sábado, 10 de setembro de 2011

O passado condena

O publicitário apontado como operador do esquema do mensalão apresentou sua defesa ao Supremo Tribunal Federal, no processo que apurou os fatos relacionados com o pagamento de propina aos parlamentares em troca de apoio ao governo no Congresso Nacional. Ao ensejo, ele registrou estranheza pelo fato de que o então presidente da República não ter sido incluído na lista das pessoas envolvidas no esquema em tela. No documento, ele se declara inocente, porém afirma que a denúncia é "raríssimo caso de versão acusatória de crime em que o operador do intermediário aparece como a pessoa mais importante da narrativa, ficando mandantes e beneficiários em segundo plano, alguns, inclusive, de fora da imputação, embora mencionados na narrativa, como o próprio presidente LULA.". O advogado do operador disse que a participação do seu cliente foi "exagerada" e teve por intuito deslocar o foco dos verdadeiros "protagonistas políticos", entre eles o ex-presidente, nestes termos: "A classe política (...) habilidosamente deslocou o foco das investigações dos protagonistas políticos (LULA, seus ministros, dirigentes do PT etc.) para o empresário mineiro Marcos Valério, do ramo de publicidade e propaganda, absoluto desconhecido até então, dando-lhe uma dimensão que não tinha e não teve nos fatos objeto desta ação penal.". A acusação que agora vem à lume com maior ênfase não chega a ser nenhuma novidade, porquanto era normal a oposição apontar o mandatário da nação como principal integrante da quadrilha do mensalão. A importante surpresa surge, agora, com a coragem de um dos mais influentes acusados de dizer, em outras palavras, que o então presidente deveria também ser réu no processo pertinente. No momento das denúncias, talvez por temer severas represálias, ninguém teve o atrevimento de enfrentar a realidade dos fatos, para acusar o todo poderoso e incluí-lo no rol dos envolvidos. Hoje, certamente contando com clima mais favorável à revelação da verdade, seria benéfica para os esclarecimentos dos fatos a delação premiada para o publicitário, de modo que ele pudesse colaborar com as investigações finais, confessando, comprovadamente, tudo o que sabe sobre a responsabilidade que cada integrante do governo tinha com a operacionalização do desvio questionado. Não deixa de ser vexatório e vergonhoso para um ex-presidente da República ser acusado de envolvimento com malversação de dinheiros públicos, mas, mesmo que não haja nada de concreto sobre a sua participação no maior escândalo da República, a acusação é muito expressiva e mostra que a dignidade do seu governo não passou incólume, tendo suas bases maculadas por desvio de dinheiros públicos, pondo sob suspeita a legitimidade da gestão de quem se julgava acima do bem e do mal. Em termos de avaliação do desempenho, é muito importante o grau de participação dos políticos nesse terrível terremoto que abalou os alicerces da moralidade e da honradez que se exigem dos homens públicos, porque a sua ocorrência somente contribuiu para o atraso da democracia e do desenvolvimento do país. Diferentemente disso, um governo probo, que tenha conseguido executar somente atos de retidão e de regularidade na sua gestão, será sempre lembrado como exemplo de lisura e de boas ações em prol dos interesses públicos, não sendo motivo de recriminação ou de acusação, por qualquer motivo. Agora, mesmo com a aplicação da imponderabilidade do benefício da dúvida, compete à sociedade, de forma preventiva, avaliar os fatos políticos e administrativos dos dirigentes do país, com vistas a negar ou não apoio aos intentos daqueles que tiveram suas fichas manchadas por ação ou omissão, quanto à boa e regular aplicação dos recursos públicos. Acorda, Brasil!

ANTONIO ADALMIR FERNANDES

Brasília, em 08 de setembro de 2011

Nenhum comentário:

Postar um comentário