terça-feira, 5 de fevereiro de 2019

Visível decadência do Poder Público

O descaso, a ganância econômica, a falta de controle e fiscalização e especialmente a impunidade expõem as visíveis decadência, precariedade e ruína generalizada do país tupiniquim, cujos reflexos é a dizimação em massa de seres humanos e a destruição grosseira do meio ambiente, mostrando a bestial involução das pessoas envolvidas nesses trágico e horroroso quadro de pura desolação.
O retrato da destruição generalizada não poderia ter sido melhor representado pelo terrível lodaçal de lixo, areia e rejeitos tóxicos que varreu região de Brumadinho, trazendo no seu bojo os podres encrustados na falta de responsabilidade dos empresários e autoridades públicas, que, respectivamente, deveriam ter sido cuidadosos no cumprimento de funções de gerenciamento da barragem, em termos de manutenção sob qualquer possibilidade de vazamento, e de fiscalização pelos órgãos públicos.
Em pleno século XXI, com a modernidade de novos tempos, não se admite mais que obras, monumentos, pontes, edifícios, viadutos, museus públicos fiquem a todo memento expostos à incúria do homem e estejam envolvidos em sinistros, como quedas, incêndios, interdições e outras formas e demonstrações de descaso para com o patrimônio público, pondo em risco vidas humanas, além de imensuráveis prejuízos materiais e financeiros.
Normalmente a conclusão sinaliza para tragédias que poderiam ter sido evitadas, caso houvesse os devidos controle e fiscalização por quem de direito, como forma salutar da precaução, em harmonia com a responsabilidade intrínseca da administração pública, na forma do ordenamento jurídico vigente do país.
Ressaltem-se as catástrofes de grandes dimensões já acontecidas, nos últimos tempos, a exemplo do incêndio do Museu Nacional, no Rio de Janeiro, e da Boate Kiss, na cidade gaúcha de Santa Maria, que demonstram visível e gritante deficiência da ação fiscalizatória da incumbência oficial, a sinalizar para a urgente necessidade do indispensável aparelhamento dos órgãos públicos, com vistas a bem cumprir a sua missão institucional, sob pena de acusação de incúria administrativa.
O que se percebe, na prática, é a incapacidade tanto de fiscalização e coibição como, de pior maneira, de punição aos envolvidos ou culpados pelas insanáveis tragédias, como essa de Brumadinho, como se todo esse sofrimento fosse apenas preparo ou experiência para novas desgraças ainda piores, diante do conformismo e da passividade das autoridades públicas incumbidas de zelar e proteger as pessoas em situações similares, porquanto praticamente nada é feito, em termos efetivos, para a prevenção contra chagas dolorosas que podem se repetir, deixando o rastro de muito estrago e interminável e profunda tristeza.
O estranho e lastimável é que, no primeiro momento, as autoridades públicas e os envolvidos diretos sobre os fatos danosos são habilidosos em lamentar o ocorrido, apontar culpados e até há a aplicação de pesadas multas, que, na prática, nem são pagas, e tudo fica nisso mesmo, como se no aguardo de novos sinistros, para que as mesmas perfídias e irresponsabilidades venham à tona, com as mesmas caras-de-pau, a repetir as esfarrapadas e injustificáveis desculpas recrimináveis pela sociedade, que não tolera tantas incompetências e irresponsabilidades.
A verdade é que, também nesses casos trágicos, sempre há a prevalência do jeitinho brasileiro, trasvestido e presente no poder da lei do mais forte, com a força hercúlea do lobby irresponsável, que é habilmente exercido tanto no âmbito do Executivo como no do Legislativo, neste com evidência na bancada de parlamentares simpatizantes (campanhas patrocinadas por empresas do ramo) de mineradoras, construtoras, gestoras e congêneres, que são protegidas e favorecidas por ela, cujos projetos contrários aos seus interesses dificilmente são aprovados no Congresso Nacional, em clara manifestação de advocacia administrativa, em prejuízo do interesse público.
          Como se constata no caso de Brumadinho, a empresa, que poderia ter trabalhado para evitar a tragédia, agora, depois de ter atolado na lama e nos seus dejetos importantes vidas humanas e vem oferecer migalhas de ajuda financeira, em forma de trocados a título de agrado e reparação por tão grave mal causado aos seres humanos, cujo gesto não passa do que se pode chamar de “cala-boca”, em evidente atitude de pura indignidade, porque isso poderia ter sido evitado, se o desastre tivesse não existisse, como era do dever dela adotar as medidas efetivas de prevenção.
Causa extrema perplexidade o resultado de relatório da lavra da Agência Nacional de Águas, que não teve a menor cerimônia nem escrúpulo de anunciar que, pasmem, menos de 3% das quase 25 mil barragens existentes no país foram fiscalizadas de 2017 para o presente momento, o que demonstra a dimensão da gigantesca irresponsabilidade dos órgãos públicos, diante de situação da maior importância para a proteção de vidas humanas, quando se percebe que 97%, ou seja, quase 100%, das barragens não foram fiscalizadas, a evidenciar completo e generalizado descaso por parte da fiscalização legalmente atribuída ao Estado, que não pode continuar sendo patrocinador dessa monstruosa esculhambação, deixando ao deus-dará o cumprimento de tão importante missão institucional.
O quadro se mostra ainda mais dantesco diante da notícia de que muitas barragens estão sendo construídas com tecnologia de resistência abaixo do ideal recomendado, em razão da economia de custos, evidentemente para se gastar bem menos, conquanto a segurança é o que menos interessa para os inescrupulosos e irresponsáveis empresários, que estão menos preocupados com a vida de outrem.
É preciso que haja a imposição, com urgência, da responsabilização pela indiscutível culpa de quem deixa de observar os parâmetros exigidos para a construção de barragens, de modo que a penalidade seja impositiva de tal maneira que isso seja claro exemplo pedagógico, para se evitar a sua reincidência, em caso semelhante.
No caso de Brumadinho, já foram contabilizados centenas os mortos e desaparecidos, com reflexo de impactação em milhares de familiares e amigos de quem perdeu a vida, em dimensão da calamidade que poderia ter sido evitada, a demandar crime da maior gravidade contra a vida, descartando, desde já, qualquer insensata classificado atenuante de causas naturais ou simplesmente fatalidade, porque isso não passaria de muita indiferença e maldade contra aqueles que se foram e os que ficaram envoltos nas sequelas da tragédia e da tristeza.
          O mais relevante das infelizes justificativas soa apenas como premonição para outros sinistros próximos, justamente diante da falta de punições exemplares, nunca foram aplicadas e jamais serão, a continua com essas indiferenças e irresponsabilidade por parte das autoridades públicas, que pródigos em reconhecer as falhas do sistema, mas providências precisas e efetivas nem pensar, em total benefício dos causadores dos seguidos desastres.
É preciso que os criminosos sejam tratados com a dureza da lei, mas sob atuação séria, sem demora, sem condescendência com eles, de modo que seja possível, o mais rapidamente possível, a definitiva interrupção dos sucessivos e inconcebíveis episódios lamentáveis e trágicos de gigantesca magnitude.
Convém que surja, imediatamente, autoridade pública, que pode e deve ser o próprio presidente da República, para dá basta a acontecimento desumano, trágico e chocante, como esse de barragens arrombadas, porque tudo precisa ter limite e ele está exatamente nas mãos de quem tem o poder de comandar o país, para quem se atribui a responsabilidade de encontrar mecanismos próprios para a solução desses preocupantes descontroles e inseguros sistemas de barragens, que não podem mais continuar nesse rastro de tragédias dizimando importantes vidas humanas.
O caso emblemático de Mariana, também nas Minas Gerais, ocorrido há três anos, vem se arrastando em péssimo exemplo da falta de efetividade de medidas pertinentes, cujas ações demandas estão inconclusas, não havendo cumprimento das determinações, que são desrespeitadas, havendo pessoas desabrigadas, construções inacabadas, entre outras situações não resolvidas, em evidente demonstração do puro descaso, em visível quadro de desesperança sobre final que deveria ser feliz ou, pelo menos, razoável para as partes prejudicadas.
É inconcebível que uma companhia, em tão estreito hiato de tempo, seja protagonista de dois acidentes dantescos, promovendo o caos e o terror em duas regiões e causando muitas e injustificáveis desgraças, que poderiam ter sido evitadas, caso houvesse o mínimo de fiscalização e controle por parte do Estado, que se mostra impiedosamente ausente, em inominável irresponsabilidade, que até a Justiça fecha os olhos para a tragédia, posto que não se tem notícia sobre a sua atuação, em cumprimento do ordenamento jurídico aplicável à espécie.
A dívida social imensurável da empresa já era mais do que suficiente para que as autoridades públicas, Executivo e Judiciário, tivessem o mínimo de sensatez para agir com os devidos rigor e presteza, na busca de solução para os problemas, sabendo-se que as partes prejudicadas são apenas vítimas da incompetência dos empresários, que são os causadores de todo esse infortúnio, ou seja, compete ao Estado adotar medidas capazes de contribuir para a mudança desse quadro de coisas prejudiciais à sociedade, repita-se, vítima do sistema em clara falência de funcionamento, que precisa ser reativado, com urgência.
Não se pode olvidar que, não faz muito tempo, o próprio presidente do país prometia o afrouxamento da legislação ambiental, certamente para angariar voto à sua eleição, inclusive tendo cogitada a extinção do ministério que cuida do meio ambiente, além de ter garantido aos produtores rurais que iria segurar as multas, quando também disse que “Não vai ter um canalha de fiscal metendo a caneta em vocês”, ou seja, mais um caso em que se pratica o crime de advocacia administrativa, em claro prejuízo do interesse público.
Diane de tragédia de dimensão imensurável, é bem possível que deva prevalecer o bom senso para o presidente brasileiro, de modo ele seja obrigado a mudar de opinião, posto que, na empolgação de Davos, na Suíça, ele tivesse afirmado que “somos o país que mais preserva o meio ambiente”, evidentemente que ele não contava com mais esse sopapo de toneladas na sua fronte, com o despejo dos dejetos da Barragem de Feijão sobre a população indefesa e desprotegida.
Os fatos mostram a imperiosa necessidade da preservação da ainda riqueza do meio ambiente brasileiro, que pertence ao patrimônio dos brasileiros, que têm o dever de exigir que ele não seja objeto de mero chafurdamento no mar da irresponsabilidade, dos interesses e das conveniências de inescrupulosos oportunistas.
O relatório supracitado escancara, com a maior lucidez, porque reflete a situação de extrema precariedade do Estado, as vísceras de um sistema falido de controle e fiscalização do poder público, servindo como excelente alerta para mostrar que o modelo vigente de atuação oficial precisa ser repensado, com a devida urgência, levando-se em conta exclusivamente o interesse público, sem a menor complacência com o mundo empresarial, que precisa se enquadrar nas devidas regras de segurança e proteção da vida e do meio ambiente, no caso da indústria mineral, que é muito importante para a economia nacional, mas o poderio tem o limite do respeito à vida humana.
Brasil: apenas o ame!
          Brasília, em 5 de fevereiro de 2019

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