A
análise que se faz, agora, sobre o álibi apresentado pelo presidente da República,
de que ele estaria se referindo à dificuldade
para promover troca na segurança pessoal, no Rio de Janeiro, não estaria
vinculada à Superintendência da Polícia Federal, mas sim ao pessoal da própria
Presidência da República, teria sido
praticamente desmentido pelo depoimento do ministro-chefe do Gabinete de
Segurança Institucional, porque este contou outra versão para o mesmo fato, que
contribuiu para pôr por terra a já frágil argumentação presidencial, de que nunca
pensou em intervir naquele órgão.
O
que se imaginava tratar-se de perfeita estratégia palaciana sobre o caso era de
que, na reunião interministerial do dia 22 de abril, o presidente do país se referiu ao desejo de trocar a segurança pessoal, no Rio de Janeiro, mas não
a teria conseguido.
Não
obstante, até parecendo que o general faltou à reunião para o acerto do
combinado, na sua resposta aos questionamentos da Polícia Federal, no inquérito
pertinente às investigações para apurar o caso, ele declarou que não houve “óbices
ou embaraços” para a troca da segurança pessoal do presidente.
O
aludido inquérito é conduzido pelo Supremo Tribunal Federal, cujas investigações têm por base a acusação do ex-ministro da Justiça, que alegara que o presidente teria tentado
interferir, politicamente, na Polícia Federal, quando demitiu o seu diretor-geral
e ainda ter cobrado a troca da Superintendência no Rio de Janeiro, embora o
mandatário sempre tenha negado esses fatos.
Não
se pode negar que, na citada reunião, conforme mostra o vídeo divulgado por
decisão do Supremo, o presidente foi bastante enfático em reclamar que não podia mudar a segurança pessoal, no Rio de Janeiro, nestes termos: "Eu não vou
esperar f.... a minha família toda, de sacanagem, ou amigos meu, porque eu não
posso trocar alguém da segurança na ponta da linha que pertence a estrutura nossa.
Vai trocar! Se não puder trocar, troca o chefe dele! Não pode trocar o chefe
dele? Troca o ministro! E ponto final! Não estamos aqui pra brincadeira.".
À
toda evidência, o presidente do país, com indiscutível clareza, dirigiu recado
direto ao então ministro da Justiça, ao pronunciá-lo olhando para a direção onde
ele estava, quando o outro ministro da segurança pessoal dele, no Rio de Janeiro,
estava exatamente no lado oposto, mas ele ainda tem o desplante de dizer que não
se referia ao ex-ministro da Justiça.
Fica
sedimentado sentimento muito ruim por parte do presidente de tentar construir versão
que é desmentida por si só, porque a divulgação do vídeo cuida de mostrar exatamente
para quem, enfim, se destinava o recado do Planalto, que era realmente para o endereço
da Polícia Federal e não para o chefe da sua segurança pessoal, no Rio de
Janeiro.
Essa
questão fica plenamente dirimida quando o ministro-chefe do Gabinete de Segurança
Institucional, a quem é subordinada a segurança pessoal do presidente, responde
a questionamento da Polícia Federal, a pedido do Supremo, que "Não
houve óbices ou embaraços (para mudanças). Por se tratar de militares da
ativa, as substituições do Secretário de Segurança e Coordenação Presidencial,
do Diretor do Departamento de Segurança Presidencial e do Chefe do Escritório
de Representação do Rio de Janeiro foram decorrentes de processos administrativos
internos do Exército Brasileiro.".
Corroborando
tal afirmação, o referido ministro esclareceu, que, antes da reunião
ministerial, “houve duas trocas na equipe de segurança do presidente, apesar
de Bolsonaro ter dito oficialmente que não conseguia trocar a segurança
pessoal.”, pelo visto, em condições normais, ou seja, sem nenhuma dificuldade.
Esse
fato mostra que o presidente fica totalmente desacreditado nesse imbróglio,
porque essa situação só demonstra que ele não quis assumir seus atos, depois
que o ex-ministro da Justiça disse que ele queria mesmo interferir,
politicamente, na Polícia Federal.
Assim,
fica a impressão de que o presidente não teve a mínima firmeza para sustentar
seu ato absolutamente injustificável, por ter ficado claro que as mudanças
cogitadas eram realmente para proteger a sua família e amigos, conforme ficou
claro na declaração dele, transcrita acima, de que não ia esperar acontecer o
pior para ele promover as mudanças que pretendia.
As
contradições do presidente se tornam ridículas porque ele, logo imediatamente à
saída do ministro da Justiça, promoveu as mudanças que queria, que não eram
vistas com bons olhos pelo então titular da pasta, tanto que discordou delas, porque
entendia, com razão, que não havia nada que justificasse tal medida, salvo o
incômodo visivelmente demonstrado pelo mandatário brasileiro.
O
certo mesmo é que não fica bem para o presidente da República deixar de assumir
seus atos, como no presente episódio, em que ele queria mesmo interferir
politicamente na Polícia Federal, para colocar na sua direção pessoa da confiança
e da intimidade dele, de modo que ele pudesse ter acesso às informações pretendidas
por ele e completa proteção de pessoas da família e amigos, conforme tudo exposto,
às claras, por ele.
Ao
que parece, como isso funcionária como algo nada republicano, foi preferível o
arranjo de invenção de desculpa esfarrapada, que fora logo descaracterizada por
um de seus principais assessores, que, enfim, resolveu dizer a verdade, como
assim deve proceder todo cidadão de bem, sem temor de assumir seus atos.
Vejam-se
que, por ter deixado de assumir seus atos, que teriam por finalidade a interferência
em órgão de Estado e não de governo, tendo por objetivo unicamente, segundo ele
disse, a proteção de familiares e amigos, ou seja, com a intenção de resolver
assunto estritamente de interesse pessoal, estranho, obviamente, às causas públicas,
o presidente se envolveu em espetacular emboscada absolutamente desnecessária,
cuja dimensão poderá resultar na definição do Supremo de que ele realmente
pretendia e efetivamente conseguiu intervir na Polícia Federal, com a materialização
das mudanças na direção-geral do órgão e na Superintendência do Rio de Janeiro,
porque os próprios fatos só conduzem a esse insensato desfecho.
Urge
que o presidenta da República se conscientize, com urgência, de que os
brasileiros não suportam mais conviver com homens públicos que preferem se escudar
em versão muitas vezes sem a menor plausibilidade, para justificar o injustificável,
quando nada melhor do que assumir a verdade, desde logo, mesmo que isso não lhe
seja favorável, mas certamente não haverá a menor possibilidade de ter que
ficar desacreditado, diante de não ter como sustentar a versão mentirosa, nada
elegante para quem precisa manter a dignidade e a credibilidade de mandatário do
Brasil.
Brasília, em 24 de junho de 2020
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