Em desesperada tentativa de evitar a prisão do ex-presidente
da República petista, seus advogados impetraram pedido de habeas corpus no
Supremo Tribunal Federal, sob a alegação de que ele possa recorrer em liberdade
contra a condenação, pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, a doze anos e
um mês de prisão, por corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
Registre-se que pedido análogo já havia sido feito
ao Superior Tribunal de Justiça, que negou a concessão da liminar requerida, o
qual se encontra agora pendente do julgamento do mérito.
Impende salientar que a Súmula nº 691, de 2003, estabelece
rigorosamente o seguinte: “Não compete ao
STF conhecer de habeas corpus impetrado contra decisão do relator que, em
habeas corpus requerido a tribunal superior, indefere a liminar.”, o que significa
dizer exatamente que o Suprema não tem competência para analisar recursos como
o que foi apresentado pelo político nessa Corte, visto que ainda pende de
julgamento no STJ, pedido com a mesma finalidade, fato este que implica o simples
indeferimento e arquivamento dela, por óbvio.
Tendo por base o julgamento de reiterados casos semelhantes,
os tribunais formulam súmula sobre o tema, que passa a ser aplicada, á do entendimento
sumulado, nos casos similares, como forma de uniformização e facilidade de
procedimentos, além da garantia da segurança jurídica, evitando decisões
divergentes para situações idênticas.
Um ministro do Supremo traduziu o conteúdo da aludida
súmula, para melhor entendimento popular, tendo dito que “Nos casos em que há apenas pronunciamento liminar (provisório) de outro tribunal superior, sem decisão
definitiva, o Supremo não pode admitir a concessão de habeas corpus. Em
verdade, o Supremo não deve nem analisar o mérito do pedido, a menos que se
trate de uma situação que nós chamamos de teratológica, bem absurda.”.
O termo teratologia empregado pelo magistrado é uma
especialidade médica e que, às vezes, ele é citado por advogados, em comparação
às patologias caracterizadas por monstruosidades e malformações orgânicas do
corpo humano.
Quando usado o termo por advogados, em forma de
metáfora, é como se fosse força de expressão para se dizer que se trata de decisão
teratológica sob o prisma do Direito, dando a ideia de monstruosidade que precisa
ser revista e corrigida.
O ministro disse que “Não parece ser o caso do processo que envolve o ex-presidente Lula.”.
Os três desembargadores que julgaram o petista
deixaram muito claro que a execução da sentença a que se refere a ele se dará
depois que for encerrada a fase de análise do recurso do condenado, no próprio
TRF-4. Ou seja, sem prejuízo dos pedidos que sua defesa encaminhará aos
tribunais superiores de Brasília, o político pode ser preso no complexo-médico
penal de Pinhais, o presídio paranaense que abriga os condenados da Lava-Jato,
o que pode justificar o desespero e o corre-corre dos advogados, para se evitar
a prisão dele.
Como é sabido, há no Supremo dois colegiados, cada qual
com cinco ministros, sendo que, na Primeira Turma, os ministros procuram respeitar
os termos da supracitada Súmula nº 691, que veda a concessão de habeas corpus
nos casos ainda não julgados definitivamente pelo STJ.
É comum os ministros dessa turma mandarem para o
arquivo recursos do tipo que foi protocolado pelos advogados do petista, porque,
no caso dele, o habeas corpus espera por decisão definitiva do STJ.
Não obstante, o pedido do petista foi enviado para o
ministro-relator da Lava-Jato no Supremo, que faz parte da Segunda Turma, onde
a citada súmula tem validade relativa, porque a maioria dos ministros diverge dela
e somente o aludido relator a aplica ao pé da letra, mas ele termina em desvantagem,
por ser minoria na turma, considerando que os demais ministros são mais liberais
na concessão de habeas corpus.
Espera-se que o ministro-relator decida pelo
indeferimento da liminar de que trata o habeas corpus do petista, mas também é
certo que os advogados dele vão insistir que o pedido seja apreciado pela
Segunda Turma.
Nesse particular, parece que a briga pode render pouco
mais, porque o ministro-relator, sabedor das tendências concessivas de seus pares
da Segunda Turma, pode simplesmente submeter o julgamento para o crivo do plenário
do Supremo, a exemplo do que já foi feito com relação ao habeas corpus de
interesse do ex-ministro da Fazenda do governo petista, visto que medida nesse
sentido tem amparo Regimento Interno do Supremo, fato que pode se evitar que o
político fique em liberdade muito antes do tempo.
Contribui para que o pedido do político seja
submetido ao plenário do Supremo o fato de se tratar de caso de ex-presidente
da República, que precisa ter a manifestação dos integrantes da Corte.
Impende ainda lembrar que, a despeito da condenação
do petista, a presidente da Excelsa Corte disse, em forma de cautela, que o
tribunal iria se “apequenar” se usasse
a pena aplicada ao petista para alterar a regra que autoriza a prisão de
condenados em primeira e segunda instâncias.
Na verdade, esse deve ser o sentimento que precisa
prevalecer quanto à analise e à decisão sobre o pedido de habeas corpus em
comento, de modo que não possa ficar materializada a infeliz ideia de que o
Supremo ignorou o entendimento esposado na sua súmula para beneficiar condenado
pela Justiça, que aguarda decisão em pedido de habeas corpus em análise no
Superior Tribunal de Justiça.
Como se vê, o pedido de habeas corpus interposto
pelo ex-presidente da República petista pode servir para testar a real capacidade
do Supremo Tribunal Federal de mostrar ao país a sua firme persistência em
defesa do combate à corrupção e à impunidade, por não se vergar a nenhuma forma
de concessão nem facilitação na interpretação das normas aplicáveis à sua missão
constitucional, sob pena de vir a pecar em desprezo à autonomia do Superior
Tribunal de Justiça, que precisa antes decidir sobre pedido com mesmo teor, e
ainda fazer letra morta e mandar para a lixeira a sua Súmula nº 691, que
precisa ser fortalecida e consolidada, em respeito ao primado da segurança
jurídica, além de se evitar que a Corte Máxima da Justiça não seja
ridicularizada e apequenada, para sempre. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
Brasília, em 5 de fevereiro de 2018
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