sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Tripúdio aos valores sociais

Um dos auditores fiscais que participaram do indigno esquema de corrupção na Prefeitura de São Paulo afirmou, em entrevista concedida ao “Fantástico” da Rede Globo de Televisão, ter gastado o dinheiro obtido irregularmente em insignificantes diversões, como luxúrias, banalidades e outras atividades afins, chegando a pagar, em única noite, até R$ 10 mil. Ele disse ter recebido propina de construtoras para que elas pagassem menos Imposto Sobre Serviços (ISS), cujo montante da fraude, investigada pelo Ministério Público, pode atingir a expressiva cifra de meio bilhão de reais. O acusado chegou a ser preso, mas logo foi liberado da cadeia por ter concordado em participar de delação premiada e agora pousa, com a maior cara-de-pau, para as câmaras como se não tivesse culpa pelas fraudes, pela corrupção e pelas irregularidades, dando a entender apenas que “... o resto é com a Justiça”. O que causa maior indignação é se perceber que nada é feito para corrigir as falhas existentes na legislação desatualizada, inócua e leniente com a criminalidade, que se expande vergonhosamente, como se a cultura do país se assentasse nos princípios deletérios dos bons costumes e da honestidade. Nos países desenvolvidos, podem até ocorrer casos semelhantes ao aqui comentados, mas os envolvidos são submetidos à dureza e à severidade das leis e dos tribunais, como maneira de pronta reparação dos danos causados ao erário e de lição pelo crime. Isso poderia servir de exemplo, caso houvesse o interesse das autoridades públicas em zelar e preservar o patrimônio da sociedade. Na realidade, o que ocorre aqui, no final da história, é que os bandidos mesmos são os eternos otários dos contribuintes, que pagam religiosamente em dia seus tributos, às vezes no maior aperto nas suas contas, mas o Estado inexplicavelmente permite que criminoso da pior estirpe, mesmo depois do estrago causado ao Tesouro, fique dando entrevista, rindo, tripudiando e zombando da cara das pessoas dignas e honradas, quando ele deveria estar trancafiado para o resto da vida, isolado da sociedade, e ainda sem direito ao usufruto dos bens adquiridos com o dinheiro sujo. A aparição desse criminoso nos lares dos cidadãos honestos é prova cristalina do gigantesco atraso do país que não se preocupa na modernização das leis. As autoridades incumbidas de cuidar da legislação referente aos crimes contra o patrimônio público deveriam se envergonhar diante de situação humilhante e vexatória como essa que foi mostrada para país, em programa de enorme audiência, por permitir que os cofres públicos sejam violentamente dilapidados, de forma desmoralizante por agente que tinha a obrigação de protegê-los, e ainda tem o disparate de pousar como herói, depois de ter gastado toda fortuna com luxúrias, vaidades e futilidades. Ao invés de a legislação prevê penas duras, concede regalias ao bandido para ficar tripudiando sobre os bestas dos contribuintes, que não esboçam nenhuma reação de insatisfação pelo estado de incompetência e leniência do sistema arcaico e despreparado para enfrentar situação degradante de constatar que o Tesouro não tem segurança e que os espertinhos manipulam criminosamente os dinheiros que deveriam se destinar exclusivamente aos programas governamentais. O país passa por tremenda carência de homens públicos, que possuam visão de modernidade e de futuro e sejam capacitados para rever e reestruturar os sistemas do Estado, principalmente os códigos e as leis que dão base jurídica às ações institucionais da nação, que já teve exaurido o poder de reação contra a força da criminalidade e da impunidade, justamente pelo ridículo comodismo existente nas lideranças político-administrativas do país, que não se esforçam para mover sequer uma pena no sentido de acompanhar a evolução e o desenvolvimento da humanidade. É muito triste se verificar que os padrões da administração do país não se coadunam mais com os tempos modernos, por terem atingido patamar de progresso, ainda não percebido pelo país tupiniquim, mas isso não é motivo de preocupação para as autoridades públicas, que estão focadas ao extremo em fortalecer as alianças políticas visando estratégias e maquiavelismos à reeleição presidencial ou às eleições nos Estados, enquanto as políticas públicas e os interesses da sociedade são relegados às calendas. A sociedade precisa, com urgência, mudar, por completo, o atual pensamento político-administrativo do país, como forma de reformulação e reestruturação dos sistemas capazes de contribuir para a modernização dos fundamentos do Estado, de modo que jamais haja possibilidade de alguém desviar dinheiros públicos e ainda ficar impune e tripudiando, por culpa da incompetência e da irresponsabilidade, da boa vontade dos cidadãos honrados, dignos e probos. Acorda, Brasil!
 
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
Brasília, em 28 de novembro de 2013

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