sábado, 20 de junho de 2020

A força da transformação


Em crônica que versa sobre a decadência da educação brasileira e a imperiosa necessidade de priorização das reformas da administração pública, em especial no que diz respeito à melhoria do ensino público, que se mostra visivelmente em estado avançado de precariedade, alguns comentários foram lançados sobre o tema.
Entre as mensagens oferecidas ao assunto, destaco a que mui cordialmente foi escrita pelo nobre patriota Orlando Chaves da Costa, que se expressou nestes termos: “Assino embaixo desse brilhante texto. A educação pública brasileira foi largada as moscas a muito tempo atrás. Se tivéssemos feito o dever de casa nessa área o Brasil seria uma potência. Veja o caso do nosso vizinho Argentina, cuidou da educação no início do século XX. Já implantaram o ensino integral na década de cinquenta. Se fossemos um país sério já teríamos implantado essa modalidade de ensino já praticados por todos os países desenvolvidos. Como o presidente não tem projeto nessa área estamos caminhando a passos largos para o abismo.”.
Querido irmão Chaves, muito obrigado por suas sábias palavras de apoio ao meu texto, que mostram a sua precisa sensibilidade acerca de questão da maior relevância nacional: a educação.
No texto, eu nem mencionei países que evoluíram a partir de maciços investimentos na prioridade da educação moderna e compatível com os avanços da ciência e da tecnologia, como o Japão, a Coreia do Sul e muitos outros onde os dirigentes pensam com a mente arejada e inteligente, preocupados com o melhor para seu povo, no que se refere ao domínio do conhecimento, em níveis educacionais e tecnológicos.
Há tradicional dito popular que diz que cada povo tem o governo que merece e os brasileiros merecem este que está aí, cercado de assessores que pensam como ele, que vem sendo aplaudido por suas inconsequentes insensibilidades na condução de país sem norte, tendo por fundamento mostrar muita autoridade e se firmar com o apoio de seus seguidores que não querem perceber que no isso vai dar, senão em caminho sem volta, quando toda loucura atingir o ápice e fugir do controle da racionalidade.
Os ensaios de descontrole emocional e racional não deixam dúvidas quanto ao precipício para o qual o Brasil está sendo conduzido, onde a pessoa que deveria ser exemplo de moderação, compreensão, tolerância, bons exemplos de civilidade e cidadania, à vista da relevância do cargo que se encontra investido, faz questão de ser explosivo, inconsequente, teimoso, indolente e o tudo o mais para mostrar a sua força perante os demais poderes da República, seus adversários, parte da imprensa e quem mais se indispor contra o governo, que tem a grande vantagem de ainda não ter se envolvido diretamente com roubalheira, mas já se enlameou feio e irremediavelmente com o seu acordo com o famigerado Centrão, cujos integrantes fazem parte de bloco "famoso" por sua atuação nos governos anteriores, quando muitos de seus componentes se envolveram nas irregularidades investigadas pela Operação Lava-Jato, cujos resultados estão mofando no Supremo Tribunal  Federal, aguardando a decretação da prescrição.
Ou seja, esse acordo com o Centrão é maneira mais do que explícita e declarada esculhambação da administração pública, quando o governo entrega importantes cargos públicos de direção para serem cuidados por políticos que integram entidade comprovadamente com índole contrária aos princípios da moralidade e da dignidade na gestão de recursos públicos.
Isso por si só já é mais do que suficiente para macular definitivamente o governo, mas é preciso se compreender que houve nessa negociata entre o presidente  do país com as lideranças do famigerado Centrão não objetivando contribuir para benefício do interesse do Estado ou mais remotamente da sociedade, mas sim para que os parlamentares desse questionável bloco formem espécie de blindagem, pasmem, contra possível processo de impeachment da pessoa do presidente da República, na Câmara dos Deputados, fato este da maior gravidade só em se pensar que recursos públicos agora estão sob o controle de “ilibados” integrantes de pessoas que participaram ativamente do famigerado petrolão.
 Essa terrível situação, que estranhamente acontece na administração pública, nada mais é do que a fórmula clássica da recriação do abominável sistema do "toma lá, dá cá", que foi mantido por governos anteriores ao atual, tanto odiado pelo presidente do país, mas apenas por ocasião da campanha eleitoral, diferentemente de agora, diante da única tentativa de salvação do cargo presidencial, que trata de estratégica operação emergencial, de cunho pessoal, com o envolvimento irregular do dinheiro público, porque os ocupantes dos cargos de livre indicação do Centrão serão remunerados com o dinheiro dos contribuintes.
Ou seja, como se trata da aceitação da indicação política, feita por bloco com características suspeitas em relação à gestão de recursos públicos, justamente por causa de seus nada confiáveis antecedentes em governos anteriores e também graças ao processo nebuloso que se reveste a entrega de cargos públicos, que jamais seriam cedidos não fosse a imperiosa necessidade da formação da base parlamentar, em troca do apoio no Parlamento para a exclusiva defesa do presidente da nação, isso se denomina, em princípio, forma cristalina de corrupção com dinheiro público, caso haja a efetivação da blindagem cogitada pelo presidente.
Impende se ressaltar que o recriminável acordo com o Centrão demonstra a quebra da palavra do candidato à Presidência da República, que garantiu que não faria acordo com a esquerda nem com centro, mas, neste último caso, se enquadra o Centrão, antes considerado bloco representativo da “velha política”, ou seja, merecedora da desconfiança, pelo próprio presidente, de haver entre seus membros aproveitadores de recursos públicos e da influência do poder.
Nesse sentido, fica muto claro que o presidente negociou a abdicação do seu selo de credibilidade, ao jogar no lixo a sua palavra empenhada na campanha presidencial, que a afiançava como sagrada.
A propósito, convém que seja transcrita aqui importante declaração do presidente do país, gravada por ocasião da plena campanha eleitoral, que foi dada por ele a uma repórter de televisão, conforme consta de vídeo, nestes termos: “Quem é o ministro da Ciência e Tecnologia do Brasil? (...) É o senhor Kassab. Não sabe a diferença da Lei da Gravidade pra gravidez. Que essa porcaria está fazendo lá? Botando seus apadrinhados, vendendo voto do seu partido para o pipoca do Temer e vai vender para o Alkimim. O próprio Temer comprou o Alkimim, agora. Vocês querem isso para o Brasil? Essa porcaria que Brasil afundando nesse buraco que está aí, nesse lamaçal que tá aí. Ou nós mudamos e não vai ser com Jair paz e amor. Você tem que entender: não tenho obsessão pelo poder! Acha que vou estar feliz, sorrindo? Não vou ter férias. Minha vida vai ser um inferno, mas eu vou ter que estar com a consciência tranquila. Com uma boa equipe de gente ao meu lado, sem a pipoca da indicação política. Tem que mudar o estilo do Brasil, É isso que a gente precisa e mais nada.”.
Lendo as palavras do então candidato à Presidência da República, com tanta ênfase, em sentida piedade de enxergar que o Brasil estaria afundando em “porcaria” e “lamaçal”, dando a entender que somente ele seria capaz de mudar esse decadente quadro  de  inadmissível  imoralidade na administração  pública,  não tem como se aprovar tamanha afronta explícita à dignidade, por meio dessa aliança espúria com o Centrão, o que bem evidencia a banalização da esculhambação na gestão pública, quando aquele que antes a condenava, com veemência, agora não se envergonha de  ser ele principal  protagonista de igual desprezo ao princípio da moralidade na gestão pública.
A tristeza no coração dos brasileiros honrados se acentua quando o homem público que também prometia ter apenas 15  ministérios no seu governo,  acaba de criar outro, o das Comunicações, totalizando 23 ministérios, sendo oito além do prometido na campanha, mas a pasta nova tem importante justificativa, porque ela faz parte da estratégia de turbinamento das relações do governo com o Centrão.
De forma cuidadosa, o titular das Comunicações é deputado federal filiado ao DEM, que faz parte do grupo de centro, cujo partido integra o presidente da Câmara dos Deputados, que é a autoridade que aceita ou não o pedido para a abertura do impeachment do presidente do país, ficando tudo muito bem esclarecido, mesmo para que quem nem seja entendedor de política.
Na posse do novo ministro, que também é genro de importante empresário dono de canal de televisão e apoia o governo, compareceram, além do presidente, algumas lideranças dos partidos que integram o Centrão, inclusive o então ministro da Ciência e Tecnologia, curiosamente por obra e graça do destino, nominado na declaração transcrita acima, como político que já vendia votos do seu partido e, ao que tudo indica, continua vendendo, porque ele encontrou interessado por seu produto nada republicano.  
Todos os partícipes do questionável acordo estavam juntos e felizes, evidentemente com a consciência tranquila, de mãos dadas, celebrando o que o candidato à Presidência classificaria de emporcalhamento do Brasil, transportando o fato para a época da campanha eleitoral.
A sessão solene de posse se tornou ainda mais relevante, no sentido inverso da moralização, porque ela foi presidida pela pessoa que se indignava quando via o Brasil sendo jogado na lama e ele via nisso forma suja que envergonhava os brasileiros, mas lá ele entendia que essa imundície precisava ser mudada, não pelo “Jair paz e amor”, que pode ser o atual, por ter mudado o entendimento do que seja “porcaria” para os brasileiros, talvez lama menos pútrida do que dos tempos idos.
Realmente, não é fácil se compreender como, em tão pouco tempo, a depender das circunstâncias, a mesma pessoa do passado consegue tranquilamente transformar a sua mentalidade e, o pior, sem demonstrar o menor remorso, nem ruborizar as faces, pois tem o apoio incondicional de seus seguidores, visto que aquele mesmo cidadão patriota não se incomoda de fazer o que, no passado, se indignava contra os governos que se prostituía, entregando cargos públicos em troca de  apoio no Congresso Nacional, na formalização de aliança sabidamente espúria e imoral, ante os princípios republicanos da dignidade da gestão pública, que exige retilineidade e exação dos homens públicos para com a res publica.
Fica muito claro que a declaração do então candidato à Presidência pode ser forma que caracteriza engodo, que se transformou em algo comparável ao estelionato eleitoral, consistente em promessa ao eleitor que acaba de ser vergonhosamente jogada da cesta do lixo, mandando para o mesmo lugar a credibilidade do homem público, que muda de ideia como o sentido das nuvens, diante de situação que o leva a se permitir a descaracterização do sentimento de moralidade pública, por meio do enlameamento da sua palavra, em razão apenas das circunstâncias.
O mais deprimente disso é que essa visível perda de credibilidade tem como objetivo, pasmem, a construção de segura blindagem pessoal, em que, a um tempo, são cometidas duas inquinações incompatíveis com a postura do homem público, materializadas por via de acordo espúrio com bloco de parlamentares cujas fichas corridas são tidas, pelo presidente, por indignidades perante o exercício de atividades públicas.
A outra diz respeito à finalidade do objeto fixador do famigerado “toma lá, dá cá”, indiscutivelmente não condizente com o interesse público, mas sim exclusivamente para possibilitar a votação dos parlamentares do Centrão contra a abertura do processo de impeachment do presidente da país, na Câmara dos Deputados, tendo o envolvimento de recursos públicos nessa aliança questionável, e isso é forma explícita de corrupção, pelo menos nos países cm o mínimo de seriedade.
Não obstante, a cegueira dos defensores dessa monstruosidade só conseguem enxergar montanhas de boas ações do governo, porque, para eles, os fins justificam os meios, quando se encontra em jogo o cargo do presidente do país, que, de tanto aprontar, vem sendo ameaçado de impeachment, bem antes mesmo de começar a cuidar da verdadeira agenda presidencial.
Convém que os brasileiros, não importando a ideologia, tenham inteligência, sabedoria e boa vontade para enxergarem os fatos como eles realmente são, perdendo a vergonha na cara de reconhecer o que realmente está fora dos paradigmas de seriedade, regularidade e moralidade, porque o contrário disso é forma incompatível com os princípios de cidadania e civismo, com o apoiamento de gestão pública por mera condescendência por motivos ideológicos, com evidente prejuízo para o interesse público, ou seja, da sociedade que é representada por homens públicos que precisam se envergonhar pelo que fazem de nebuloso e questionável.
          Brasília, em 20 de junho de 2020

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