Em
parecer considerado fenomenal e surpreendente, o procurador-geral da
República teve a sensatez de se manifestar, em parecer enviado ao Supremo
Tribunal Federal, sobre a nomeação do ex-presidente da República petista para o
cargo de ministro da Casa Civil, com o peso da competência institucional que os
brasileiros esperam sempre da atuação do Ministério Público.
Ele
ressaltou, com muita propriedade e oportunismo, “a atuação fortemente inusual da Presidência da República em torno da
nomeação”, para, em seguida, arrematar, com absoluta convicção, que “há elementos suficientes para afirmar
ocorrência de desvio de finalidade no ato e, por conseguinte, para declarar
nulidade do decreto presidencial”.
O
procurador-geral, que até então insinuava proteger, de forma velada, a
presidente do país contra as investigações sobre fatos denunciados, disse, de
forma surpreendente e conclusiva, que “o
momento da nomeação, a inesperada antecipação da posse e a circunstância
muito incomum de remessa de um termo de posse não havida à sua residência
reforçam a percepção de desvio de finalidade”.
No
parecer em comento, ele também ressalta sobre a necessidade da abertura de
inquérito contra a presidente da República, com vistas à investigação sobre os
atos dela, diante do possível crime de obstrução da Justiça.
À
toda evidência, porque os fatos mostram isso com muita clarividência e
robusteza, que a presidente do país e o petista agiram, de forma ardilosa, com
a finalidade de tumultuar as investigações da Operação Lava-Jato e de evitar a
eventual prisão do ex-presidente, com a sua nomeação para cargo que dá
direito ao foro privilegiado no STF e a outras benesses inerentes à sua
ocupação.
As
escutas telefônicas interceptadas de diálogos entre o petista e um cientista
político; o então ministro da Casa Civil e o presidente do PT; e a presidente e
o petista mostram, de maneira inequívoca, a sequência de iniciativas que
conduziu, às pressas, o ex-presidente para dentro do Palácio do Planalto, com
completo conluio que tem o verdadeiro nome de trama diabólica.
O
brilhante parecer tem uma passagem que pode ser chamada de lapidar, por
exprimir verdades que jamais podem ser omitidas em trabalho jurídico
responsável, sob pena de não se poder fazer justiça ao esforço de pura
interpretação jurídica sobre os acontecimentos do submundo da política.
A
propósito, convém se transcrever o primoroso texto, ipsis litteris: “Os elementos oriundos dessas interceptações
telefônicas e da colaboração premiada do ex-líder do Governo no Senado Federal,
associados à existência de denúncia oferecida, com pedido de prisão pendente de
exame judicial, e de investigações em curso constituem indícios convergentes de
que a evolução do caso Lava Jato e as medidas processuais penais dele
decorrentes, requeridas pelo Ministério Público Federal, provocaram forte
apreensão no núcleo do Poder Executivo Federal e geraram variadas iniciativas
com a finalidade de prejudicá-las, em distintas frentes. Nesse cenário, a
nomeação e a posse do ex-presidente foram mais uma dessas iniciativas,
praticadas com a intenção, sem prejuízo de outras potencialmente legítimas, de
afetar a competência do juízo de primeiro grau e tumultuar o andamento das
investigações criminais no caso Lava Jato. Os fatos que antecederam e se
seguiram à nomeação e posse de Luiz Inácio Lula da Silva no cargo de Ministro
Chefe da Casa Civil corroboram a conclusão de desvio de finalidade do ato.”.
O
parecer em referência se reveste de especial importância porque o
procurador-geral da República, há poucos dias, havia opinado favoravelmente à nomeação
em apreço, dizendo que se tratava de ato privativo da presidente da República, conquanto
tivesse sugerido que o caso do petista fosse julgado na primeira instância.
O parecer do procurador-geral da República sinaliza,
com muita clareza, que o possível dever de "gratidão" que ele tinha
para com o ex-presidente se encerrou nos pareceres anteriores, onde ele se
manifestou pela legalidade da questionada nomeação, em processo que era também
importante, mas a opinião para valer do Ministério Público, que deve
prevalecer, por sintetizar a verdade, saiu agora e foi elaborado com maestria,
que dá o verdadeiro tom do que representa o ato da presidente, inegavelmente
destinado a interferir nas ações da Justiça, que até então desempenhava
excelente trabalho para desvendar os fatos com possíveis irregularidades
envolvendo o homem público mais emblemático da história política deste país.
Os brasileiros anseiam por que o Supremo Tribunal
Federal apenas chancele as abalizadas e consistentes manifestações do
procurador-geral da República, que se fundamentaram nos fatos reais e condizem
com a premente necessidade de não mais se permitir que se possam prevalecer, em
pleno século XXI, atos administrativos manifestamente com conteúdo arranjado,
amoldado ao repudiável desvio da finalidade pública, visivelmente contrário ao
interesse do bem comum, que a Excelsa Corte de Justiça não pode mais referendar
a sua materialização, por representarem medidas absurdas e contrárias ao saudável
princípio republicano. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
Brasília, em 08 de abril de 2016
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