É
mais do que notório que se trata de verdadeira revolução do mundo jurídico a mudança
no entendimento do Supremo Tribunal Federal, em 2016, para que sentenças possam
começar a ser cumpridas antes do “trânsito
em julgado” — ou seja, esgotados os intermináveis e indefiníveis recursos
na via judicial — foi reforço importante e considerável no enfrentamento da
corrupção e da impunidade.
É
induvidoso que a possibilidade de o réu ser preso depois da confirmação da condenação
em segunda instância, combinada com a entrada em vigor, em 2014, de legislação
sobre organizações criminosas, reformatando o mecanismo da “colaboração premiada”, aumentou de forma
significativa a eficácia da atuação da Polícia Federal, do Ministério Público
Federal e da Justiça Federal no combate às ações delituosas dos criminosos de
colarinho branco, antes praticamente inalcançáveis pela legislação penal.
Até
2009, o Supremo entendia, com base nas súmulas 716 e 717, que era possível
iniciar-se o cumprimento da pena antes do transitado em julgado, em 2016, no
julgamento de habeas corpus, foi reafirmada esta possibilidade, porém em
estágio liminar.
Diante
de o peso do aludido entendimento e mais a delação premiada constituírem
instrumentos jurídicos vitais para o sucesso da Operação Lava-Jato, a questão
da segunda instância também passou a fazer parte de debates em Cortes
superiores e no Congresso Nacional.
Com
a evolução desse entendimento, por parte de ministros do Supremo, surgiu a
possibilidade de haver reviravolta quanto à prisão a partir do julgamento na
segunda instância, o que poderia beneficiar diretamente o ex-presidente da
República petista, que foi condenado, por unanimidade, pelos três
desembargadores do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, confirmando e até
agravando sentença do juiz da Lava-Jato, com sede em Curitiba.
Como
o debate sobre a segunda instância ganhou nova dimensão, justamente pela prisão
do petista, a presidente do Supremo se antecipou para dizer que não colocaria o
assunto novamente em pauta de julgamento, tendo alegado as implicações do tema,
com os trabalhos da Lava-Jato e as evoluções de outras, além da aproximação das
eleições de outubro.
É
evidente que a importância política do petista, agora incurso na Lei da Ficha
Limpa, com grande possibilidade de se tornar inelegível, a depender da palavra
final do Justiça Eleitoral, fez crescerem as pressões sobre a dirigente do
Supremo para pôr a matéria em pauta, embora isso seja absolutamente inaceitável,
por haver entendimento segundo o qual isso poderá manchar a imagem do Supremo.
Alguns
ministros defendem que a prisão prevista para a segunda instância poderia
passar para o Superior Tribunal de Justiça, para possibilitar a ampliação do
direito de defesa e isso também não seria o caminho mais indicado, pelo menos agora,
por motivações éticas, que beneficiária situação específica, além de
privilegiar, em especial, políticos envolvidos em corrupção.
No
momento, qualquer forma de abordagem sobre o entendimento anterior, o Supremo
poderá ser interpretado como órgão que faz julgamento sob encomenda, sob
conveniência para beneficiar especificamente o ex-presidente, além de quebrar
as estruturas de eficiência e eficácia da Operação Lava-Jato, cujo estratagema também
serviria para livrar a cara de importantes criminosos de colarinho branco
implicados nos casos de corrupção objeto das investigações dessa operação, ficando
ainda caracterizada irresponsável operação de casuísmo destinada a contribuir,
de forma vergonhosa e desmoralizada, para o fortalecimento da corrupção e da
impunidade.
Antevendo possível desastre para a imagem da
Corte, a presidente
do Supremo já se antecipou aos fatos e pôs água fria na fervura, tendo declarado
que o tribunal iria se "apequenar"
se aproveitasse a pena aplicada ao ex-presidente para rediscutir a
possibilidade de prisão de condenados em segunda instância, tendo dito que “Não creio que um caso específico geraria uma
pauta diferente. Isso seria realmente apequenar o Supremo".
A
posição dela foi muito clara, ao afirmar que não tomará a iniciativa de pautar
ações que versem do tema, mesmo que não tenham relação direta com o caso do
petista, garantindo que "Não tem
previsão de pauta para isso. Não há pauta definida para um caso específico que
geraria uma situação".
O
entendimento atual e pacífico do Supremo permite a prisão de condenados em
segunda instância, como é o caso do petista, que pode ser preso logo após o
resultado de seu recurso sobre o último veredicto de Porto Alegre.
A
presidente do Supremo afirmou ainda que considera "pacificado" o entendimento do Supremo sobre a aplicação da Lei
da Ficha Limpa, que torna inelegível quem foi condenado por colegiado em
segunda instância, tranquilizando a sociedade, no sentido de que a eficácia da lei
é para todos, sem exceção.
Não há a
menor dúvida de que, no momento, qualquer iniciativa visando à modificação do
entendimento pacificado do Supremo, com relação à prisão na segunda instância,
seria cristalina contribuição à fragilidade do sistema Judiciário, por suscitar
enorme abalo não apenas à sua imagem, que atravessa momento de reconstrução,
mas também teria o condão de causar a indesejável insegurança jurídica.
É
bem possível que, além de apequenar a relevante missão institucional do
Supremo, o principal órgão do Poder Judiciário simplesmente contribuiria para a
sua desmoralização, uma vez que a mudança de entendimento de matéria de
fundamental importância, neste momento, poderia ser entendida pela sociedade,
que prima pela moralização do país, como o recriminável “jeitinho” brasileiro,
com a finalidade de amoldá-lo a situação específica.
Isso
seria o fim da pouca esperança de se passar este país a limpo, principalmente
tendo a liderança do citado poder, que precisa demonstrar fiel observância aos
princípios republicanos de dignidade, sinceridade, sensatez e acima de tudo de
amor à pátria, quanto à necessidade da consolidação dos entendimentos jurídicos
que possam contribuir para o vigoroso combate à corrupção e à impunidade, que certamente
seriam desprezados com a mudança, por conveniência, de posição jurisprudencial que
tem pleno apoio da sociedade trabalhadora e ansiosa pela urgente e definitiva
moralização das instituições da República.
Convém
que o Supremo Tribunal Federal se mantenha firme em defesa dos princípios
constitucionais da legalidade, do decoro, da moralidade, da dignidade, entre
outros que precisam ser mantidos vigentes, com a rigidez capaz de vicejar e nutrir
as esperanças dos brasileiros quanto ao rigoroso combate à corrupção e à
impunidade, de modo que seu exemplo possa ser modelo de competência e
eficiência para as demais instituições do Judiciário, sem pensar jamais em se
apequenar, diante das influências políticas e da fraqueza de magistrados que se
mostram, muitas vezes, arredios aos anseios da sociedade. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
Brasília, em 6 de fevereiro de 2018
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