domingo, 7 de junho de 2015

As lágrimas ao vento

            No calor da forte comoção, em razão do incêndio ocorrido na boate Kiss, em Santa Maria/RS, que dizimou 242 vidas de jovens estudantes, a presidente da República, se dizendo bastante consternada, disse, na ocasião, que, verbis: "A dor que presenciei é indescritível. Falo dessa dor para lembrar da responsabilidade que todos nós do poder Executivo temos com a nossa população. Diante dessa tragédia, temos o dever de assumir o compromisso, de assegurar que ela jamais se repetirá".
Agora que as manchetes da imprensa vêm à tona, para comentar o julgamento de bombeiros envolvidos na aludida tragédia, os tristes fatos do massacre humano são aflorados, trazendo no seu bojo a lembrança das lágrimas da presidente da República que não passaram de mera encenação diante da televisão, ante o gigantesco abalo físico que se apoderou dos brasileiros, sensibilizados com o terrível e devastador acontecimento.
Ao que se é dado conhecer, as lágrimas presidenciais se tornaram absolutamente inócuas e infrutíferas, em que pese o clamor da sociedade, não se tendo notícia sobre o saneamento das questões centralizadas na inexistência de instrumentos eficientes e eficazes para prevenir fatos semelhantes ao de Santa Maria ou até mesmo a conscientização da sociedade sobre a necessidade de se manter em vidência a obrigação de as autoridades públicas adotarem as medidas da sua incumbência constitucional e legal de zelar para que fatos análogos àqueles sejam definitivamente evitados.
Não há a menor dúvida de que nos países sérios e conscientes quanto à responsabilidade primacial do Estado sobre a preservação da integridade da população, existem legislação e mecanismos apropriados e capazes de prevenção de situações trágicas de incêndios, a exemplo da exigência de rotas de fuga desimpedidas, extintores de incêndio, lotação máxima e regras mínimas para a realização de shows e festas, de modo a se evitarem as desgraças com a perda de importantes vidas e a destruição de instalações e patrimônios.
Em que pese a completa inércia das autoridades incumbidas de implementar as medidas capazes de suprir as carências dos instrumentos contra incêndios, é inegável que os proprietários de casas noturnas, pais, professores e até mesmo os próprios jovens usuários tenham o mínimo de preocupação quanto qualquer medida com vistas ao suprimento das precariedades que causaram o sinistro de Santa Maria, ou seja, ninguém está preocupado se o caos continue prevalecendo perigosamente ameaçando as vidas humanas, principalmente.
Em se tratando da irresponsabilidade genuinamente brasileira, é evidente que não se pode confiar em fiscalização, inspeção ou qualquer outra forma de controle, à vista da falta de seriedade que impera em tudo que funciona neste país, principalmente quando se encontra presente e atuante o vergonhoso sistema das propinas, que corre souto nas instituições públicas ou privadas, em completa desmoralização dos princípios da dignidade e da moralidade.
Não há dúvida de que a tragédia de Santa Maria ainda permanece como chaga ativa e aberta à luz solar, exposta a atormentar e a intranquilizar a sociedade, ante a indiscutível falta de respeito à dignidade humana, pela visível inconsistência e inexistência de instrumentos capazes do estabelecimento de controle e fiscalização para a garantia da presença do Estado de forma responsável a assegurar segurança e proteção dos participantes de eventos sociais.
As precariedades das condições de segurança contra sinistro nas casas de shows, principais responsáveis por tragédias, deixam a firme convicção de que o Brasil precisa evoluir, com a máxima urgência, de modo que haja conscientização sobre a necessidade da tomada de atitude coletiva, envolvendo a sociedade e o Estado, com vistas à priorização de medidas que viabilizem a transformação de ideias em instrumentos efetivos e concretos de segurança e proteção da sociedade, tendo como primordial objetivo a seriedade na preservação, em especial, da integridade da vida humana. Acorda, Brasil!
 
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
 
Brasília, em 07 de junho de 2015

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