quarta-feira, 20 de fevereiro de 2019

Imunidade parlamentar?


Um ministro do Supremo Tribunal Federal rejeitou recurso do presidente da República e manteve a decisão que havia determinado o pagamento do valor de R$ 10 mil de indenização, por danos morais, a uma deputada federal do PT do Rio Grande do Sul.
O presidente brasileiro foi condenado pela Justiça, por ter afirmado, em 2014, quando ainda exercicia o cargo de deputado federal, que a petista não merecia ser estuprada porque ele a considerava "muito feia" e ela não fazia o "tipo" dele.
Por essa mesma declaração, o presidente brasileiro virou réu no Supremo, em ação penal, mas a tramitação do processo pertinente foi suspensa porque, como chefe do Executivo federal, ele não pode responder, criminalmente, por fatos acontecidos anteriormente ao mandato, segundo prerrogativa prevista na Carta Magna.
Em agosto de 2017, o Superior Tribunal de Justiça manteve a condenação imposta ao presidente brasileiro, mas ele recorreu ao Supremo, alegando, como argumento, que a decisão da Justiça contrariava o princípio da imunidade parlamentar, diante da existência de "antagonismo ideológico" entre ele e a parlamentar petista.
Diante disso, os advogados dele alegaram que, na ocasião em que foi dada a entrevista polêmica, o presidente estava no exercício de mandato parlamentar e, sob essa condição, na ótica da defesa, a Constituição assegurava imunidade nesses casos.
Não obstante, em decisão monocrática, um ministro da Excelsa Corte de Justiça rejeitou o recurso do presidente, tendo como fundamento o fato de que, com o referido argumento, houve tentativa de reanálise de provas, e que isso não é possível, segundo entendimento consolidado do Supremo, ou seja, no recurso ora denegado, não havia elementos novos, i.e., diferentes daqueles já analisados e também não aceitos na instância anterior.
O ministro escreveu na decisão que "Ficou assentado pelas instâncias coletoras da prova nada concernir à atividade parlamentar as ofensas do recorrente".
A propósito, dizem-se que o presidente da República teria sido igualmente agredido verbalmente pela deputada petista, em forma de palavras fora da liturgia civilizatória, caso em que, por certo, caberia igual medida judicial contra ela.
Não obstante, quanto a isso, parece que a parlamentar foi melhor assessorada, em termos jurídicos, do que o presidente do país, que teria acreditado em pseudoimunidade parlamentar para agressão à honra e nada fez, talvez imaginando que a Justiça aceitaria facilmente a sua inconsistente e inútil argumentação.   
Não há a menor dúvida de que a agressão verbal proferida contra uma colega de Parlamento constitui algo absolutamente dissonante com a prerrogativa inerente às atividades parlamentares, que dizem respeito ao exercício das funções próprias da defesa da sociedade, com relação ao estrito interesse público, sem que isso implique na imunidade por claro desprezo à dignidade humana.
Para que não pairem dúvidas sobre o tema, a Imunidade parlamentar é um conjunto de garantias previstas na Constituição Federal, para que os integrantes do Poder Legislativo tenham plenas condições de exercer as funções próprias das suas atribuições, com a certeza de que as suas manifestações e opiniões possam ser livres e apropriadas às causas inerentes às atividades legislativas.  
De forma alguma, o parlamentar pode generalizar o uso de prerrogativa de garantia de suas atividades legislativas para agredir verbalmente quem quer que seja, porque violência contra outrem não faz parte da cartilha de boas condutas que os congressistas precisam observar sob fiel rigor, porque, do contrário, a norma constitucional estaria respaldando atos impróprios de violações dos salutares costumes e contribuindo para incentivar abusos de autoridade.
A importância das prerrogativas da imunidade parlamentar ganha relevo para enaltecer a liberdade e a independência do exercício das atividades legislativas, que não podem ficar à mercê de alguém ser processado judicialmente por decorrência da defesa de questões relacionadas com seus projetos legislativos, evidentemente de interesse público.
Em tese, os parlamentares ficam isentos de processos penais e civis como consequência de opiniões, discursos ou votos proferidos no âmbito de suas atividades políticas, nos exatos termos do disposto no artigo 53 da Constituição, que estabelece, verbis: “Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos”.
No caso dos deputados federais e senadores, a imunidade abrange o território nacional, enquanto os vereadores só gozam da imunidade quanto à liberdade de opiniões e manifestações somente na jurisdição do município que eles representam.
É preciso ainda se verificar a materialidade da imunidade parlamentar, porque ela varia conforme o lugar onde a manifestação parlamentar acontecer, a se considerar que ela pode ser absoluta quando se tratar de opinião ou discurso proferido no âmbito do Congresso Nacional e relativa quando os fatos ocorrerem fora dele.
          Em síntese, a imunidade parlamentar é algo decente e edificante, por se referir à prerrogativa constitucional que assegura aos parlamentares plenas garantia, liberdade, autonomia e independência no exercício de suas nobres funções legislativas, sob a proteção contra processos judiciais, em razão de suas opiniões, manifestações ou discursos com conteúdo estritamente relacionado às atividades parlamentares, ficando muito claro que agressões verbais destinadas a denigrir a dignidade do ser humano constituem abusos e violações estranhas às representações políticas, que precisam realmente ser coibidas e penalizadas pela via do caminho civilizado da Justiça, tal como aconteceu no caso em comento.
Brasil: apenas o ame!
Brasília, em 20 de fevereiro de 2019

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