segunda-feira, 4 de novembro de 2013

A involução do homo sapiens

A Câmara dos Deputados fechou acordo com o “Procure Saber” para ser criado mecanismo com vistas a permitir a retirada, na segunda edição da biografia não autorizada, de trechos da obra, desde que o juizado especial decida que o biografado tem razão. O grupo de artistas do “Procure Saber”, que deseja colocar limites às biografias não autorizadas, concordou em pôr fim à censura prévia, por entender que a obra literária poderá ser publicada livre e sem restrição na primeira edição, mas poderá sofrer modificações na segunda por ordem do juizado especial - órgão do Judiciário incumbido de promover conciliação em demanda processual sem complexidade. Segundo o entendimento havido, possíveis danos civis e penais detectados na primeira edição não serão objeto de apreciação pelo juizado especial, mas na esfera do juizado regular, observada a legislação em vigor. Em tese, o juizado especial poderá agilizar a decisão, se for o caso da supressão de trechos da obra. O objetivo dos parlamentares e dos artistas é aprovar o projeto antes que o Supremo Tribunal Federal julgue a Ação Direta de Inconstitucionalidade de interesse de editores e biógrafos, impetrada contra o disposto no artigo 20 do Código Civil, que dá poder de veto aos biografados. Convém que impere o espírito da racionalidade e do bom senso na condução da demanda, para viabilizar a solução da polêmica que nem deveria ter existido, por representar ato de verdadeiro atraso mental, justamente oriundo da nata da intelectualidade artística. Nos países avançados, as biografias são trabalhos literários equiparados às demais obras escritas, a exemplo da história de quaisquer fatos que sirvam de tema para o autor discorrer livremente sobre ele. Não havendo obrigação ou necessidade de o escritor submeter sua obra literária à tutela de ninguém, porque a sua intelectualidade lhe pertence, não tendo cabimento que ela seja guiada ou manobrada por ser estranho ao autor, que não tem o direito de influenciar na sua criatividade e intelectualidade literárias, que são seu patrimônio, como parte natural da sua vocação profissional. Essa esdrúxula tentativa de censurar as obras literárias, a liberdade de expressão, demonstra evidente atraso de mentalidade intelectual, em contraposição aos princípios evoluídos da humanidade. A sociedade, em sintonia com os princípios democráticos, devem propugnar pela plena liberdade de expressão, ressalvados possíveis abusos, porque estes não condizem com a seriedade e a responsabilidade que devem imperar nas obras literárias. Somente nas republiquetas a mídia e o povo perdem tempo discutindo questões referentes às biografias não autorizadas, que versam, normalmente, sobre fatos do domínio público e conhecimento de todos. Nos países desenvolvidos, a liberdade de expressão é supervalorizada e os escritores sentem-se à vontade para publicar o que quiserem, inclusive biografias, obviamente sem o monstro da censura. Por certo, nesses países, ninguém será considerado indigno, porquanto nenhum escritor, em harmonia com o nível de civilidade, publica inverdades nem inventa mentiras nas biografias, que independem de censura e de prévia autorização, porque isso somente faz parte da cultura daqueles que estão muito mais preocupados com os possíveis dividendos e dos lucros sobre a comercialização das obras literárias. Com absoluta certeza, caso as biografias fossem distribuídas graciosamente, não existiria sequer a esdrúxula figura de biografia não autorizada e os biografados até iriam agradecer pelo marketing sobre o seu trabalho. Este pobre país ainda se encontra na idade da pedra lascada, em relação à evolução da humanidade, que ainda não tem conhecimento de que o homo sapiens já consegui ultrapassar muralhas e montanhas das trevas da ignorância e conquistar novos horizontes de sabedoria e de intelectualidade em benefício das relações pacíficas entre os homens inteligentes. Muitos artistas ainda não conseguiram vislumbrar as benesses do desenvolvimento da humanidade para o benefício do ser humano. Lamentavelmente, neste país, a intelectualidade ainda é submetida aos princípios constitucionais e legais anacrônicos e desatualizados, em contraposição aos avanços e as conquistas da civilização, onde já tiveram a sapiência de reformular e aperfeiçoar a sua legislação para vigorar sob os preceitos da modernidade, sem os entraves que não condizem com a salutar era da informática e da internet, em que o raciocínio lógico contribui para facilitar o relacionamento entre as pessoas inteligentes e de boa vontade. O país precisa, com urgência, despertar dessa terrível letargia da ignorância e da resistência ao entendimento de que o mundo desenvolvido já existe há bastante tempo e tem como propósito beneficiar a humanidade, principalmente quanto ao usufruto da liberdade nas mais diversas modalidades, inclusive de expressão. Acorda, Brasil!
 
ANTONIO ADALMIR FERNANDES

Brasília, em 03 de novembro de 2013

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