sábado, 17 de fevereiro de 2018

O monumental descaso

A queda de viaduto numa área bastante movimentada de capital do Brasil poderia até ser fato surpreendente, mas não foi porque o que aconteceu seguiu o que se pode chamar de roteiro perfeito de tragédia anunciada.
É inacreditável que, mesmo tendo amplos conhecimentos sobre as precariedades das estruturas do viaduto, há muito tempo, esse episódio foi completamente ignorado, em que pesem os sete alertas de especialistas, começando em 2009, ou seja, contados 8 anos, nada foi adotado diante da urgente necessidade de consertos inadiáveis na estrutura do pavimento que, de podre, foi de encontro ao chão.
Nos idos de 2012, o Tribunal de Contas do Distrito Federal fez aleta sobre os riscos da estrutura precária do viaduto e solicitou as suas imediatas reparação e manutenção, mas o fato foi simplesmente ignorado, de forma reiterada, pelo governo do Distrito Federal.
Na ocasião, as precariedades apontadas consistiam em infiltrações, vibrações e rachaduras visíveis e comprometedoras das estruturas, mas os governos preferiram fechar os olhos para o desastre que, enfim, aconteceu, o que mostra o altíssimo grau de irresponsabilidade das autoridades distritais, que apenas alegaram falta de recursos e até mesmo a existência de outras prioridades, como se os consertos de estruturas prestes a cair não merecessem prioridade das prioridades.
          Agora, depois que aconteceu a enorme tragédia, fica a verdadeira lição de que governo não quis perceber o tamanho da gravidade da situação e apenas a tratou como se fossem meros problemas que jamais poderiam desabar, principalmente porque o viaduto já existia há quase sessenta anos e nunca reclamou, aos gritos, que precisava de manutenção, de socorro da engenharia.
Ainda bem que a tragédia foi minimizada por mero capricho do destino, por ter causado somente prejuízos materiais em quatro carros esmagados e estragos em um restaurante, que foi atingido pelo asfalto que cedeu, com as graças celestiais de não ter havido vítimas humanas fatais, porque, ao contrário disso, os irresponsáveis e omissos poderiam até estar se lamentando de não ter adotado as medidas saneadoras das questões levantadas pelo TCDF.
Os especialistas falam em verdadeiro milagre, considerando que dificilmente, no horário do desabamento, o local da tragédia estaria absolutamente sem ninguém, exatamente por ser ponto de movimentação de pessoas.
É inadmissível que a capital da República possa viver de sobressalto, na eterna dúvida quanto à segurança das estruturas dos viadutos e das pontes, que estão permanentemente sob suspeita de desabamento, diante do seu natural envelhecimento e da omissão sobre a premência das medidas referentes a conserto e manutenção.
É absolutamente impensável que ainda exista cidade alheia aos imprescindíveis projetos de reparação, manutenção e revitalização dos viadutos, das pontes e de outras edificações públicas, como que a procura de verdadeiro milagre, torcendo para que ele se opere de verdade e que seja realmente capaz de proteger a população, já que há visível demonstração de omissão, irresponsabilidade e negligência do poder público, que tem o dever constitucional e legal de zelar pela coisa pública, abrangendo viadutos, pontes etc.
Na opinião da Defesa Civil, é muito provável que outros desabamentos possam ocorrer, caso não sejam adotadas medidas emergenciais e capazes de socorrer, ainda no aproveitamento das estruturas originais, sob pena de ser preciso reconstruir os pavimentos, à medida que caírem, atentando-se que, além dos enormes prejuízos, têm os transtornos em razão das obras pertinentes.
A justificativa do governador sobre a tragédia foi mais do que ridícula, por ter alegado simplesmente que “Brasília é uma cidade feita de concreto e que está envelhecendo”, mas ele não assumiu a culpa por não ter adotado as medidas emergenciais e necessárias aos consertos e à manutenção dos viadutos e das pontes, que começam a cair fruto da omissão dele e de outros governadores, que fecharam os olhos para questão de extrema vitaliciedade das obras carentes de atenção, conforme os alertas seguidamente feitos por órgãos de controle e fiscalização, especializados, como o TCDF.
          Auditorias realizadas pelo referido tribunal constataram a precariedade de edificações públicas de Brasília, conforme relatório que mostra que 13 de 15 lugares visitados não dispunham de “nenhum plano de manutenção”, o que indica o descaso das autoridades pertinentes, que precisam ser penalizadas, em razão da sua completa omissão diante de problemas tão graves.
O que se observa, diante dos fatos, é a cruel e trágica constatação de que, conforme disse um especialista, com muita propriedade, esta pérola: “Na cidade dos monumentos, o descaso é monumental.”.
É preciso que os governantes sejam responsabilizados também pelos flagrantes descasos para com os monumentos públicos, que precisam ser cuidados e conservados, em respeito ao sacrifício dos contribuintes, que são obrigados a recolher o suor de seu trabalho em forma de tributos, mas os agentes da administração, com relação à manutenção de obras de arte, somente agem quando o estrago acontece e mostra os efeitos danosos causados por suas incompetência e precariedade, a exemplo da queda de parte de viaduto.
Veja-se que, no caso do desabamento de parte do viaduto em comento, o governador transferiu a sua responsabilidade, quase imediatamente, para o diretor do Departamento de Estradas e Rodagem, que foi exonerado do cargo, como a indicar que ele deveria ter adotado as medidas necessárias e capazes de ter evitado tamanho desastre no coração de Brasília, como se o mandatário do Distrito Federal não tivesse a principal culpa por tal monstruosidade,  ao deixar de priorizar a manutenção das obras de arte, como pontes, viadutos, edifícios e todo acervo que constitui o patrimônio da humanidade, em Brasília.
É evidente que também compete aos brasilienses parcela importante de culpa pela deterioração desses monumentos da capital do país, por elegerem governantes sem os indispensáveis atributos pertinentes à conservação do patrimônio da capital da República.
Convém que os brasilienses, a par de repudiar o cristalino desleixo demonstrado pelo governador, com relação à manutenção das obras públicas, erigidas com enorme sacrifício da sociedade, exijam dos candidatos ao Palácio do Buriti, sede do governador do Distrito Federal, a garantia da priorização sobre a conservação e a manutenção das pontes, dos viadutos, dos edifícios históricos da capital do país, que têm sido bastante desprezados pelos governantes, que estão muito mais interessados na realização de outros projetos político-administrativos que possam escancarar, como vitrine, as obras em seu benefício pessoal e partidário, como elementos de propaganda eleitoral, em detrimento da satisfação do bem comum e do interesse público. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES

Brasília, em 17 de fevereiro de 2018

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