Em
videoconferência, os governadores da região Sudeste se reuniram com o
presidente da República, tendo por objetivo tratar de questões relacionadas com
a gravíssima crise causada pelo poderoso coronavírus.
Não
obstante, o que seria evento para se buscar subsídios com vistas ao afinamento
dos ajustes de ideias e enfrentamento da aludida questão acabou mesmo foi
servindo de verdadeiro campo de batalha política, onde cada governador teve espaço
para formular contundentes acusações ao desempenho do presidente do país.
O
governador de São Paulo disse que, ao invés do “(...) respeito ao Brasil e
aos brasileiros, e em respeito ao diálogo e ao entendimento. Mas o senhor que é
o presidente da República tem que dar o exemplo, e tem que ser o mandatário a
dirigir, a comandar e liderar o país e não para dividir".
A
irritação do presidente foi exposta de imediato, tendo respondido ao tucano com
palavras duras, inclusive chamando-o de "demagogo" e "leviano".
O
presidente também foi criticado pelo governador do Espírito Santo, por ele ter,
segundo ele, incentivado as pessoas a saírem de suas casas, nestes termos: "Temos
seguido a OMS (Organização Mundial de Saúde) e na hora que o presidente opina e
tira o valor da pandemia, causa uma confusão e uma dúvida nas pessoas, podendo
atrapalhar o trabalho dificultando nossa ação. A dúvida e incerteza é a porta
do fracasso (sic)".
Ou
seja, o resultado da referida conferência não serviu senão à lavagem de roupa
suja e perda de tempo, diante das posições políticas antagônicas e da pouquíssima
boa vontade para realmente se tratar de importante assunto de interesse da
população, mas ela teve a serventia para a uniforme, firme e clara acusação dos
governadores no sentido de que o chefe do Executivo federal vem agindo contra
os esforços de contenção do novo coronavírus.
Já
em outro contexto tratando do mesmo tema, o governador de Goiás disse que "(Quero)
que a população saiba que as decisões do presidente no que diz respeito à
saúde e coronavírus não alcançam o estado de Goiás. As decisões de Goiás serão
tomadas por mim, pela Organização Mundial de Saúde e pelos técnicos do Ministério
da Saúde. Não tomamos nenhuma medida que não fosse muito discutida com a
comunidade científica, pesquisadores, médicos e profissionais da saúde".
O
governador de Santa Catarina se disse "estarrecido" com a abordagem
defendida pelo presidente, tendo declarado, verbis: "Venho a
público informar à população de Santa Catarina que nesta quarta-feira, 25 de
março, iniciamos mais uma quarentena de sete dias por determinação de decreto
deste governador, mais sete dias para ficar em casa (...). É o local mais
seguro".
O
governador do Pará disse que "Estamos fazendo a nossa parte aqui. Nós
não vamos nos apegar ao calendário de quem quer que seja, muito menos pedir
autorização a quem quer que seja para cumprir com a nossa obrigação que é
defender a população paraense".
Os
governadores dos Estados da região Nordeste também divulgaram nota conjunta,
com críticas às ações recentes do presidente, alegando seu sentimento de frustração
diante das posições agressivas dele, sob o argumento de que ele deveria "exercer
o seu papel de liderança e coalizão em nome do Brasil".
Há
toda clareza de que o Brasil se encontra mergulhado em pleno regime de guerra,
onde a existência do Estado, como nação, precisa ter predominância, no sentido
da busca da convergência de decisões que tenham por desiderato a imediata solução
das causas colocadas sobre a mesa de trabalho das autoridades envolvidas, com
embargo da prevalência da autoridade de nenhuma unidade pública, como forma
mais inteligente possível para se alcançar a otimização das medidas indispensáveis
à solução dos problemas.
Não
há a menor dúvida de que, em situação como a do coronavírus, é natural que
tenha variada sobreposição de regimes, competências, autonomias que precisam de
urgente unificação das decisões para a disposição sobre as políticas em geral a
serem aplicadas, além daquele especificamente sobre a saúde pública, exatamente
porque se trata de regime de guerra, cujas decisões demoradas podem ter consequência
perdas de vidas.
Convém
que o presidente da República, líder supremo, governadores e prefeitos se deem
as mãos, pondo de lado os objetivos político-partidários, para que, nesse momento
crucial, todos os esforços sejam devotados à causa maior do combate ao
coronavirús e, para tanto, é preciso que essa questão das competências sejam resolvidas
por meio do convencimento de que o bom senso, a racionalidade e a compreensão
devam estar presentes em todos os casos, de maneira que as decisões estejam em
estreita sintonia com as melhores políticas a serem adotadas, como no caso do
isolamento seletivo, que somente deve ser pensado depois do entendimento geral
de que ele é realmente plausível e benéfico para o país e a sociedade, de modo a
se evitar ou se minimizar o caos socioeconômico.
Nesse
sentido, seria preciso que houvesse comissão conjunta, constituída por
integrantes de alto nível de representatividade da União, dos Estados e dos municípios,
além da participação da sociedade civil organizada, para que as decisões
tivessem por finalidade o ajustamento necessário à imediata solução dos graves problemas,
com o que se evitaria essa gigantesca confusão que ficou transparente com a
briga entre o presidente do país e os governadores, onde sobressai a cristalina
ideia de que estes divergem do mandatário do país e têm direito de decidir
unilateralmente sobre o seu estado, à vista das declarações firmadas por muitos
deles, ficando muito evidente a dissonância de opiniões sobre o mesmo tema, que
precisa ser conduzido com o máximo de boa vontade e compreensão.
Sobre
isso, não há ignorar que a Constituição Federal estabelece que essas políticas
sejam hierarquizadas, mas não exclui a competência de governadores e prefeitos
quando ela é do presidente, por se tratar de princípio aplicável em situação de
normalidade, o que é bem diferente em situação de verdadeiro comparável ao estado
de guerra, onde o bom senso, a razoabilidade e civilidade aconselham que é
muito benéfico para a população que imperem medidas nascidas da convergência de
entendimentos que precisam funcionar imediatamente para a satisfação do
interesse público e do bem comum.
Não
tem o menor cabimento que, em momento de muita dificuldade e preocupação com os
possíveis contágios do poderoso coronavirus, políticos inescrupulosos pretendam
impor posicionamentos em defesa de seus planos políticos, como se o cenário
atual pudesse ser utilizado como verdadeiro palanque eleitoral, o que se
compreenderia que isso funcionaria em detrimento das causas envolvendo a salvação
de vidas humanas, em primeiro plano, porque em segundo vem a questão econômica,
que também é fundamental, mas a sua salvação não tem a mesma prioridade a ser
dada à vida.
A
questão que se debate e se discute com o máximo de prioridade diz respeito à
controvérsia sobre a real necessidade do isolamento obsequioso imposto à população
brasileira, de maneira generalizada, sob a alegação de se tratar de medida
preventiva contra o contágio em potencial do coronavírus, segundo o entendimento
recomendado pelos organismos internacionais de saúde, o que se evitaria o estrangulamento
da rede pública de saúde, a despeito da já conhecida precariedade de recursos para
atendimento à população, até mesmo em situação normal, sem a pandemia que se
anuncia como sendo inevitável, em forma de calamidade.
Diante
disso, o presidente da República tem posição cristalina no sentido de a aludida
medida ser desnecessária, evidentemente apenas como supedâneo em entendimento
pessoal e verbal, contando apenas com a força do seu poder presidencial, sem
ter apresentado nada que pudesse justificar a sua posição, para servir de suporte
científico aceitável pelas autoridades que defendem o contrário, a despeito de
que, na prática, o famigerado coronavírus não se trata de apenas “gripezinha”, diante
da notória evidência de mais de 16 mil mortes causadas por ele, em todo o
mundo, sendo que, só no Brasil, as mortes se aproximam de 100 e mesmo que fosse
apenas uma, tudo isso já seria muitíssimo
motivo de preocupação.
Agora,
à luz da ciência, é imperioso que se comprove que o isolamento social pleno é a
única maneira capaz de se evitar catástrofe no âmbito da população, mas, para
tanto, é preciso que se apresente elementos, como resultado de estudos ou
experiências, produzido por organismo fidedigno de saúde internacional, que
satisfaçam absolutamente as mesmas características, os mesmos climas, as mesmas
peculiaridades, enfim, as mesmas situações próprias existentes no Brasil, para
que se tenha reais condições de avalição segura sobre a certeza de que vale a
pena o gigantesco sacrifício da população pelo isolamento compulsório.
Por
seu turno, o mesmo argumento, em forma de comprovação substancial, tem validade
para as pretensões do presidente do país, que se manifestou favorável somente
ao confinamento seletivo, em que os idosos e os grupos de risco sejam submetidos
ao isolamento obrigatório, permitindo que as demais pessoas tenham atividades
normais, submetidas, evidentemente, às cautelas que se impõem contra o contágio
com o abominável coronavírus.
Ou
seja, as medidas adotadas ou cogitadas, em princípio, carecem de estudos
apropriados, diante da falta de elementos seguros, confiáveis e apropriados, com
comprovada capacidade para se garantir que um ou outro método seja eficaz ou
não, exatamente porque a população está endo levada no grito, com base em provável
experiência que nem pode servir para o Brasil, cuja população aceita ser cobaia
de algo incerto, inseguro e até sem sentido, diante das circunstâncias.
À
toda evidência, é aconselhável, por ser necessário, diante de peculiaridades
diferentes de outros países, a construção de protocolo próprio e específico
brasileiro, para a criação de metodologias científicas de eficiente e confiável
combate ao coronavirus, apenas fazendo uso de outros enquanto não seja possível
ter o próprio manual aplicável às suas necessidades.
Tem-se
plena validade científica se acreditar e se basear piamente nas palavras de cientistas
de outros mundos, sem a devida experiência brasileira, seguindo cegamente o que
eles dizem e mandam, com o beneplácito da tão competente Organização Mundial de
Saúde, porque muitas conclusões sobre experiências e experimentos ocorreram certamente
em outros países, em regiões diferentes da nossa, com características estranhas
à situação do Brasil?
Convém ainda
se compreender que não tem solução fácil para o Brasil, à vista das
dificuldades existentes na cambaleada economia, que seria necessária, se ela
fosse forte, para a manutenção de empregos, durante o isolamento geral, que
ainda tem, nesse contexto, a falta da cultura para se garantir a quarentena por
longo tempo.
Concluo
no sentido de que o presidente da República poderia constituir comissão de alto
nível, composta com autoridades e conhecedores das áreas envolvidas, como saúde,
economia, transporte, escolas, comércio, indústria etc., evidentemente com a participação
de pessoal da União, dos Estados, dos municípios (Executivo, Legislativo e
Judiciário) e da sociedade civil, para estudarem, com a maior urgência possível,
as hipóteses em que se poderia ser implantado, com absoluta segurança e certeza,
o isolamento seletivo da população, observado o devido rigor com relação aos
idosos e as pessoas consideradas em situação de risco, como forma de se
possibilitar que o país possa voltar o mais brevemente à normalidade, desde que
esse trabalho conclua nesse sentido, diante das evidências tranquilizadoras
sobre a proteção de vidas humanas.
Brasília,
em 26 de março de 2020
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