sábado, 20 de junho de 2015

Urge a responsabilização por irregularidades

O Tribunal de Contas da União houve por bem solicitar que a presidente da República encaminhe explicações pertinentes a 13 fatos, preliminarmente, considerados irregulares que travaram a aprovação de suas contas, referentes à gestão de 2014, cuja responsabilidade foi atribuída diretamente à mandatária.
Nos termos do voto do relator das contas do governo, as explicações devem ser dadas pela petista, porque os atos irregulares partiram de documentos que só podem ser assinados por ela, mesmo a responsabilidade pelos atos irregulares vincula-se à figura da presidente do país, que tem a obrigação constitucional de responder pessoalmente pelas consequências de seus atos.
Segundo o TCU, as irregularidades se referem a atos que atrasaram repasses do governo para bancos públicos pagarem benefícios sociais e programas de governo, as chamadas "pedaladas", sendo que os casos considerados como mais graves são as artimanhas no Orçamento de 2014, para se evitar que o governo tivesse que conter despesas no ano em que a presidente disputava a reeleição.
O relatório esclarece que o governo já tinha consciência, desde fevereiro de 2014, de que ele não realizaria a arrecadação prevista e que suas despesas obrigatórias seriam superiores à previsão orçamentária. Nesses casos, a Lei de Responsabilidade Fiscal obriga o governo a cortar despesas não obrigatórias a cada dois meses, o que não foi feito.
Sem a menor preocupação com o agravamento da já periclitante situação de descumprimento das normas de administração orçamentária e financeira, o Palácio do Planalto, no fim do ano, aumentou suas despesas em mais R$ 10 bilhões e ainda contou com o beneplácito do Legislativo, cujos parlamentares receberam dinheiro de emendas para aprovação de lei desobrigando o governo de fazer economia de gastos prevista no orçamento do ano, a título de superávit primário, procedimento também considerado proibido pelo TCU, que concluiu que o governo teria que cortar pelo menos R$ 28 bilhões, mas não fez.
O imbróglio ganha contorno de gigantescas complicação e gravidade porque é a primeira vez, na história republicana, que um presidente brasileiro é obrigado a apresentar defesa pessoal sobre os gastos do seu governo, por imposição constitucional e legal do órgão do controle externo, evidentemente tudo em consequência da má gestão de verbas públicas, por força da irresponsabilidade e da prepotência em nome da reeleição à Presidência da República, que levaram a mandatária do país e assessores diretos a desprezarem as normas fundamentais de administração orçamentária e financeira, de forma consciente e tranquila, sem a menor preocupação com as consequências, inclusive possíveis sanções.
As irregularidades apontadas pelo TCU consistem na infringência de dispositivos da Constituição Federal, Lei de Responsabilidade Fiscal e Lei Orçamentária, basicamente na falta de contabilização de dívidas do governo junto ao Banco do Brasil, BNDES e FGTS (R$ 40,2 bilhões acumulados até 2014); no adiantamento da Caixa Econômica Federal para pagar Bolsa Família, Seguro Desemprego e Abono Salarial (R$ 7 bilhões em 2014); nos adiantamentos concedidos pelo FGTS à União, para cobertura de despesas no âmbito do Programa Minha Casa Minha Vida (R$ 1,4 bilhão); nos adiantamentos concedidos pelo BNDES à União, para cobertura de despesas no âmbito do PSI (Programa de Sustentação do Investimento); na ausência de rol de prioridades e metas no Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2014; no pagamento de dívida contratual junto ao FGTS do Minha Casa, Minha Vida sem autorização do Orçamento; no uso de recursos além do aprovado no Orçamento por estatais ligadas à Petrobras, Telebrás e Eletrobrás; na execução de despesa de investimento sem dotação nos orçamentos de estatais ligadas à Petrobras e Eletrobrás; na ausência de contingenciamento de despesas discricionárias da União de, pelo menos, R$ 28,54 bilhões, quando já se sabia que não haveria dinheiro para gastar; no condicionamento de aumento de gastos públicos à aprovação de lei no parlamento que mudava meta de superávit; na inscrição irregular em Restos a Pagar (dívida de curto prazo) de R$ 1,367 bilhão, referentes a despesas do Programa Minha Casa Minha Vida, no exercício de 2014; na omissão de transações deficitárias da União junto ao Banco do Brasil, BNDES e FGTS, nas estatísticas dos resultados fiscais de 2014; e na existência de distorções no Plano Plurianual 2012-2015, tornando-o sem confiabilidade.
Como se pode verificar, sem qualquer dificuldade, as irregularidades levantadas pela fiscalização são de extrema gravidade, por comprometerem a regularidade e a exatidão das contas públicas, em razão de as chamadas “pedaladas fiscais” terem o condão de distorcer, de forma continuada o resultado do desempenho econômico-financeiro da União, pelo uso irregular de dinheiros de entidades públicas, em dissonância com as normas aplicáveis à espécie, em que pesem as reiteradas denúncias, à época, dos meios de comunicação, mostrando os flagrantes e abusivos ferimentos das normas constitucionais e legais, nos casos enfocados.
Não há dúvida de que o TCU, ao divulgar a penca das irregularidades praticadas pelo governo, por suas graves lesões aos regramentos jurídicos do país, que a presidente brasileira teria se obrigado a observá-los, entre outros, no juramento de posse, torna o caminho sem retorno quanto à materialização de contas irregulares, eis que as infringências aos dispositivos indicados, em cada caso, não apontam senão para a recusa das justificativas da presidente sobre as suas manjadas “pedaladas”, que macularam irremediavelmente as contas do governo, referentes ao exercício de 2014, tornando impossível o mesmo tribunal se convencer em contrário, por força de argumentação sem o menor grau de transformação dos atos irregulares em regulares, num simples passe de mágica, mesmo em situação excepcionalíssima, porque haveria completa desmoralização da imagem e do poder fiscalizador do principal órgão de controle das contas do governo federal.   
Compete não somente ao Tribunal de Contas da União, mas também à sociedade repudiar e reprovar a forma absolutamente promíscua como o país vem sendo administrado, ao sabor das conveniências e oportunidades políticas, com indiscutíveis reflexos na prestação dos serviços públicos, marcada pela péssima qualidade e pela completa ausência de prioridades das políticas públicas; na condução das políticas econômicas, com seu desastroso desempenho a contribuir para a recessão e a perda das condições de desenvolvimento socioeconômico; na degeneração dos princípios da moralidade, por meio dos reiterados casos de corrupção, que impõem falta de confiança na gestão do governo e ausência de investimentos; e nas abusivas e inadmissíveis inobservâncias de normas constitucionais e legais pertinentes a despesas governamentais, em visível demonstração de incúria e de falta de zelo quanto ao relevante desempenho das funções constitucional e legal inerentes ao principal cargo do país. Acorda, Brasil!
 
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
 
Brasília, em 20 de junho de 2015

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