Quando
já se imaginavam que o tanto de vídeos já mostrados pela mídia seria suficiente
para evidenciar o rastro da explícita fragilidade moral de políticos, eis que
vêm a público novos vídeos, divulgados ontem, em extensa reportagem da lavra do
Fantástico da Rede Globo, contendo outros flagrantes sobre pagamento de propina.
Os
aludidos vídeos mostram esquema de corrupção em franco e descarado desvio da já
escassa verba pública, perpetrado mediante o pagamento de propinas e fraude em
licitação para a execução de obras a cargo da Prefeitura Municipal de Uiraúna.
Segundo
o artigo publicado pelo site G1, a referida irregularidade aconteceu, verbis:
“num município pobre e que sofre com um problema crônico de falta de água.
Justamente em obras que poderiam solucionar a falta de água da região, onde os
açudes estão praticamente secos.”.
A
reportagem disse que o Fantástico esteve em Uiraúna, “conversou com
moradores pobres que sofrem com a falta de água, e apresentou detalhes do
esquema. Enquanto a dona de casa Libéria de Santana, por exemplo, consome água
de má qualidade, suja, porque nem chega água potável em sua casa nem ela tem
dinheiro para comprar água limpa proveniente de poço, os políticos desviam
recursos públicos destinados justamente à solução do problema da escassez de
água.”.
O
Fantástico chamou a atenção para o fato de que as pessoas envolvidas nesse imbróglio
serem políticos acostumados ao exercício do poder local, sendo que o prefeito é
mais conhecido, já estando em seu quinto mandato não consecutivos como prefeito
do município de cerca de 15 mil habitantes, enquanto o deputado está no seu
terceiro mandato na Câmara dos Deputados.
Segundo
a Polícia Federal, o esquema era comandado por empresário dono de construtora
que já realizou duzentas obras públicas e que, no caso em causa, em troca de
propina, ele teria sido beneficiado pela Prefeitura de Uiraúna, tendo vencido licitação
fraudulenta.
Conforme
a referida reportagem, a defesa do deputado alega que ele nunca recebeu propina,
também não tem conhecimento de que seus assessores tenham recebido e que “O
deputado tem total interesse no esclarecimento desses fatos até para que ele
possa comprovar a sua inocência. E demonstrar que o delator tão somente está
fazendo essas acusações para auferir os benefícios da delação premiada”, esquecendo
a defesa de que esta é forma legal instituída justamente para beneficiar o
delator, cuja menção a esse instituto só complica a situação do acusado, ao
invés de contribuir para a sua inocência.
Os
advogados do empresário delator disseram que ele decidiu “colaborar com a
justiça para corrigir condutas avaliadas como ilícitas”.
A
defesa do prefeito informou que só se manifestará após conhecimento e análise
da denúncia.
Não
há a menor dúvida de que é realmente de cortar coração assistir ao programa
Fantástico da rede Globo e se surpreender com reportagem gravada exclusivamente
na querida Uiraúna e logo acerca de horroroso esquema de corrupção, na cidade
que meu coração mais ama, por ser meu honrado berço e de tantos homens dignos,
sensatos e, sobretudo, extremamente honestos, incapazes de trair, de qualquer
maneira, o carinho e a confiança de seus conterrâneos.
Realmente,
foi com muita tristeza no coração que vi o Brasil inteiro ficar sabendo que
dois nobres homens e lídimos representantes do povo de Uiraúna se tornarem, segundo as provas mostradas pela imprensa, capazes
de cometer o vil crime, ao mesmo tempo, da infidelidade popular, da desonestidade
e da imoralidade, em troca de algo praticamente irrisório, porque não é o valor
em si, muito ou pouco, que faz o político perder a dignidade, o respeito e a
confiança depositada nas urnas, justamente porque a sua conduta ilibada, o seu
caráter e a sua correção precisam estar sempre acima de quaisquer suspeitas,
quanto mais diante da realização de obra pública emergencial e prioritária, em
benefício da população.
Trata-se,
induvidosamente, de verdadeira tragédia para o povo honrado de Uiraúna, que é
berço de filhos ilustres com histórico de sempre desempenharem cargos públicos
da maior ou menor importância na administração pública brasileira e jamais e em
momento algum haver notícia de que ninguém tivesse locupletado de dinheiro sujo,
que tivesse por finalidade a aplicação em projeto de relevância para sociedade.
Diante
da gravidade dos fatos havidos, tudo indica que as pessoas envolvidas nesse
triste episódio hão de passar para a história como os primeiros filhos de
Uiraúna que tiveram a sua honra manchada por desvio de dinheiro do contribuinte,
ficando o sinete da imaculabilidade marcado, de forma indelével, nos seus nomes
como sendo aqueles que tiveram seu momento de fraqueza moral e, o pior, por suas
próprias iniciativas, mesmo sabendo do alto risco de revelação, como de fato foi
o que realmente aconteceu, infelizmente.
A
verdade é que esses cidadãos conseguiram jogar na lama as suas grandiosas carreiras
políticas, construídas ao longo de suas vidas, mesmo que sob a égide do devido processo
legal, inclusive do julgamento judicial para o cumprimento da formalidade dos
autos, para mera comprovação dos atos ilícitos, porque certamente as suas
consciências falam eloquentemente por suas traquinagens e ainda que precisarem
de algum adjutório, nesse sentido, os vídeos e as fotografias coligidos pela Polícia
Federal, que foram amplamente divulgados pelos meios de comunicação, podem
servir para o avivamento de suas lembranças nebulosas.
É
evidente que, até se pode alegar, nesse caso, diante dos agravantes de peso,
mostrados à saciedade, que os envolvidos têm o direito constitucional da ampla
defesa e do contraditório, o que não deixa de ser verdade, em termos de
argumento, mas eles terão muita dificuldade em convencer a Justiça em contrário
dos acontecimentos, porque os fatos falam por si sós e eles possivelmente não
devem encontrar álibi perfeito à sua inocência, à vista, repita-se, de as
fotografias e os vídeos que os incriminarem mortalmente, por mostrarem fatos
praticamente consumados do crime.
Por
seu turno, não se pode ignorar o sentimento de apoio aos envolvidos nesse deprimente
episódio, porque isso pode até ser compreensível no âmbito familiar, de amizade
ou mesmo de conveniência ou interesse diverso, mas é preciso também que essas
pessoas sintam e entendam a perplexidade sobre o fato, por parte daqueles que
não concordam, por princípios, de maneira alguma, com o desvio de dinheiro público,
considerando que a gestão de verbas orçamentárias exige a rigorosa observância
dos princípios da administração pública, no que diz respeito à ética e à moralidade.
Do
mesmo modo, é preciso que fique muito claro que a discussão da questão em
comento cinge-se exclusivamente ao fato irregular em si, por ser absolutamente
inusual e anormal na gestão de recursos públicos, quando o correto é a estrita
observância aos princípios da legalidade, da correção, na aplicação de verbas
públicas, conquanto ficam preservados outros atributos dos envolvidos sobre a sua
vida particular, porque eles são diferentes da vida pública, das atividades próprias
da política que condizem à necessidade da satisfação de interesse público, o
que é distinta das atividades particulares.
Ou
seja, nesse caso, o que está em jogo e tem objeto de específica investigação é o ato inquinado ou suspeito de
irregular, que veio à tona, por força de investigação promovida por autoridade
constituída legalmente, sem qualquer interferência com a integridade pessoal
inerente às atividades particulares dos envolvidos, o que vale dizer que, se
eles conseguirem provar a sua inocência, restabelece-se o direito à plena
moralidade também quanto ao exercício das atividades públicas.
Enfim,
é bastante lamentável que essa triste reportagem do Fantástico tenha sido
veiculada exatamente no mesmo dia, embora tempos depois, do encerramento das
festividades em homenagem à Padroeira de Uiraúna, que bem merecia notícia de
cunho muito mais dignificante, consentâneo com a sua grandeza histórica de
honradez e acatamento aos princípios e às condutas inerentes aos deveres
cívicos.
Brasília, em 13 de janeiro de 2020
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