A
Câmara de Vereadores de Uiraúna, Paraíba, decidiu, em Sessão Extraordinária,
negar o pedido de renovação da licença do cargo ao prefeito dessa cidade, que
se encontra preso em João Pessoa, capital do Estado, por seu envolvimento na Operação
Pés de Barro, da Polícia Federal.
O
prefeito vinha do gozo de licença do cargo, por 60 dias, devidamente concedida,
por unanimidade, inclusive com os votos da oposição, que agora houve por bem dizer
não à continuidade do afastamento legal daquela autoridade, em contrariedade aos
quatro votos dos vereadores da situação.
Como
o prefeito vinha de licença autorizada legalmente, a negação em tela implica
que ele tem, na forma prevista na Lei Orgânica do Município de Uiraúna, 15 dias
para a reassunção do cargo, evidentemente sob pena de perda do mandato, segundo
o entendimento preliminar sob o caso.
À
primeira vista, causa estranheza a mudança de entendimento da colenda Câmara de
Vereadores, ao adotar, agora, decisão que poderia ter sido firmada já com relação
ao primeiro pedido, considerando, se assim era a sua vontade, eis que, de lá
para cá, ao que se tem conhecimento, não aconteceu, em absoluto, nada de
novidade a ensejar tão brusca mudança de posição, a justificar medida, por
certo, draconiana, atento ao fato de que não depende da vontade do prefeito a
iniciativa se tomar posse ou não, eis que ele se encontra preso por força de r.
decisão judicial, que o impede de exercer as funções normais do seu cargo.
Ou
seja, a princípio, com as devidas vênias, não parece justa e muito menos racional
a decisão que se obriga o fazimento de algo sabidamente impossível, diante da inviabilidade
do resultado cogitado, quando medida de compreensão pode perfeitamente ser
adotada, em atendimento aos interesses da elevação das relações sociais e políticas.
É
evidente que não se sabe as reais motivações para que essa decisão viesse a ser
confirmada, diante das virulentas consequências jurídicas que ela pode suscitar,
inclusive com a implicação da perda do mandato, que até poderia acontecer
normalmente, em razão do lastimável ocorrido, que consiste no possível desvio
de recursos públicos sob a gestão do prefeito, que, à toda evidência, não reúne
mais a mínima condição de confiabilidade para gerir recursos públicos, à vista das
evidência e materialização da prática de atos irregulares, em verdadeira
afronta aos princípios da administração pública.
Nesse
sentido, conviria que partes interessadas demandassem ação apropriada na Justiça
competente, alegando os fatos ocorridos, que são amplamente do conhecimento da
sociedade, com a devida demonstração de que o prefeito, embora ainda não condenado
pela Justiça, em razão do ato irregular cuja autoria lhe é atribuída, não merece
mais a confiança da sociedade uiraunense para retomar às importantes atribuições
de prefeito de Uiraúna e isso, por razões óbvias, o próprio denunciado deve ter
absoluta consciência, ante o seu elevado nível de experiência na vida pública.
A
população dessa cidade esperava que o prefeito tivesse aproveitado todo esse
tempo, enquanto se encontrava na prisão, para apresentar elementos plausíveis
em demonstração cabal da sua inocência, em atendimento à perplexidade da população,
diante do lamentável acontecimento.
Havia
sim esperança de que o político já tivesse mostrado não somente à Justiça, mas também à população a sua inocência
sobre os fatos denunciados pela Polícia Federal contra ele, mediante a apresentação
dos elementos e das contraprovas juridicamente válidos, em contestação às provas
que serviram de base com consistência e robusteza suficientes para o Supremo
Tribunal Federal determinar a sua prisão, que vem sendo cumprida, normalmente,
na forma do ordenamento jurídico de regência.
Nas circunstâncias, não
se pode negar que a relocação do acusado no exercício do cargo de prefeito de
Uiraúna haverá, por certo, geração de forte instabilidade institucional, diante
dos fatos nefastos à gestão pública, ainda não esclarecidos, que são, à toda evidência,
extremamente prejudiciais ao regular funcionamento da coisa pública e à normalidade
da democracia, que tem como princípio a sua harmonização com as salutares práticas
de atos revestidos de regularidade e imunes a questionamentos.
Estranha-se que, no caso
sob exame, por enquanto, não há a mínima justificativa para os lamentáveis e sinistros
acontecimentos, dando a entender que a sociedade, que, em última análise, se
tornou vítima desse imbróglio, não merece qualquer forma de esclarecimento, o
que é de se lamentar, em se tratando de gestão de recursos dos cidadãos.
Na
verdade, a situação jurídica envolvendo o caso do prefeito não é tão fácil como
se poderia imaginar, diante da ausência de legislação precisa disciplinando os procedimentos
sobre os fatos pertinentes, a começar da norma sobre a responsabilidade dos
prefeitos, no caso, o Decreto-lei n* 201/67, editado nos idos do regime
militar, que sequer se refere à licença do prefeito do cargo, em caso de prisão
determinada pela Justiça, o que ajudaria a compreender se isso seria motivo
legal ou não para amparar a decisão da Câmara de Vereadores de Uiraúna.
Por
sua vez, a falta de norma específica na Lei Orgânica do Município de Uiraúna é
outro complicador que dificulta o seguimento de ritual confiável e seguro sobre
o caso, deixando dúvida até mesmo sobre o acerto ou não acerca da negação da licença
em apreço, nas circunstâncias bastante especiais e cercadas de dúvidas.
Há de se ver que o art. 5* do aludido decreto-lei manda
proceder, nos casos de cassação do mandato do prefeito pela Câmara, por
infrações definidas no artigo anterior, ao rito previsto no art. 6*, quando
houver incompatibilidade com a dignidade e o decoro do cargo, se outro não for
estabelecido pela legislação do Estado respectivo, o que não é exatamente o
caso tratado com relação ao prefeito de Uiraúna, porque não há qualquer
processo de cassação em andamento nesse órgão.
Não há margem de dúvida de que a Câmara de Vereadores de
Uiraúna, ante o princípio da sensatez, poderia apenas se acautelar, procurando
cumprir a sua regular missão institucional de não se antecipar às respeitáveis
decisões judiciais ou, ainda, se pretender, adotar as necessárias medidas, na
via da Justiça competente, com vistas ao definitivo impedimento da posse do
prefeito no cargo, ante os fatos irregulares cuja autoria lhe é atribuída,
independentemente do desfecho na via judicial, por questão de defesa da
moralidade pública.
Diante do exposto, peço vênia aos ilustrados componentes
da colenda Câmara de Vereadores de Uiraúna para sugerir, muito modestamente, que se abstenham
à adoção de medidas que possam levar à antecipação da cassação do prefeito dessa
cidade, em razão, sobretudo, de falta de previsão legal para o caso e ainda que
se trata de assunto especial que vem sendo examinado diretamente pela Excelsa
Corte de Justiça brasileira, o que, em princípio, obrigaria que essa Casa
Legislativa se acautelasse ao máximo, no sentido de seguir, rigorosamente e passo
a passo, o entendimento superior a ser dado no processo pertinente, sob pena de
a sua antecipada precipitação vir a ser prejudicial à normalidade jurídica
aplicável ao caso, cujas consequências podem ser imprevisíveis e nada agradáveis
aos interesses de Uiraúna.
Brasília,
em 29 de fevereiro de 2020
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