O passaporte
diplomático concedido de forma indevida ao filho do então presidente da
República, a três dias do término do seu mandado, foi considerado irregular
pela Justiça Federal do Distrito Federal, que determinou ao Ministério das
Relações Exteriores a sua anulação, sob o argumento de que houve tratamento “antirrepublicano para prestígio pessoal”.
O advogado do filho do ex-presidente informou que o passaporte já havia sido
invalidado, na via administrativa, pelo Itamaraty, mas, por decisão do Tribunal
Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), seu cliente estava autorizado a
permanecer com o documento até a expiração do visto para os Estados Unidos da
América. A decisão no último recurso, proferida pela Justiça Federal do DF, foi
no sentido de que o passaporte fosse devolvido à origem, por se tratar de
documento nulo. Como se sabe, o passaporte diplomático, de cor vermelha, se destina,
nos termos da lei, às autoridades, aos diplomatas ou às pessoas que representem
o "interesse do país" em missão no exterior, conferindo ao portador
privilégios como atendimento preferencial nos postos de imigração e isenção de
visto em alguns países. Embora o filho do ex-presidente não se enquadre nos
critérios para a obtenção desse documento especial, o advogado pretende
recorrer da decisão, sob o argumento de poder usufruir o visto norte-americano.
À toda evidência, não passa de mentalidade equivocada, para não dizer
ridícula, a tentativa de insistir no usufruto das benesses parciais do
passaporte diplomático, quando, ao ser considerado inválido pela Justiça, ele,
legalmente, inexiste, não havendo a menor razoabilidade a alegação absurda de
haver direito ao visto norte-americano até o término da sua validade. No caso,
o pleito não tem a mínima procedência, porque não se pode usufruir algo
inexistente, assim considerado pela Justiça. Por seu turno, é completamente despiciendo
que a Justiça esclareça que o correto é tirar outro passaporte e pleitear o
devido visto, como forma de regularizar a situação de alguém, em conformidade
com a legislação de regência, como fazem as pessoas sensatas e honestas, quando
não se enquadram nas excepcionalidades da lei. O pai exemplar, não importando a
sua relevância como homem público, deve ter a dignidade de agir e atuar em
conformidade com o sentimento de razoabilidade e de justiça, evitando
participar da concessão de privilégios, por serem inadmissíveis e contrários aos
princípios republicanos e democráticos, não por não se ajustarem aos preceitos
de justiça e de probidade administrativa. Todavia, o homem público tem a
obrigação de promover imediatamente e de moto próprio à correção da
irregularidade praticada, sem necessidade de ficar fingindo que não viu nada,
não sabe de nada e não está nem aí para o caso. No caso, não é de bom tom que a
mais alta autoridade do país cometa grave irregularidade e não tenha a
dignidade de sanear prontamente seu erro, preferindo esperar que a Justiça
confirme a irregularidade e mostre que o ato jamais deveria ter sido praticado,
por ter contrariado, na origem, a norma legal. Na realidade, o episódio em
referência revela clara barbaridade contra a norma legal, onde se verifica que o
pai concede ao filho passaporte diplomático que, sabidamente, não se trata de
ato justo, à vista de a sua concessão ter ocorrido no apagar das luzes do
governo do pai e ao arrepio da lei. Como forma de não reconhecer a ilegalidade
do ato, o filho do ex-presidente ainda tenta brigar na Justiça para utilizar o
documento, sabidamente inexistente e ilegal, por ter sido anulado. Num país
sério e democraticamente desenvolvido, a Justiça certamente já teria
determinado, há muito tempo, a devolução do passaporte anulado e até aplicado
punição exemplar aos culpados pela indevida concessão de importante documento
que somente pode ser portado por quem realmente preenche os requisitos
previstos em lei, como é o caso em questão, tendo em conta que o filho do
ex-presidente da República não representa o "interesse do país" em missão no
exterior. Urge que a sociedade perceba, com urgência, o nível da mentalidade
dos homens públicos que administram o país, que não têm o menor escrúpulo de
praticar improbidade administrativa, em nome de interesses pessoais, a exemplo
do caso em comento, ferindo os princípios da administração pública, em especial
a ética, moralidade e legalidade. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
Brasília, em 14 de novembro de 2013
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