Os líderes de partidos que integram o chamado
Centrão querem condicionar a aprovação do pacote anticrime apresentado pelo governo
à votação do projeto de lei que endurece a lei de abuso de autoridade, cujo texto
já foi aprovado no Senado Federal, mas emperrou na Câmara dos Deputados, diante
da pecha de antilava-Jato, por prevê punição a juízes e integrantes do
Ministério Público.
Alguns deputados querem aproveitar a crise gerada
pela Receita Federal, envolvendo um ministro do Supremo Tribunal Federal como pretexto
para votar o projeto de abuso de autoridade.
Como não poderia ser diferente, a articulação maquiavélica
tem o estímulo de ministros daquela corte e do Superior Tribunal de Justiça,
onde alguns integrantes ou até mesmo seus parentes estão entre os 134
contribuintes alvo de pente-fino da Receita Federal.
É evidente que o vazamento das informações sobre
eles provocou reação do Judiciário, tendo o apoio para a aprovação do referido
projeto, enquanto o Tribunal de Contas da União optou por realizar inspeção, de
forma cautelar, para se apurar os fatos.
O presidente da Câmara afirmou que o pacote anticrime
tramitará no mesmo ritmo do projeto de abuso de autoridade.
A Receita Federal afirmou que "os indícios originalmente apontados não se
confirmaram, razão pela qual os procedimentos de fiscalização não foram
instaurados".
O ministro do Supremo, citado pela Receita,
reforçou o coro sobre a necessidade de o Congresso Nacional votar o projeto de
abuso de autoridade, tendo afirmado que "Está evidente que (o vazamento) virou
um festival, um pandemônio".
O projeto sobre abuso de autoridade prevê mais de
30 ações que podem ser assim classificadas, com penas que variam de seis meses
a quatro anos de prisão, evidentemente tendo por objetivo restringir as investigações
sobre as autoridades da República, em especial os congressistas, que são os
maiores causadores de crimes contra a administração pública e interessados na
restrição das apurações, o que demonstra o grau de imoralidade que reina no
seio das autoridades, que, se nada tivessem a temer, aprovariam normas para o
endurecimento das investigações e para restringi-las..
Na prática, a votação conjunta das duas proposições
tem muito a ver com a reação contrária do Congresso a trechos do pacote anticrime,
em especial o que criminaliza o caixa 2 nas campanhas eleitorais, ou seja, não pega
bem o governo querer fechar o cerco aos maus políticos, os aproveitadores do
dinheiro público, porque eles sempre encontram o antídoto para escaparem do
controle.
A medida já foi apartada, a propósito, do projeto
principal justamente para evitar danos à parte do pacote que trata da segurança
pública e do combate ao crime organizado.
Em forma estratégica, há a tentativa do governo de se
obter apoio dos congressistas, de modo que o próprio ministro da Justiça tem
adotado discurso mais brando com relação ao caixa 2, para se evitar atingir
diretamente os políticos desavergonhados, fazem tudo para se beneficiarem de verbas
públicas.
A preocupação do presidente da Câmara é evitar que
esse debate contamine a votação da reforma da Previdência, porque a pauta econômica
é prioridade tanto do governo como do presidente da Câmara.
Não há a menor dúvida de que o projeto de abuso de
autoridade tem por objetivo a proteção das falcatruas de malfeitores e
delinquentes, que não gostam de ser investigados, diante do fato de que eles,
como a elite dominante, acreditam que estão acima da lei e, por isso, não podem
ser investigados, contrariando justamente o velho adágio de que “quem não deve,
não teme”, mas essa classe sinaliza, sem disfarce, que tem muito a temer.
Não poderia ser diferente que os criminosos de colarinho
branco vão sempre espernear contra qualquer norma jurídica que venha de
encontro com os interesses deles, procurando, por todos os meios, evitar a
adoção de medidas que possam dificultar a sua livre ação nada republicana.
À toda evidência, o projeto de abuso de autoridade,
se depender da vontade política, poderá ter maior prioridade de tramitação do
que qualquer outra matéria, justamente porque o seu principal objetivo é
possibilitar punir os servidores que têm a incumbência de investigar os
maus-feitos de autoridades da República, que se sentem intocáveis e inimputáveis penais,
em reafirmação de que o Brasil nunca passará de verdadeira republiqueta, em
termos de combate ao crime organizado, notadamente à corrupção, e à impunidade,
onde simplesmente se confirma a plena inversão da ordem moral e jurídica, com
destaque para a facilitação e a banalização do desvio de verbas públicas.
Brasil: apenas o ame!
Brasília, em 2 de abril de 2019
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