segunda-feira, 19 de março de 2012

Descaramento fenomenal

O Fantástico mostrou, em reportagem abrangente e especial, o verdadeiro funcionamento dos esquemas altamente especializados para fraudar licitações de saúde pública, envolvendo empresas privadas e funcionários públicos, os chamados gestores de compras. O diretor do hospital público reconhece que fraudes são comuns nas contratações hospitalares e assevera “Todo comprador de hospital, a princípio, é visto como desonesto. Acaba que essa associação do fornecedor desonesto com o comprador desonesto acaba lesando os cofres públicos. E a gente quer mostrar que isso não é assim, em alguns hospitais não é assim que funciona”. Os procedimentos inerentes às fraudes foram filmados em ângulos diferentes e conduzidos por todas as fases, à exceção do pagamento, uma vez que não houve concretização do negócio. O certo é que houve a comprovação de que as empresas se unem em conluio para fraudar a disputa, sabendo que as perdedoras, que oferecem valores altos, vão ganhar porcentagem do contrato. Um gerente garantiu que "Eu faço isso direto. Tem concorrência que eu nem sei que estou participando,". Nas conversas, o que mais se discutia era o percentual do dinheiro sujo a ser repassado para o gestor de compras e a forma ideal para a entrega da propina, sendo que todos garantiram que o golpe é seguro e o pagamento é realizado em dinheiro, dentro de caixas de uísque ou de vinho. O descaramento da irregularidade é claro, aberto, direto e funciona assim: "Eu vou colocar o meu custo, você vai falar assim: ‘Bota tantos por cento’. A margem, hoje em dia, fica entre 15% e 20%" e "Nós temos hoje, aproximadamente, três mil clientes nessa área de coleta". A fraude é escondida da fiscalização mediante a pulverização dos valores em diversos itens da proposta e isso já se tornou costumeiro, porque ela é "ética de mercado". É bastante louvável o trabalho especial, de qualidade técnica superior, mostrado pelo competente profissional do Fantástico, cujas perspicácia, abrangência e detalhe das abordagens dão irrefutável veracidade aos levantamentos, feitos com cuidado, capacidade e profundidade, revelando, de forma bem sutil e irretocável, os meandros da corrupção que existe não somente na saúde pública, mas, infelizmente, em todos os segmentos empresariais contratados pelo Estado. Na realidade, os fatos ora revelados não são novidade alguma, porque todo mundo sabe da existência generalizada dessa praga cancerosa que carcome os recursos públicos, mas os governantes se mostram incapazes de detectá-la e nada fazem para tornar eficientes os sistemas de licitação pública, onde os dinheiros dos contribuintes são torrados, ante as notórias ineficiência e deficiência do controle e da fiscalização que o caso exige para moralizar a gestão pública. Não há qualquer dúvida de que essas empresas, por terem confessado espontaneamente seus procedimentos desonestos e irregulares, podem perfeitamente ser enquadradas em crime contra a humanidade, pela prática de sobrepreços e de fraudes, causando desvio de recursos públicos dos hospitais, em grave dano ao maior e melhor atendimento à saúde da população, estando, por isso, passíveis de rigorosas punições, para que as medidas adotadas sirvam de exemplo às demais empresas. Urge que as autoridades públicas se empenhem com vistas à criação de instrumentos legais capazes de modernizar e tornar eficientes os procedimentos de licitações públicas, destinados à aquisição de serviços e à contratação de obras e serviços, de modo a extirpar em definitivo os esquemas de corrupção, as fraudes e outras irregularidades com dinheiros públicos e prever rigorosas penalidades aos infratores dessas normas. Acorda, Brasil! 

ANTONIO ADALMIR FERNANDES
 
Brasília, em 18 de março de 2012

Nenhum comentário:

Postar um comentário