domingo, 2 de fevereiro de 2014

Repúdio à banalização da indignidade

Quase que num piscar de olhos, foram arrecadados, a título de doação, mais de R$ 1 milhão, representando mais do dobro do valor que o ex-tesoureiro do PT precisava para quitar a multa que lhe foi aplicada pelo Supremo Tribunal Federal. Somente num dia, foram amealhados quase R$ 600 mil, superando o valor necessário de R$ 466,8 mil. Conforme o entendimento entre os petistas, o valor excedente deverá ser doado ao próximo condenado com multa, numa espécie de solidariedade entre os mensaleiros. É bem provável que o próximo a criar site para essa finalidade seja o ex-ministro da Casa Civil da Presidência da República, cuja página para receber doações já está pronta e será acionada no momento da notificação oficial dele. Não há a menor dúvida de que constitui enorme surpresa o sucesso da arrecadação do ex-tesoureiro do PT, não para os correligionários dele, que tinham a convicção de que a campanha seria de pleno êxito, em virtude de haver impagável dívida de gratidão para com ele, em especial por parte de petistas com cargos eletivos, notadamente no Congresso Nacional, porquanto o então tesoureiro do PT soube entender as dificuldades dos filiados do partido, que sempre se colocava à disposição para resolver os problemas dos parlamentares, principalmente nas disputas eleitorais. No entanto, há maior preito de gratidão ao então tesoureiro, por ele ter se mantido em completo silêncio, com relação às minúcias sobre o imbróglio do mensalão, fato que ensejou imediatos reconhecimento e admiração da cúpula do partido e dos fiéis militantes petistas, que demonstraram o máximo de lealdade a quem se manteve como rocha indestrutível a fidelidade aos correligionários, não revelando a sujeira da quadrilha, mesmo por que ele é um dos principais integrantes dela. É natural que a recompensa como em forma de chuva de tanto dinheiro, que não sabe de onde surgiu tanta generosidade. Conviria, em atenção ao princípio democrático da transparência, que fosse revelada à sociedade a verdadeira origem de tanto dinheiro, destinado à causa nem tanto relevante, à vista dos fatos vergonhosos que ensejam a aplicação da penalidade ao principal agente e pivô do escandaloso mensalão. A estrondosa arrecadação para o pagamento das multas aplicadas aos mensaleiros demonstra, nada mais nada menos, a vocação deletéria de quem não reconhece os malefícios causados aos princípios da moralidade e da ética com as práticas de corrupção e de irregularidades envolvendo recursos públicos. Com absoluta certeza, essa forma de recompensar as "ajudas" do passado e do silêncio em nome da camaradagem não se coaduna com o princípio de licitude democrática, por evidenciar o jeitinho brasileiro de jogar a sujeira para debaixo do tapete, como forma de perpetuação da desmoralização das instituições e da descaracterização dos preceitos de moralidade e de decoro das atividades político-partidárias. Enquanto se valoriza a preservação da imoralidade, os pilares da democracia são cada vez mais corroídos e deteriorados com essa cristalina forma de apoio ao criminoso que contribuiu com efetividade para a construção política de homens públicos destituídos de princípios morais, por terem sido ajudados nas suas campanhas eleitorais. O povo brasileiro tem que se conscientizar, com urgência, sobre a verdadeira função dos partidos políticos, que jamais deveriam dar acolhida às práticas contrárias aos salutares procedimentos reconhecidamente morais, legais, decorosos, probos e honestos, principalmente em se tratando do envolvimento de recursos públicos, que não deveriam ser despendidos senão com atividades legítimas e em atendimentos aos fins públicos. Em princípio, a lei não impede que o apenado faça campanha para ser socorrido financeiramente para quitar sua dívida com os órgãos públicos, em decorrência de punição por crime cometido, mas, em se tratando que a penalidade tem a finalidade de punir pecuniariamente o bolso do criminoso, não parece ser justo que a dívida seja transferida para outrem, mesmo por sentimento de piedade ou solidariedade com os atos delituosos. Como forma de se exigir que o apenado cumpra o ônus da sua dívida, conviria que houvesse coibição legal para impedir a realização de campanhas com o objetivo de pagar valor referente à multa, por meio de mecanismos de mobilização em cumplicidade às organizações criminosas e aos bandidos que tenham fraudado o patrimônio público, a exemplo do famigerado caso do mensalão. Ao contrário do que se imagina, o apoio aos bandidos condenados à prisão pelo Supremo Tribunal Federal, somente contribui para empobrecer e apequenar ainda mais as instituições democráticas e tanger para bem distante as pretensões de o país se aproximar das nações evoluídas e desenvolvidas, que têm como norte o culto aferrado aos princípios de retidão política, da moralidade cívica, da consciência de nacionalidade e de intransigente condenação às práticas de defesa dos interesses pessoais e partidários. A sociedade tem o dever cívico de se despertar para a real necessidade de defender a conquista e a manutenção dos princípios construtivos da ética, da moralização e do decoro, como forma de viabilizar o aperfeiçoamento dos preceitos saudáveis da democracia. Acorda, Brasil!    
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
 
Brasília, em 1º de fevereiro de 2014

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