sábado, 2 de fevereiro de 2019

Missão sob a égide da responsabilidade


Um membro do Conselho Nacional do Ministério Público enviou mensagem a colegas, criticando as seguidas negativas recebidas pelo ex-presidente da República petista, na tentativa de sair da prisão para estar presente à cerimônia fúnebre do irmão dele.
Publicado parcialmente pela Folha de S. Paulo, o texto do conselheiro afirma que ele, "pela primeira vez na vida, sentiu vergonha do Ministério Público", tendo ressaltado que não é petista, que não compactua "com tudo o que foi feito", mas que "essa indignidade" ele não consegue aceitar.
O conselheiro ressaltou ainda que até os militares, na época da ditadura, permitiram que o petista deixasse a prisão para comparecer ao velório da mãe, mas, nesse ponto, ele não disse se àquela época existiam os mesmos empecilhos de ordem operacional, ou seja, ele falou o que quis sem sopesar as circunstâncias, como devia, que precisam ser levadas em consideração na devida e pena avaliação do caso em si.
Por fim, questionou o argumento de que a Polícia Federal não teria o aparato necessário para o transporte do ex-presidente e disse que o Ministério Público "se apequenou" ao acatar o "esdrúxulo argumento", salvo se ele quisesse que os equipamentos e pessoal fossem deslocados do local do desastre humanitário de Brumadinho, para satisfazer tão somente ao pedido formulado pelo ex-presidente, como se ele fosse a pessoa mais importante deste país, embora a sua condição é de preso como os demais que estão encarcerados.
É muito possível que o conselheiro, que se diz envergonhado, não tenha se cientificado precisamente sobre os termos das manifestações da Polícia Federal e do Ministério Público, quanto ao pedido formulado pelo ex-presidente, para participar do velório de um irmão, em São Bernardo, os quais foram vazados nos seguintes termos: a) Polícia Federal: “não há helicópteros para fazer o transporte do ex-presidente. Os equipamentos estão à disposição do efetivo deslocado para atuar no regaste das vítimas do rompimento da barragem em Brumadinho (MG).”; b) Ministério Público: “preservação da segurança pública e do próprio preso. Este Juízo não é insensível à natureza do pedido formulado pela defesa. Todavia, ponderando-se os interesses envolvidos no quadro apresentado, a par da concreta impossibilidade logística de proceder-se ao deslocamento, impõe-se a preservação da segurança”.
As ponderadas justificativas, com base em elementos da maior plausibilidade, por terem sido expendidas em argumentos incontestáveis e substancialmente irrefutáveis, foram encampadas pelo desembargador do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que assinalou, no seu despacho, a inviabilidade operacional e econômica e os demais valores tutelados pelo ordenamento jurídico, tendo concluído que “O indeferimento, portanto, não foi arbitrário ou infundado. Pelo contrário, está adequado à situação concreta. Aliás, conforme já destacou a digna magistrada, inclusive com amparo no parecer do Ministério Público, ‘o indeferimento da autoridade administrativa encontra-se suficiente e adequadamente fundamentado na impossibilidade logística de efetivar-se o deslocamento pretendido em curto espaço de tempo’”.
Ou seja, o pensamento do conselheiro se harmoniza com as ideias da defesa do ex-presidente que somente enxergou o que ela chamou de "direito humanitário", que realmente existe e é fato indiscutível, desconsiderando por completo outros fatores da maior importância, que dizem respeito às dificuldades de operacionalização e segurança, no deslocamento do petista.
Sobrelevava se avaliar não somente a segurança do petista, mas também da população, tanto da militância como de opositores, porque essas questões são imponderáveis e imprevisíveis.
A outra questão, também da maior importância, estava relacionada com a estratégia para o deslocamento do ex-presidente, no percurso de Curitiba (PR) até São Bernardo (SP), obrigando a disponibilização de enorme força-tarefa para a proteção máxima do petista.
É evidente que não se pode vislumbrar, desde logo, o que poderia ter acontecido com a saída do ex-presidente da prisão, para comparecer ao velório de seu irmão, que teria sido justíssimo, em se tratando de sentimento humanitário, mas também não se poderia ter a garantia da plena segurança dele, que corria o risco de ser sequestrado por sua militância, como forma de não permitir que ele voltasse para a prisão, diante da intransigente demonstração de que ele é inocente e não há conformismo sobre a condenação dele, ou ainda de algum ataque contra ele, por pessoas insatisfeitas com o que ele possa ter praticado de contrário aos interesses dos brasileiros.
Nesse caso, em um caso ou noutro, as consequências poderiam ter sido imprevisíveis e certamente prejudiciais à normalidade cívica, em que, possivelmente, o conselheiro até poderia se sentir envergonhado, justamente por não ter  pensado exatamente com as cautelas propugnadas no parecer do Ministério Público, que estão fundamentadas em princípios de bom senso e racionalidade, mostrando que as autoridades públicas precisam cumprir a sua missão institucional sob a égide dos princípios da razoabilidade e da responsabilidade.
Brasil: apenas o ame!
Brasília, em 2 de fevereiro de 2019

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