Do total
da pena, 24 anos e 9 meses se referem à reclusão, que exige o cumprimento em
regime fechado e o restante diz respeito à detenção, com cumprimento em regime
semiaberto ou aberto.
Como a
pena total é superior a 8 anos, o ex-presidente será obrigado a começar a
cumpri-la em regime fechado, mas somente depois do processo transitar em
julgado, ou seja, após o esgotamento dos recursos cabíveis.
Por conta
do efeito da Lei da Ficha Limpa, o ex-presidente fica inelegível por 8 anos,
após o cumprimento da pena.
O
Ministério Público mencionou que o ex-presidente tentou derrubar a democracia e
impedir a posse do presidente do país, embora não tenha nada que comprove nada
disso, salvo narrativas inconsistentes.
A citada
corte concluiu que o ex-presidente é culpado pela prática de cinco crimes, a
saber: tentativa de golpe de Estado; tentativa de abolição violenta do Estado
democrático de Direito; organização criminosa armada (sem a comprovação de
nenhuma arma); dano qualificado contra patrimônio da União; e deterioração de
patrimônio tombado.
Todos
esses demoníacos crimes estão devidamente descritos no voto do relator do
processo e devidamente imputados à autoria do político, como realmente tendo
ele os praticado e assim causado os danos a que eles representam, tanto assim
que a dosimetria das penas foi aplicada em razão dos “estragos” decorrentes da
prática dos crimes, que resultaram em 27 anos e 3 meses de prisão, para a forma
da reparação penal.
Impende
mencionar que a principal ideia ou teoria do que seja crime, na forma prevista
na legislação penal, condiz com o fato socialmente danoso, que causa ou resulte
prejuízo à sociedade como um todo ou particular.
Existe a
teoria jurídica segundo a qual a culpabilidade não deve ser baseada apenas na
intenção do autor do crime, mas também no resultado do ato danoso praticado, ou
seja, compreende-se que pode haver pena sim pela intenção do crime, mas jamais
por sua plena extensão, como se o crime tivesse sido consumado na sua integridade.
Ou seja, a
culpa pelo crime é configurada, necessariamente, quando o comportamento criminoso
tenha causado resultado proibido e danoso à sociedade.
Acreditava-se
que a aplicação da pena precisava ser levada em conta a necessidade da reparação
da lesividade à sociedade, nesse caso imputado pessoalmente à autoria do ex-presidente.
Alguém
tem conhecimento dos danos pessoalmente causados pelo ex-presidente à sociedade
ou ao Estado?
É
inacreditável, por não haver a consistência jurídica, que alguém seja condenado
pela imputação da autoria dos crimes da maior gravidade, como os da tentativa
de golpe de Estado; tentativa de abolição violenta do Estado democrático de
Direito; organização criminosa armada (em a existência nenhuma arma); dano
qualificado contra patrimônio da União; e deterioração de patrimônio tombado,
sem que esteja comprovada a sua participação ativa dele, com capacidade efetiva
de lesividade a absolutamente nada nem ninguém.
É até
provável que em casos de menor gravidade, o político possa ter tido alguma participação,
mas, ao final, não resultou absolutamente nenhum dano praticado pessoalmente
por ele, ante a completa ausência de prejuízo causado a alguém.
Esse fato
por si só até poderia ensejar alguma forma de punição, no máximo, em forma de
advertência ou alerta, à vista da relevância do cargo ocupado por ele, mas a
pena de prisão parece fora do padrão compatível com a gravidade do delito não
efetivado por ele, mas apenas intencionado, nos casos do seu conhecimento.
Pois bem,
na interpretação da maioria da turma julgadora, a penalidade aplicada corresponde
ao delito praticado pelo político, que, aliás, essa sanção não teve o acompanhamento de um juiz, que
considerou improcedentes as acusações contra ele.
O relatório-voto
desse juiz diverge diametralmente do entendimento da turma, ao defender a
anulação do processo contra o político, por considerar a incompetência
constitucional e absoluta da corte, além de apontar cerceamento de defesa e
outras gravíssimas irregularidades.
Em
síntese, o juiz divergente dos demais disse o seguinte:
“Os
réus desse processo, sem nenhuma prerrogativa de foro, perderam os seus cargos
muito antes do surgimento do atual entendimento. O atual entendimento é
recentíssimo, deste ano”.
“A minha
primeira preliminar, ela anula completamente o processo por incompetência
absoluta”.
“Salta
aos olhos a quantidade de material comprobatório apreendido. Foi um verdadeiro
‘tsunami de dados’, bilhões de páginas entregues às defesas em prazo exíguo”.
“O juiz
deve acompanhar a ação penal com distanciamento, não apenas por não dispor de
competência investigativa ou acusatória, como também pelo necessário dever de
imparcialidade”.
“Um
acusado não pode ser responsabilizado por um dano provocado por terceiro.
Especialmente se não houver a prova de qualquer vínculo ou determinação
direta”.
“Aqui reside
a maior responsabilidade da magistratura: condenar quando há certeza e, o mais
importante, humildade para absolver quando houver dúvida”.
“A
denúncia não narrou, em qualquer trecho, que os réus pretendiam praticar
delitos reiterados de modo permanente, como exige o tipo de organização
criminosa”.
“Ao
rebaixar a competência original do plenário para uma das turmas, estaríamos
silenciando as vozes de ministros que poderiam esterilizar a forma de pensar
sobre os fatos”.
“A
prerrogativa de foro sofreu inúmeras modificações. Houve certa banalização
dessa interpretação constitucional”.
O resumo
de fatos importantes apontados acima mostra o total desprezo dos demais juízes
aos sagrados princípios constitucionais de necessária e estrita observância em
casos que tais, servindo de denúncia de desprezo à verdade, à legitimidade e
principalmente à segurança jurídica, princípios estes que jamais podem ser ignorados
em país com o mínimo de seriedade, em termos republicanos e democráticos.
A
propósito desse julgamento, um juiz aposentado da corte afirmou que o voto do
juiz divergente é “memorável” e permanecerá nos anais da corte, por se
tratar de voto tecnicamente afinado com
o Direito, a par de também dizer que foi exposto nele a clareza do problema
jurídico central do caso, ao sugerir que o processo fosse julgado pelo plenário,
tendo considerado que o voto “desvelou de forma cristalina os limites legais
da Corte e deverá servir como referência futura.”.
Diante
constatação, resta a perplexidade de os quatro outros julgadores não enxergarem
qualquer anomalia no processo, dando por tudo muito correto, o que demonstra
algo errado e questionável, à luz dos princípios da verdade e da regularidade,
fato que parece muito estranho, em se tratando da principal corte do país.
Enfim, na
minha modesta opinião, evidentemente na avaliação leiga, a condenação à prisão do
ex-presidente é mais do que injusta, à vista da indevida utilização do padrão
político, embora ela tenha o condão de mostrar, quer queira ou não, com muita
precisão e em forma de síntese, o conjunto dos desvios de conduta protagonizados
por ele, em gestão carregada de muita polêmica e sobressaltos.
Tratava-se
de governo que descurou do seu foco central, na essencialidade das funções do verdadeiro
estadista, onde prevaleceu a promiscuidade em muitas discussões absolutamente
desnecessárias e injustificáveis com integrantes de outros poderes da República,
fazendo o jogo de interesses deles.
O certo é
que o político não teve a sensibilidade nem a expertise para perceber que teria
caído em teia de aranha que ele se metia ingenuamente, cujo caminho o levaria
ao completo suicídio, desaguando justamente na tragédia que se encontra ele e o
país.
A
história mostra que faltou experiência política sobre a real finalidade do
verdadeiro estadista, quando ele esteve muito mais focado nos seus projetos políticos,
não se preocupando em nenhum momento com a pacificação do país, mas sim em
mostrar autoridade e poder, tudo na tentativa de conquistar popularidade, cujas
atos errôneos contribuíram para a tragédia que ele, o Brasil e os brasileiros estão
mergulhados muito além dos limites de todas e piores gravidades.
Caso
houvesse o mínimo de inteligência política, seria possível enxergar que a presente
prisão devolve ao ex-presidente do país, embora muito tarde, porque ela sepulta
de vez a sua carreira política, a possibilidade de ele refletir sobre todo o
seu governo, para o fim de que era necessário tão somente o empenho, com
competência, eficiência e responsabilidade, dos assuntos estritamente de
incumbência do estadista, com os cuidados apenas das atribuições inerentes ao
poder Executivo.
Brasília,
em 12 de setembro de 2025
Nenhum comentário:
Postar um comentário