Quase que em
continuidade aos entreveros protagonizados quando do julgamento do processo do
mensalão, o presidente do Supremo Tribunal Federal e relator dessa ação e o revisor
desse caso voltaram a travar embate ferrenho em plenário, por ocasião do
julgamento de recurso de réu condenado pelos crimes de corrupção passiva e
lavagem de dinheiro. O relator acusou o revisor de fazer "chicana" –
conhecida no jargão jurídico como manobra para dificultar o andamento de processo
-, por entender que o ministro-revisor estava protelando o julgamento, ao sugerir
interromper a discussão sobre o assunto para reiniciá-la na semana que vem, com
o que o relator foi contra. O colóquio travou-se assim: "Presidente, nós estamos com pressa de quê?
Nós queremos fazer justiça", afirmou o revisor. "Nós queremos fazer nosso trabalho. Fazer
nosso trabalho e não chicana", respondeu o relator. Insatisfeito, o
revisor exigiu retratação, mas o relator disse que não iria se retratar. A discussão
da celeuma giza em torno do cálculo da pena aplicada por crime de corrupção
passiva cometido durante a vigência de lei que previa pena menor do que a
imposta ao réu, resultando condenação mais rigorosa. À toda evidência a tese defendida
pelo revisor poderá influenciar no julgamento dos recursos de outros réus,
inclusive do ex-ministro-chefe da Casa Civil, que teria pedido ao STF redução
da pena de corrupção ativa, com base em condenação enquadrada em lei mais
branda - que prevê prisão de um a oito anos -, mas a sua punição foi amparada
na lei atual, que estipula punição de dois a 12 anos. Em nota, entidades de
classe dos magistrados condenaram o tratamento dispensado pelo presidente do
Supremo Tribunal Federal ao ministro-revisor, dizendo que “a insinuação de que um colega de tribunal estaria a fazer ‘chicanas’
não é tratamento adequado a um membro da Suprema Corte brasileira”. Para
elas, na forma prevista no Código de Ética da Magistratura Nacional, é preciso
haver cortesia, mesmo diante de divergências, pois elas são “naturais e compreensíveis em um julgamento”.
O relacionamento entre os ministros deve ser respeitoso, como forma de
fortalecimento da independência da magistratura, que deve decidir em plenas condições
de serenidade e não diante de críticas e disputas entre os membros da mesma
Corte. As associações anseiam por que “o
respeito volte a orientar as atitudes de quem tem o dever maior de julgar as
grandes causas da Nação”. Não somente a relevância do veredicto do julgamento do
escândalo do mensalão exige que os magistrados ajam com absoluta tranquilidade
e inteligência até o final da contenda, como a magnânima responsabilidade da
Excelsa Corte de Justiça não pode se afastar dos princípios salutares do bom
senso e do equilíbrio, porque eles são instrumentos capazes de evidenciar
coesão e reafirmação da capacidade de julgar soberanamente, não importando a
notoriedade das autoridades envolvidas, pois as divergências somente podem
existir em termos de interpretação das normas jurídicas e jamais quanto ao grau
do conhecimento ou do relacionamento entre as pessoas, fato que levaria também
à desmoralização da instituição Poder Judiciário, caso as deliberações fossem adotadas
em razão das amizades e dos preitos de gratidão. A sociedade aspira por que o
Supremo Tribunal Federal cumpra sua nobre missão constitucional, no caso do
julgamento do processo do mensalão, em absoluta observância aos princípios das
normas jurídicas e dos primados da justiça, de modo que os réus sejam
condenados exatamente em harmonia com os crimes por eles praticados contra os
cofres públicos, como forma exemplar e pedagógica aos políticos para administrar
o patrimônio público em estrito respeito aos preceitos da honestidade e da
moralidade. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
Brasília, em 16 de agosto de 2013
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