De quatro em quatro anos, os brasileiros ficam ávidos por resultados
vindos dos campos de batalha onde são travadas as mais ferrenhas lutas em busca
do ouro, da prata e do bronze incrustadas nas medalhas tão cobiçadas, que
transformam pobres mortais em verdadeiros heróis nacionais, conforme mostra a
história dos jogos olímpicos.
O certo é que, via de regra, raríssima tem sido a exceção de medalhista
ser oriundo senão da periferia, de origem pobre e sacrificada pelas condições de
pobreza e logo vem, por trás do nome do vencedor, a palavra que o identifica para
sempre, dizendo que os pais são os mais humildes entre os pobres, mas ele teve
a tenacidade de se esforçar para colocar o nome do Brasil no pódio.
Os exemplos são variadíssimos sobre as proezas produzidas por pessoas
humildes, com histórico de superação, visto que todos os nossos atletas
medalhistas já aparecem com o clichê: ele é preto e filho de mãe lavadeira, pai
desempregado e outras afirmações próprias de identificação de pura pobreza.
Dificilmente o atleta vitorioso não tenha surgido da periferia, que
conseguiu não somente vencer medalhas, mas especialmente preconceito e humilhação,
antes do atingimento do pódio da glória olímpica, cuja bravura significa, sem
dúvida alguma, marco notavelmente revolucionário na vida dessas pessoas, que
também já trazem consigo, além das lágrimas pela vitória, o célebre discurso pronto,
de que essa medalha é oferecida ao povo pobre da região marginalizada e diz o nome
dela, de onde tenho orgulho, etc., etc. ...
Ressalte-se, por oportuno, alguns e poucos os esportes de rico, como
hipismo, iatismo e outros similares, para os quais as olimpíadas servem tão
somente para o desfile e a apresentação dos melhores e caríssimos cavalos e
iates etc., sem qualquer correlação com o brilhantismo das disputas atléticas propriamente
ditas, visto que esses são esportes de magnatas.
Ou seja, esses são esportes reservados para os chamados classes da cor
branca, os privilegiados dos jogos olímpicos, evidentemente sem qualquer intenção
voltada para a discriminação, mas apenas para se exemplificarem as classes dos
participantes das olimpíadas.
É bastante estranho que outras classes sociais, aquelas oriundas do seio
de empresários, banqueiros, da nata da sociedade brasileira, quase não conseguem
contribuir com a formação dos bravos atletas de raiz, dos verdadeiros atletas
que dão o sangue e a alma para lutarem, batalharem e até morrerem, se preciso
for, pelos ideais de medalhas olímpicas e de elevação do nome do Brasil.
Eles também teriam a oportunidade para dizer que são filhos de famílias
nobres, abastardas, que nasceram em berços esplêndidos e já contaram com o total
apoio dos pais e nunca precisaram se dedicar senão aos esportes como simples
exercício de amor a sim próprios e que o momento serve para a inspiração com
vistas ao glorioso sucesso empresarial, pelo que agradecem a oportunidade de
ser muito feliz.
Ou seja, à toda evidência, pelo menos no Brasil, os jogos olímpicos são
vistos como verdadeiras arenas propícias para a pobreza brasileira mostrar o
seu real valor de bravura, tendo a capacidade de transformar a sua patente
humildade social em conquista e fama, além de poder incentivar o resto da
pobreza a correr em busca de alguma oportunidade na vida, conforme mostram os
fatos históricos referentes aos esportes.
Na verdade, o que se pode perceber, sem muito esforço, é que existe
verdadeira disparidade nos investimentos de recursos públicos para o preparo
dos atletas olímpicos, em especial quanto àqueles oriundos das políticas
governamentais.
As ações pertinentes somente privilegiam determinadas regiões
brasileiras, em detrimento de outras, notadamente as dos Norte e Nordeste,
diante da visível ausência de atletas representando diretamente essas
importantes regiões, onde tem muitos “cabras machos”, no bom sentido, com visíveis
potencialidades atléticas que poderiam ser bastante aproveitadas para a conquista
de medalhas, além do oferecimento de oportunidades aos jovens daquelas regiões.
A concepção que se tem sobre olimpíada é a de que ela vem servindo para a
avaliação somente do potencial atlética de um povo e de determinadas regiões,
como expressão máxima esportiva, e não apenas instrumento de valorização de
terminada razão social, que praticamente vive sob condição marginalização,
conforme isso vem sendo enfatizado pelos ganhadores de medalhas, não se
vislumbrando outras oportunidades de ascensão social para todos os potenciais
atletas nacionais.
Em uma nação com um pouco ou o mínimo de conscientização esportiva e atlética,
que realmente valoriza as ações e as políticas esportivas como importante instrumento
de saúde pública e até de progresso do povo, certamente que haveria prioridade
para o incentivo, em forma de investimentos públicos, em atividades em nível nacional,
visando ao preparo de atletas de altas performances, com alcance no seio dos pobres,
de todas as raças, negras, brancas e outras, aproveitando a força de todos os brasileiros,
como normalmente fazem as nações que são grandes potências do mundo atlético-esportivo.
Na pratica, isso que vem acontecendo com as atuais políticas erráticas
nos esportes somente contribuem para o aprofundamento das desigualdades, da
exclusão e a marginalidade, impedindo as transformações sociais, enquanto a
universalização de medidas abrangentes, para o beneficio de todos os brasileiros,
haverá maior possibilidade da formação de melhores atletas e cidadãos,
evitando-se a gritante discrepância que existe na atualidade, em que somente
poucos são beneficiados e têm condições de ganhar medalha nas olimpíadas.
É preciso o encorajamento da vontade nacional, para a criação de projeto
do atleta do futuro, em que o seu cerne seja a universalização do preparo dos
brasileiros, evidentemente em todo o país, com vistas ao oferecimento de oportunidades
para a melhor formação atlética, em condições de conquistar medalhas, em quaisquer modalidades de jogos,
em igualdade com as principais potências mundiais do atletismo.
É lamentável que o país com a grandeza do Brasil ainda fique vibrando
com a conquista de minguadas medalhas, se orgulhando se ser visível “vira lata”
no esporte, ainda se satisfazendo com algumas medalhas, quando o seu potencial exige
a conquista de medalhas em igualdade de condições com as grandes nações
esportivas, que investem maciçamente no preparo de atletas de qualidade, que
buscam sempre a melhor performance possível, em todos os jogos.
Enfim, é dever primário do Brasil para com o seu povo, como a mais
sagrada obrigação do Estado, o oferecimento da melhor oportunidade aos
brasileiros carentes, pretos, brancos e outras raças, de forma isonômica, dos
investimentos capazes para a criação de importantes oportunidades perante as
disputas de medalhas, olímpicas ou não, porque isso é o mínimo que se almeja
para o pais com a grandeza do Brasil.
Brasília, em 4 de agosto de 2024
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