domingo, 21 de dezembro de 2014

O valor da fidelidade

Um ex-senador do PMDB foi nomeado para preencher o cargo de ministro do Tribunal de Contas da União, por ato assinado pela presidente da República, o qual passará a ocupar vaga deixada por relator de importantes processos relacionados com a Petrobras, notadamente com a compra da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos da América, objeto de intermináveis questionamentos sobre a constatação do pagamento de injustificáveis preços por refinaria sucateada, tendo sido verificados gigantescos prejuízos à estatal, conforme relatórios do mencionado tribunal e também da Controladoria Geral da União. 
O novo ministro desempenhou o importante cargo de presidente das duas Comissões Parlamentares de Inquérito da Petrobras, instaladas no Congresso Nacional, que, depois de completa inoperância, principalmente no período da última campanha eleitoral, quando quase nada foi investigado, tendo concluído seu trabalho sem qualquer resultado satisfatório, evidentemente em consonância com os objetivos adredemente pretendidos de nada ser apurado, ante a impossibilidade do aprofundamento das investigações e a indicação de irregularidade e muito menos de culpabilidades e de responsabilidades pelos desvios de recursos que foram reconhecidos até mesmo, pasmem, pela presidente da República, mas isso, na visão de parlamentares, não é suficiente para a indicação dos envolvidos e das consequentes responsabilidades.  
Ele também comandou a Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal, tendo relatado o projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para 2015, que serve como base para a elaboração do Orçamento.
Não há a menor dúvida de que a nova missão do ministro benjamim do principal órgão de controle externo da União será bastante espinhosa, haja vista que ele terá a incumbência de relatar os processos que envolvem a Petrobrás até agora, que vinham sendo conduzidos pelo seu antecessor no mesmo cargo. Entre os principais processos que sua experiência de controle externo vai exigir encontra-se, nada mais nada menos, aquele que trata da polêmica compra da refinaria de Pasadena, no Texas.
À vista de ser considerado aliado fiel do governo, o novo ministro teria declarado, na semana passada, após obter aprovação do Congresso para ocupar vaga no TCU e por sido questionado a respeito da sua aproximação com o Planalto, que vai ter "isenção" na hora de julgar esses e outros processos. Sem dúvida, é o mínimo que se pode esperar de quem tem a incumbência constitucional de fiscalizar e julgar as contas do governo, independentemente da condição de ter sido governista, com forte ligação com o governo, fato que naturalmente pode ter pesado e contribuído para a indicação, em prejuízo das indispensáveis exigências previstas na Constituição Federal, quanto aos notórios conhecimentos técnico-profissionais.
Um país com índole de seriedade jamais adotaria critério da indicação de políticos, sem a imprescindível comprovação dos requisitos constitucionais, para ocupar cargo relevante de ministro fiscalizador e julgador da execução do Orçamento da União, porquanto o fato da existência de fidelidade de aliado, por ter seguido o mesmo pensamento ideológico, pode possibilitar suspeita sobre a falta de zelo para com a coisa pública.
Trata-se de menosprezo aos princípios democrático e republicano, que deveriam ser observados nesses casos, como rigorosa necessidade da predominância dos  requisitos exigidos pela Carta Magna de notórios conhecimentos jurídicos, contábeis, econômicos e financeiros ou de administração pública, como forma de justificar o ato, também juridicamente.
É evidente que o ministro indicado, que se beneficia do sistema deficiente e precário vigente, não é culpado pelo fato de o país ainda permanecer nas trevas do subdesenvolvimento e da falta dos avanços já alcançados pelas nações evoluídas, onde jamais se permitiria tamanha promiscuidade na administração pública, quanto mais em se tratando do preenchimento de cargo de tamanha relevância, que tem por escopo justamente a incumbência de fiscalizar e controlar os gastos de quem foi responsável pela nomeação, fato que deveria ser evitado, justamente como medida capaz de contribuir para o fortalecimento dos princípios da administração pública.
No entanto, o fato em si pode suscitar inevitável questionamento pelo fato de que indicações realizadas em casos que tais quase sempre cingirem-se sob a ótica da ligação de amizade existente entre as partes envolvidas, normalmente em atendimento ao critério do apadrinhamento, compadrio ou tráfico de influência, em contraposição aos requisitos da moralidade de que trata a exigência constitucional, que naturalmente tem por propósito acabar com a forma nada republicana de apenas se privilegiar alguém entre aqueles que se comportaram como fiéis aliados.
Urge que a sociedade, no âmbito da sua responsabilidade cívica e patriótica, repudie e recrimine, com extrema veemência, o injustificável critério de nomeação de ministro tão somente pelo grau de fidelidade ou de aproximação com autoridades da República, quase sempre  em consonância com a aplicação do questionável quesito de apadrinhamento ou do tráfico de influência, porém em flagrante contraposição aos salutares requisitos constitucionais de notórios conhecimentos e de saberes especializados exigidos para o preenchimento do relevante cargo. Acorda, Brasil!
 
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
 
Brasília, em 20 de dezembro de 2014

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