Em
mensagem postada nas redes sociais, o presidente da República declarou, de
maneira completamente insensata que, ipsis litteris: "Seria bom
você fazer na ponta da linha. Tem hospital de campanha perto de você, hospital
público, arranja uma maneira de entrar e filmar. Muita gente está fazendo isso
e mais gente tem que fazer para mostrar se os leitos estão ocupados ou não, se
os gastos são compatíveis ou não. Isso nos ajuda".
Como
era de se presumir, a crescente crise causada pelo coronavírus vem provocando
superlotação em hospitais pelo país, com a falta de leitos para o atendimento
dos doentes, em especial nas Unidades de Terapia Intensiva (UTIs), conforme tem
sido alvo da reclamação de familiares.
Como não poderia ser
diferente, entidades representativas de classes ligadas à área médico-hospitalar
e políticos reagiram ao apelo do presidente brasileiro, em repúdio veemente ao incentivo
dele para as pessoas entrarem em hospitais públicos ou de campanha que tratam
da covid-19, para filmarem o interior das instalações, com vistas a se
verificar a existência de leitos desocupados.
O Conselho Nacional de
Saúde afirmou que a declaração do presidente do país agrava ainda mais o
contexto de crise na saúde pública, por se tratar de posicionamento que demonstra
"total desprezo pela vida da população, não expressando qualquer
sentimento de solidariedade, empatia e compaixão. Essa atitude
representa constrangimento aos pacientes que se encontram internados".
Por sua vez, os
governadores do Nordeste afirmaram que a declaração do mandatário brasileiro
"choca a todos, contraria protocolos médicos, desrespeita profissionais
e coloca a vida das pessoas em risco. Bolsonaro segue o mesmo método
inconsequente que o levou a incentivar aglomerações por todo o país,
contrariando orientações científicas bem como a estimular agressões a
jornalistas e veículos de comunicação".
Já o governador do
Espírito Santo teceu críticas à declaração do presidente, tendo afirmado que
"É mais uma manifestação de total insensibilidade com os familiares dos
mais de 40 mil mortos pela Covid-19. No momento de crise os líderes precisam se
manifestar com serenidade, solidariedade e compaixão.".
O
mesmo se pode dizer que a sociedade não tem como aceitar que a autoridade
máxima do país proponha a execução de medida extremamente desumana e
incivilizada de invasão de unidade de saúde que cuida e trata do dos doentes do
Covid-19, pasmem, para controlar a ocupação de leitos, sabendo que isso não é
competência da sociedade.
Poderia
até se esperar outras formas de insensatez do presidente, diante da sua falta
de polidez como vem se comportando diante da pandemia do coronavírus, mas essa
é uma das estupidezes absolutamente inadmissível, por ela não condizer com o desempenho
de autoridade pública que precisa dar bons exemplos de competência,
compreensão, maturidade, inteligência e, principalmente, respeito não somente
aos profissionais e autoridades que trabalham com muito amor nos hospitais, mas
em especial aos milhares de mortos que sucumbiram cruelmente nessa terrível batalha
contra esse monstruoso vírus.
Ao
que tudo indica, o presidente pôs na mente que existem inimigos imaginários para
prejudicar a sua gestão, que inevitavelmente tende a ficar comprometida,
principalmente no desempenho da economia, porque o sistema foi totalmente
engolido pela pandemia.
Isso
não é motivo para desespero de ninguém, muito menos do presidente, que precisa
somente se concentrar na busca das medidas necessárias à solução dos problemas
decorrentes dos abalos generalizados nas políticas de governo, o que vale dizer
que, quanto menos polêmicas forem criadas na sua gestão, mais condições ele
terá para o encontro dos caminhos de salvação nacional.
O
certo é que, há a voz corrente, inclusive entonada do exterior, o Brasil tem
sido o pior país que se preparou e cuidou da pandemia do coronavírus, cuja consequência
é esse desastroso mapa de muitas mortes e quantidade alarmante de infectados,
sendo impossível se prevê o resultado de letalidades, mas as expectativas são
as piores possíveis, levando-se em conta que a principal autoridade, que
deveria se preocupar prioritariamente com situação de calamidade pública,
simplesmente desdenha de tudo o que vem acontecendo e ainda fica fazendo
sugestões que têm o condão de perturbar o ambiente do trabalho dos
profissionais que cuidam dos doentes.
Não
se pode negar, nem ignorar, que a despesa pública precisa ser aplicada sob a
forma da regularidade, em satisfação da população, o que significa dizer que,
quando se tem notícia do desperdício do dinheiro público, como parece que seja
a preocupação do presidente do país, não há a menor dúvida de que é preciso se
verificar se realmente os fatos são verdadeiros, para o fim das devidas responsabilidades
e punições aos culpados, inclusive o ressarcimento dos valores apurados.
Tudo
bem que haja a preocupação do presidente nesse sentido, que é realmente também
da sociedade, mas o meio apropriado e recomendado para as necessárias verificações
e apurações é da competência dos órgãos de controle e fiscalização, como,
basicamente, a Controladoria Geral da República, os Tribunais de Contas - que
auxilia o Congresso Nacional no controle dos orçamentos – e o Ministério
Público, que são órgãos públicos com competência constitucional e legal para
fiscalizar e controlar a boa e regular aplicação dos recursos públicos, por
meio dos mecanismos apropriados, na forma de seus regimentos de funcionamento.
Não
passa de insensatez se pretender que a sociedade, sem o devido preparo, seja
condutor dessa estupidez de fiscalizar hospitais, porque isso não se harmoniza
com os comezinhos princípios da administração moderna e eficiente.
É até
possível que realmente esteja havendo vergonhosa farra com recursos públicos, com
o aproveitamento do momento da pandemia do coronavírus, na forma de superfaturamento
na compra de material médico-hospitalar, mas ainda sob o nome do salvamento de vidas,
mas isso não pode fugir do parâmetro próprio da fiscalização e do controle dos
gastos públicos, em termos de verificação e investigação sobre a sua
regularidade, só que isso não é certamente atribuição da sociedade.
Sem
nenhuma crítica aos apoiadores do presidente brasileiro, porque isso faz parte
do sentimento próprio da sua inquestionável ideologia, mas já não seria
conveniente eles pensarem também do que seja realmente melhor para os interesses
do Brasil e da população, se o mandatário da nação decidisse, enfim, assumir a
postura de verdadeiro estadista, no sentido de cuidar exclusivamente das políticas
inerentes ao cumprimento das funções presidenciais previstas na Constituição Federal,
de apenas zelar da coisa pública e contribuir para o bem comum da sociedade,
com embargo do apoiamento cego a ele, em tudo, sem avaliação sobre possíveis atos
incompatíveis com os princípios do bom senso e da racionalidade?
Ante o
exposto, concito os brasileiros de boa vontade a se conscientizarem sobre a imperiosa
necessidade da compreensão no sentido de que os graves problemas da nação
somente serão devidamente enfrentados, por meio, em especial, da inteligência,
competência, eficiência e responsabilidade, cabendo ao principal condutor desse
gigantesco processo de soerguimento nacional se conscientizar de que somente há
o caminho do bom senso, da sensatez, da sensibilidade e da racionalidade, conquanto,
do contrário, qualquer forma de estupidez, como essa de perturbar os trabalhos
dos hospitais, nunca se chegará a resultados satisfatórios.
Brasília,
em 13 de junho de 2020
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