremo, que é órgão que precisa sim cumprir o seu papel de guardião da Constituição, mas é preciso que os cidadãos mais afoitos sejam devidamente intimidados quanto aos seus ímpetos e vontades de disseminação do caos contra a democracia, o que vale dizer que as pessoas que tentarem afrontar as leis do país e incitarem à desordem cívica precisam responder por seus atos, prestando contas perante a Justiça, como forma de se buscar a paz e a tranquilidade da nação.

Na verdade, ao defender os atos nada republicanos de aliado, com a adoção de sanção por meio do impeachment de ministros, o presidente do país se mostra um tanto quanto incoerente, porque ele pedindo a abertura de processo nesse sentido, é como ele se sentasse na própria extensão do corpo (para não dizer o dito popular), quando se sabe que o dispositivo por ele invocado, o artigo 52 da Constituição, prevê a abertura também de impeachment contra o presidente da República, ex-vi do seu inciso I, à vista da existência de mais de 130 pedidos engavetados na Câmara dos Deputados, acenando para o afastamento dele do cargo, por motivos que certamente caracterizam crimes de responsabilidade atribuídos à gestão do governo dele.

Nesse caso, o presidente do país poderia sim ir ao Senado, para pedir o afastamento de ministros do Supremo, mas seria de bom alvitre que ele maturasse esse relevante assunto e, por eficiência da sua iniciativa, aproveitasse o seu périplo para passar na Câmara Baixa, para aconselhar que seus pedidos de impeachment também sejam implementados, diante da necessidade de coerência de atitude.

Em demonstração da transparência e da coerência de procedimentos, com os pedidos de impeachment tanto de ministros do Supremo como o do próprio cargo, o presidente da República se permite que sejam avaliados se seus atos, no cargo, estejam absolutamente revestidos da legalidade, evidentemente com vistas a afastar a ideia de haver, na sua gestão, a prática de crimes de responsabilidade, posto que os pedidos tratam exatamente no sentido de que as investigações pertinentes esclareçam esses fatos que inquietam a sociedade.

Enfim, as pessoas, inclusive o presidente do país, precisam compreender que o radicalismo, o desrespeito e a incitação à desordem pública não se coadunam com o verdadeiro estado da pureza de que trata a liberdade de expressão, que tem no seu âmago a singeleza do engrandecimento dos princípios humanitários, tendo em vista que as agressões verbais diferenciam bastante disso, porque a sua índole é a de se contrapor aos interesses da normalidade democrática da expressão livre e construtiva, sem o desejo da retirada dos direitos fundamentais da população de puder expressar seus sentimentos, podendo fazê-los sem agressão contra ninguém, porque isso não condiz, em absoluto, com o verdadeiro sentido de liberdade para se produzir o mal.

Para o bem do Brasil e dos brasileiros, é preciso sim que seja repudiado qualquer sentimento que contrarie a verdadeira liberdade de expressão, não se permitindo o compartilhamento de ideias estapafúrdias de violência e agressão a quem quer que seja, como forma inteligente de se evitar o tensionamento da ordem pública e do ambiente político-administrativo do país, porque isso somente contribui para o estímulo de movimentos racistas, homofóbicos, misóginos, entre outros similares, que são símbolos que precisam ser enfraquecidos no seio da sociedade, para ao seu próprio bem.

É preciso se compreender que não se pode mais conceder espaço para grupos de pessoas com ideologia com tendência de incivilidade, com pensamento enviesado da normalidade democrática, imaginando que podem fazer bagunça contra as autoridades e as instituições do país, logo sobre sob a proteção de um dos mais sagrados princípios concedidos ao homem, que é a liberdade de expressão, que precisa ser respeitada e venerada pela real importância dela para a garantia dos direitos humanos, no sentido se puder dizer e afirmar tudo sobre verdadeiramente construtivo para o engrandecimento das relações sociais.

Convém que o presidente da República se conscientize sobre as reais prioridades de seu governo, em especial quanto aos cuidados e ao saneamento das crises política, administrativa, econômica, de saúde pública, democrática, entre outras que estão a exigir o máximo da sua atenção, à vista de serem assuntos compreendidos nas suas prioridades privativas de competência e responsabilidade.

Brasília, em 15 de agosto de 2021

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