quinta-feira, 14 de agosto de 2014

O extremo da indecorosidade

O presidente do Senado Federal, a par de reconhecer o “recesso branco” na Câmara Alta, no mês de julho, admitiu placidamente que as votações no plenário serão rareadas durante o período da campanha eleitoral. Veja-se que nem mesmo a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2015 foi ainda aprovada, que deveria ter sido antes do recesso dos parlamentares, por força de disposição constitucional, o qual aconteceu mesmo assim, em caráter informal, em flagrante afronta ao primacial dever legislativo. O senador alagoano disse que o Congresso Nacional não pode ser levado para a zona cinzenta da demagogia nem ser obrigado a votar matéria para atender a determinados segmentos coorporativos. Nas palavras do mandatário do Senado, não é justo que os parlamentares sejam censurados, mesmo deixando de cumprir seu dever funcional, a exemplo da falta de aprovação da LDO, o que demonstra entendimento que suas excelências estão acima do bem e do mal, por deixarem de cumprir a Constituição do país e acharem isso normal. Apesar do completo afastamento dos parlamentares das suas funções legislativas, deixando de apreciar e aprovar matérias de interesse da sociedade, o comandante do Senado disse, como forma de justificar o injustificável, que haverá funcionamento das comissões e das sessões de discursos, ou seja, na prática, nada irá funcionar, porque não terá ordem do dia nem votações em plenário, a exemplo do que ocorreu durante a Copa do Mundo, entre 12 de junho e 13 de julho, em que o Parlamento permaneceu sob “zelosos” cuidados das moscas. Durante esse período, as comissões ficaram vazias e algumas sessões de debate no plenário nem chegaram a ser abertas devido à ausência de quórum mínimo, haja vista que, conforme comprovam esses fatos, os senhores parlamentares se julgam verdadeiros donos do patrimônio da sociedade, estando acima das leis e dos princípios de fidelidade aos deveres funcionais, obrigações essas que deveriam ser observadas com o máximo de rigor, mas, ao contrário disso, os parlamentares demonstram completa falta de compromisso com o cumprimento de suas funções e responsabilidades constitucionais de representar o povo com dignidade. Não há a menor dúvida de que, além do inadmissível descumprimento funcional e legislativo, os parlamentares comentem grave ilegalidade de continuarem percebendo, mesmo não comparecendo ao trabalho, suas remunerações recheadas das indecentes e injustificadas verbas pertinentes à representação de gabinete, aos mais diversos auxílios, ajudas, mordomias, regalias, bem assim aos demais benefícios, como se em atividade eles estivessem, constituindo verdadeira fraude à dignidade e à honestidade, em razão do recebimento integral de remuneração e de vantagens sem a indispensável contraprestação, contrariando os princípios do decoro e da dignidade. Essa esdrúxula situação se caracteriza ainda mais vergonhosa porque os parlamentares se afastam exatamente para cuidar de seus interesses, mais especificamente das suas reeleições, deixando em planos secundários as causas primaciais objeto de suas representatividades políticas, que deveriam ser rigorosamente cumpridas em respeito aos cidadãos, como forma de justificar o segundo maior custo mundial das Casas Legislativas, o qual é superado apenas pelo Parlamento norte-americano, cujos integrantes cumprem fielmente suas altíssimas funções legislativas de representar a sociedade. Conviria que os brasileiros tivessem um pouco de consciência sobre a imperiosa necessidade de os parlamentares compreenderem que eles não podem legislar em seu benefício, com aprovação de medidas visando ao seu empanzinamento com ilimitadas remunerações e as mais diversas verbas, ajudas, auxílios, regalias, mordomias e tantas benesses que envergonham o povo brasileiro, por serem injustificáveis e incompatíveis com suas atuações e produtividade em benefício do povo, ante as crônicas dificuldades, precariedades e carências de serviços públicos de qualidade. É chegado o momento de se exigir a urgente conscientização da sociedade sobre a necessidade da racionalização e dos limites a serem impostos aos todo-poderosos parlamentares e, de resto, aos demais políticos, que há muito tempo perderam o senso da responsabilidade quanto à real situação deficitária pela qual a sociedade foi condicionada, ante a indiferença demonstrada pela classe política dominante, que simplesmente decidiu privilegiar, de forma abusiva e indecorosa, interesses seus e de seus apaniguados, em completo e injustificável detrimento das causas da sociedade e do país. Acorda, Brasil!
 
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
Brasília, em 13 de agosto de 2014

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