quarta-feira, 20 de novembro de 2024

Desprezo à democracia

 

A Polícia Federal prendeu um general da reserva, três oficiais militares e um policial federal, suspeitos de participação em trama para assassinar o então presidente e seu vice eleitos em 2022, além do sequestro e execução de um juiz da maior corte do país, tendo por base elementos apreendidos na Operação Tempus Veritatis. 

Segundo aquela corporação, a sua operação é desdobramento do inquérito que investiga uma "organização criminosa", suspeita de atuar em tentativa de golpe de Estado e abolição do estado democrático de direito, após o resultado da eleição presidencial de 2022, vencida por candidato da oposição ao então presidente do país.

Essa investida amplia as suspeitas sobre golpe de Estado, atribuído ao último ex-presidente do país, em cujo relatório encaminhado àquela corte a Polícia Federal conclui que esse político, em dezembro de 2022, "estava naquele momento empenhado para consumação do golpe de Estado, tentando obter o apoio das Forças Armadas".

A Polícia Federal indica, de forma categórica, o suposto envolvimento do ex-presidente do país com a trama golpista, ao afirmar que ele teve conhecimento do plano elaborado pelos militares presos.

Nas diligências empreendidas, a Polícia Federal teria encontrado arquivos relacionados com o suposto golpe de Estado, sendo um que tratava dos assassinatos por envenenamento e até por meio de um atentado a bomba; uma planilha com o planejamento estratégico da ruptura institucional, dividido em cinco fases; e a minuta de criação de um gabinete de crise, que "pacificaria" o país, após o golpe.

A Polícia Federal identificou que o grupo suspeito de golpe de Estado era formado, em sua maioria, por militares com formação em Forças Especiais táticas, que "se utilizou de elevado nível de conhecimento técnico militar para planejar, coordenar e executar ações ilícitas nos meses de novembro e dezembro de 2022".

O plano previa o assassinato do candidato eleito por envenenamento ou "uso de químicos para causar um colapso orgânico", considerando a vulnerabilidade de saúde e ida frequente a hospitais do político.

O documento enviado à corte também contém detalhes sobre a possível execução das outras duas pessoas, mostrando "... verdadeiro planejamento com características terroristas".

O plano para a eliminação do juiz demandava meios mais pesados, como envenenamento em evento oficial público e ainda o uso de "artefato explosivo" e armas pesadas, por exigirem a eliminação de outras pessoas da segurança dele.

Consta do documento a descrição dos armamentos necessários à concretização do plano, como pistolas e fuzis, comumente utilizados por policiais e militares: "inclusive pela grande eficácia dos calibres elencados"; além de uma metralhadora, um lança-granadas e um lança-rojão, "armamentos de guerra comumente utilizados por grupos de combate".

A Polícia Federal esclarece que o grupo trabalhava com a possibilidade de assassinato do juiz, porque "Tal fato é reforçado pelo tópico denominado ‘Danos colaterais passíveis e aceitáveis’".

A Polícia Federal informa que o plano foi impresso no Palácio do Planalto, por duas vezes, a primeira em 9 de novembro de 2022, quando o documento teria sido levado ao Palácio da Alvorada e a segunda, no dia 6 de dezembro.

Em uma das operações, o grupo utilizava técnicas de vigilância, veículos oficiais e medidas de anonimização, como uso de celulares descartáveis e codinomes inspirados em países que realizaram a Copa do Mundo de Futebol.

Os investigadores revelaram que o plano chegou a ser iniciado, mas foi imediatamente abortado, quando integrantes do grupo se mobilizaram e se posicionaram em pontos estratégicos, na região próxima à casa do juiz, com a monitoração da movimentação dele, em tempo real.

Segundo o inquérito, um militar teria encaminhado para outro militar relatos sobre a segurança do presidente eleito, inclusive sobre a presença de policiais de força tática na equipe de segurança.

Além disso, ele se colocou à "disposição para atuar no golpe de Estado, demonstrando aderência subjetiva à ruptura institucional. Eu e minha equipe estamos com todo equipamento pronto para ir ajudar a defender o Palácio e o presidente. Basta a canetada sair!", ou seja, a execução do plano dependia da autorização superior.

A Polícia Federal sinalizou que o indiciamento do ex-presidente é medida que pode estar muito próxima, porque há vários elementos em que isso fica claro, como a troca de mensagens entre um militar e o ajudante de ordem dele, em 9 de novembro, quando o militar comemorou que o então presidente "aceitou o nosso assessoramento".

Há citação categórica, no relatório, sobre possível envolvimento do então presidente do país com o trama golpista, lembrando que ele teria "redigido e ajustado" a minuta de golpe que circulou entre seus aliados, após o segundo turno da eleição presidencial de 2022.

É incrível a criatividade indiscutivelmente selvagem e promíscua desses militares, que são capazes de elaborarem planejamento ambicioso e eficiente sobre esquema de golpe de Estado, envolvendo o assassinato de políticos e autoridade importantes da República, mas são extremamente incapazes de mantê-lo em sigilo, conforme a ostensividade dos fatos descritos com base nas investigações pertinentes, cujos elementos e informações são robustos e consistentes, mostrando o seu efetivo envolvimento na tentativa de golpe de Estado.

Como explicar que militares e o até mesmo a possível participação do presidente do país consigam elaborar projeto audacioso e ao mesmo tempo monstruoso, com múltiplos detalhes e nuances operacionais e outras medidas inerentes aos fins colimados, além da gigantesca responsabilidade, em termos da culpabilidade por suas consequências, caso ele fosse realmente executado, tal e qual na forma como arquitetado, cujo resultado é exatamente nenhum, senão a prisão de alguns envolvidos, que jamais deveriam ter participado de plano desastroso e macabro como esse?

Não obstante, agora, compete aos militares envolvidos no suposto golpe em apreço comprovar a sua inocência, por meio de elementos probantes, evidentemente se isso for permitido, sob a ótica do devido processo legal, mediante a ampla defesa e o contraditório.

Enfim, os brasileiros realmente patriotas repudiam, com veemência, qualquer forma de golpe de Estado, sob a consciência de que, por pior que o Brasil esteja mergulhado em crise institucional, o único caminho a ser seguido será sempre o respeito aos princípios democráticos, com embargo de medidas que levem à violência e à selvageria.  

Brasília, em 20 de novembro de 2024

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