sexta-feira, 2 de fevereiro de 2018

Basta à soberba?

A presidente do Supremo Tribunal Federal disse, na sessão solene que marcou a abertura do Ano Judiciário de 2018, que “Pode-se ser favorável ou desfavorável à decisão judicial pela qual se aplica o direito. Pode-se buscar reformar a decisão judicial, pelos meios legais, pelos juízos competentes. É inadmissível e inaceitável desacatar a Justiça, agravá-la ou agredi-la. Justiça individual fora do Direito não é Justiça, senão vingança ou ato de força pessoal”.
A presidente completou seu raciocínio, lembrando que “Sem liberdade, não há democracia. Sem responsabilidade, não há ordem. Sem justiça, não há paz”.
O aludido pronunciamento aconteceu uma semana depois que o ex-presidente da República petista ter afirmado que “não tem nenhuma razão para respeitar a decisão” da 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, quando a sua pena de prisão foi elevada de nove anos e seis meses para doze anos e um mês, pela prática dos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
Durante o recesso do Judiciário, a presidente do STF tomou decisões que desagradaram ao Palácio do Planalto, a exemplo da suspensão de parte do indulto de Natal, que consiste no perdão da pena, tendo sido assinado pelo presidente do país e do veto à posse da deputada federal carioca (PTB) como ministra do Trabalho.
No ato, em tom de reaproximação, a presidente do Supremo disse esperar que 2018 “seja tempo de superação em nossa dificultosa história, para que fases mais tristes sejam apenas memórias de dias de tormenta passada”.
A presidente ressaltou, na presença dos presidentes da República, do Senado Federal e da Câmara dos Deputados - que são investigados em inquéritos que tramitam no Supremo -, “Que não tenhamos de ser lembrados pelo que não fizemos, ou pior, pelo que desfizemos do conquistado social e constitucionalmente. Que se recordem de nós pelo que conseguimos contribuir para garantir, que as conquistas histórias não foram esquecidas, que a Constituição não foi descumprida, que a República não se perdeu em nossas mãos, nem a democracia em nossos ideais e práticas”.
A presidente disse que os povos são postos à prova sempre, porque “em alguns momentos mais que outros”. “Não há civilização nacional enquanto o direito não assume a forma imperativa traduzindo-se em lei. A lei é, pois, a divisória entre a moral pública e a barbárie”, em referência a trecho do jurista e político Ruy Barbosa (1849-1923).
Ela foi além, dizendo que “O respeito à Constituição e à lei é a garantia do direito para cada um de nós, cidadãos. A nós, servidores públicos, o acatamento irrestrito à lei impõe-se como dever, acima de qualquer outro. Constitui mau exemplo o descumprimento da lei, e o mau exemplo contamina e compromete. Civilização constrói-se sempre com respeito às pessoas, que pensam igual ou diferente. Enfim, civilização constrói-se com respeito às leis vigentes, que asseguram a liberdade e a igualdade. O Judiciário aplica a Constituição e a lei. Não é a Justiça ideal, é a humana, posta à disposição de cada cidadão para garantir a paz”.
Com o devido respeito ao Judiciário, mas o desacato a esse poder, com as devidas vênias, decorre certamente em razão de ação ou omissão de sua parte, permitindo que pessoas condenadas possam abusar do direito de dizer, em palanque público, em tom de extrema soberba, que não respeita decisão judicial e simplesmente o Judiciário fica silente, aceitando passivamente insultos e críticas inadmissíveis.
A despropositada rebeldia deveria ter sido imediata e devidamente rechaçada, em termos adequadamente à altura, com reprimenda dura e exemplar, mostrando, de forma repressiva direta ao caso, mostrando que a incitação ao desacato pode implicar medida judiciária pertinente, em razão da desconformidade dessa atitude com a relevância da instituição, que age e atua com respaldo em ditames constitucional e legal e que os cidadãos têm obrigação cívica de se submeter a eles, observado o direito constitucional da ampla defesa e do contraditório, na via apropriada, ou seja, nos autos.
A partir do momento em que as pessoas prepotentes e agressivas, que se julgam enganosamente que estão acima do regramento jurídico, cometerem o abuso em afronta à Justiça e forem, por isso, prontamente questionadas e devidamente alertadas sobre as medidas corretivas passíveis que estão sujeitas, elas certamente passam a compreender que a inútil e bestial insolência não combina com os salutares princípios republicano, democrático e de civilidade. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES

Brasília, em 2 de fevereiro de 2018

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