terça-feira, 23 de agosto de 2011

Primeiro o reino

O presidente do Senado Federal usou, duas vezes neste ano, um helicóptero da Polícia Militar do Estado do Maranhão, para passear em sua ilha particular de Curupu, cuja aeronave foi adquirida no ano passado para combater o crime e socorrer emergências médicas. Numa dessas viagens, o político estava acompanhado de um empresário, que considerou normal a sua carona. No fim do passeio, por motivo do desembarque das bagagens, houve atraso no atendimento de um doente com traumatismo craniano e clavícula quebrada, que foi socorrido por outro helicóptero. O senador afirmou, por meio da sua assessoria, que o uso pessoal da aludida aeronave é justificado pelo fato de que ele tem "direito a transporte de representação e segurança em todo o território nacional, seja no âmbito federal ou estadual, sem restrição às viagens de serviço" e que os voos particulares do senador estão em consonância com a Constituição Federal, não tendo, no entanto, prestado esclarecimentos sobre a presença do empresário no voo e a demora no atendimento do homem gravemente ferido. A rigor, pode se inferir que a cultura dos políticos deste país está cada vez mais deturpada quanto às suas prerrogativas, que, em qualquer circunstância, os seus interesses são sempre colocados em primeiro plano, não importando o que esteja acontecendo ao seu redor e muito menos a remota possibilidade de que isso possa estar afetando a vida ou os interesses do seu semelhante, que também possui  prioridade, embora não seja respeitada como deve. Não se pode negar à autoridade o seu direito de ser transportado na forma da lei, mas, no caso focalizado, fica demonstrado que o veículo envolvido foi desviado da sua destinação precípua e pós em risco a vida de um cidadão. Trata-se de evidente abuso de autoridade, que poderia ter sido evitado se o seu transporte tivesse sido feito por meio de veículo apropriado, sem ferir o direito do cidadão comum, sem cargo político, que não pode ser prejudicado, sob qualquer pretexto. A sociedade espera que os políticos brasileiros se conscientizem de que o seu direito também termina quando começa o do cidadão e que a sua autoridade deva servir de lição para o seu semelhante, como forma de dignificar ainda mais o cargo que exerce.
ANTONIO ADALMIR FERNANDES

Brasília, em 22 de agosto de 2011

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