sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

Maioria formada sob medida?

O Supremo  Tribunal Federal, ao julgar recursos intitulados "embargos infringentes", decidiu, por maioria simples, absolver do crime de formação de quadrilha mensaleiros que já se encontram presos no Sistema Penitenciário da Papuda, cumprindo outras condenações. Os seis ministros que votaram pela absolvição entenderam que não ficou configurada a quadrilha, porquanto, segundo a sua interpretação, apesar de os petistas terem cometido crimes conjuntamente, não formaram associação criminosa com o objetivo específico de cometer crimes. Por sua vez, os outros ministros defenderam que existiu a formação de quadrilha para desviar recursos públicos e fraudar empréstimos com a finalidade de pagar propina a parlamentares que apoiavam o governo federal nos seus primeiros anos de gestão. As justificativas dos dois novos ministros, para absolver os petistas, são visivelmente absurdas e ridículas. Eles disseram que as penas fixadas para o delito ficaram muito elevadas e, caso elas fossem diminuídas para o patamar correto, estariam prescritas e os acusados não poderiam mais ser punidos por este crime. Um ministro disse que “A pena-base foi estabelecida com notória exacerbação". Nesse caso, eles resolveram aceitar os recursos dos réus e livrá-los da acusação. Os demais ministros que votaram pela absolvição não apresentaram argumentação ao plenário. O presidente do Supremo afirmou declarou: “Sinto-me autorizado a alertar a nação brasileira de que esse é apenas o primeiro passo. É uma maioria de circunstância que tem todo tempo a seu favor para continuar sua sanha reformadora". Um ministro disse: "Os autos revelam que houve, sim, uma realidade autônoma, realidade própria fruto dessa espúria aliança". Outro ministro disse que, quando condenou o grupo por formação de quadrilha, se baseou em provas e elementos concretos apresentados pelo Ministério Público: "Nosso pronunciamento se fez a partir da prova. E da prova a meu ver contundente quanto à existência, não de uma simples coautoria, mas quanto à existência do crime de quadrilha”. O decano da corte chamou os réus de "meros e ordinários criminosos comuns" e classificou de "leniência" a decisão de absolvê-los. Ele disse que "Tal organização visceralmente criminosa em seu aparato funcional não pode ser lenientemente qualificada por expressão menor de simples concurso de delinquentes. Tem que se designada como quadrilha composta por pessoas comprometidas ao longo de extenso período de tempo com práticas criminosas, que merecem a repulsa do ordenamento jurídico". No caso dessa não surpreendente decisão do Supremo não se pode dizer que o Poder Judiciário ficou mais pobre, porque a absolvição do crime de quadrilha, absolutamente tipificada nos autos do mensalão, deixa enorme dúvida no ar quanto à real interpretação sobre os fatos protagonizados pelos mensaleiros, porquanto, há pouco mais de um ano, eles foram condenados pelo crime de formação de quadrilha, mas, agora, sem que nada tivesse sido demonstrado em contrário, o mesmo tribunal os inocenta. No próximo julgamento do processo do mensalão, que não deve tardar muito, pois deverá ser arranjado, motivado por uma das muitas brechas jurídicas, a nova composição do Supremo, já depurada com a aposentação dos ministros contrários à tese da absolvição, vão responsabilizar a atuação dos magistrados que entenderam pela existência do mensalão e pela condenação dos envolvidos, como forma de perdoá-los e possibilitar suntuosas e milionárias indenizações. Os fatos demonstram, com claridade solar, que o veredicto do Supremo Tribunal Federal, consubstanciado no acórdão que condenou os réus do mensalão, foi adotado com base em provas substanciais. Não existe nada em contrário que fundamente essa absurda absolvição, justamente pela constatação do desvio de recursos públicos e pela sua aplicação irregular, que somente os petistas e seus simpatizantes, os mais “éticos” do país, insistem que sequer o mensalão existiu, contrariando os fatos detalhados pelo Supremo. A sociedade tem enorme dificuldade para compreender como plêiade de magistrados de altíssima qualificação entende que houve crime de quadrilha e outros ministros igualmente capacitados dizem exatamente o contrário. Então, quem, a final, está dizendo a verdade ou quem mente para a sociedade leiga, que se baseia nas robustas provas constantes dos autos, plasmadas por investigações, testemunhas, perícias técnico-especializadas, demonstrativos, relatórios e outros tantos depoimentos e elementos legalmente válidos para se afirmar que houve o crime de quadrilha mais do que qualificados materialmente? A maior gravidade resultante dessa decisão é que a Excelsa Corte de Justiça, além de ser a verdadeira guardiã da Constituição Federal, que tem a incumbência de se manifestar, em última instância, sobre constitucionalidade ou não das normas legais, ainda tem a enorme responsabilidade de disseminar para o Poder Judiciário saudáveis exemplos sobre a correção e a legitimidade dos seus procedimentos. Não à toa, a inusitada absolvição dos mensaleiros pelo crime de formação de quadrilha prejudica sobremodo a preservação do elevado conceito que se deveria atribuir à Supremo Corte, que foi reforçada pela irritada crítica do seu ilustre presidente ao último veredicto, por discordar dele com fortes e pouco usuais insinuações de que "Temos uma maioria formada sob medida para lançar por terra o trabalho primoroso levado a cabo por esta Corte no segundo semestre de 2012. Isso que acabamos de assistir. Isso que acabamos de assistir. Inventou-se um recurso regimental totalmente à margem da lei com o objetivo específico de anular a reduzir a nada um trabalho que fora feito. Sinto-me autorizado a alertar a nação brasileira de que esse é apenas o primeiro passo.".  Esse parece ser o fiel retrato da realidade do Supremo Tribunal Federal, onde o resultado do julgamento em apreço não reflete exatamente a realidade sobre os fatos constantes dos autos, que foi derivado dos pensamentos ajustados às conveniências e aos interesses, no dizer do presidente da Corte, quando deveria se ater aos elementos constantes dos autos, em harmonia com o último julgamento, que condiz com o sentimento da expressiva maioria da sociedade, que tem pensamento mais aproximado dos fatos apurados e relatados de forma minuciosa pelo próprio Tribunal, cuja composição diverge parcialmente, em benefício da dúvida, da incerteza, da impunidade e da injustiça, que jamais deveriam se originar de quem se espera firmeza, coerência e a melhor interpretação sobre os mesmos fatos, quanto mais quando eles já tinham sido julgados cujo veredicto foi infirmado, sob a justificativa que a mídia denomina de aparelhamento do Estado e que o presidente do Supremo definiu como “... maioria formada sob medida...”. A tristeza é generalizada por parte das pessoas honradas e conscientes sobre os fatos lamentáveis apurados sobre o maior escândalo republicano, diante de explicável, porém inaceitável, desfecho de julgamento marcado por reviravoltas sem a menor surpresa, mas em evidente prejuízo aos princípios da dignidade, moralidade e honorabilidade. Acorda, Brasil!
 
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
 
Brasília, em 27 de fevereiro de 2014

Nenhum comentário:

Postar um comentário