Um ministro do Supremo Tribunal Federal suspendeu a
nomeação do diretor-geral da Polícia Federal, em atendimento a pedido que
questiona a legitimidade do ato presidencial, por, em princípio, evidenciar
afronta à conduta ética da impessoalidade constitucional.
Segundo
a imprensa, o Supremo, sensível à formulação do PDT, houve por bem
conceder a liminar solicitada por essa agremiação, com base nos seguintes termos,
conforme despacho ministerial: "Analisando os fatos narrados,
verifico a probabilidade do direito alegado, pois, em tese, apresenta-se viável
a ocorrência de desvio de finalidade do ato presidencial de nomeação do diretor
da Polícia Federal, em inobservância aos princípios da
impessoalidade, da moralidade e do interesse público".
O
ministro ponderou que “o presidencialismo garante amplos poderes para o
presidente, mas exige o cumprimento de princípios constitucionais e da
legalidade dos atos.”.
Por fim, o magistrado disse que, "Diante de
todo o exposto, nos termos do artigo 7º, inciso III da Lei 12.016/2016, DEFIRO
A MEDIDA LIMINAR para suspender a eficácia do Decreto de 27/4/2020 (DOU de
28/4/2020, Seção 2, p. 1) no que se refere à nomeação e posse de Alexandre
Ramagem Rodrigues para o cargo de Diretor-Geral da Polícia Federal.".
O mencionado inciso III estabelece, verbis: “que
se suspenda o ato que deu motivo ao pedido, quando houver fundamento relevante
e do ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida, caso seja finalmente
deferida, (...)”.
Causa perplexidade para a sociedade que o presidente
do país tenha seu ato questionado na Excelsa Corte de Justiça do país, por
evidenciar possível imoralidade e desvio do interesse público, conforme
sentencia o despacho decisório, obviamente em fase preliminar.
É evidente que compete ao mandatário provar o
acerto do ato impugnado, mas, a maneira como ficou exposto para a opinião pública,
a nomeação que acaba de ser suspensa tem todos os ingredientes que reforçam o entendimento
sobre a ingenuidade e a teimosia por parte de quem quis que seu ato fosse às barras
da Justiça, à vista da sua visível incompatibilidade com a decência, a
moralidade e os bons costumes da administração pública, entre outros princípios
elementares, por envolver a nomeação que tem as características visando ao
atingimento de finalidade precípua bem apropriada ao capricho intencional.
Trata-se de nomeação que se efetivou depois do
episódio da exoneração do ministro da Justiça, que não concordava com ela, por
pressentir que o ato serviria para o atendimento de satisfação de interesse pessoal
do presidente, que precisava de pessoa na Polícia Federal para ele ter acesso a
informações produzidas pelo órgão, como relatórios sigilosos, que até então não
seria possível junto à direção afastada, dando a entender que somente a pessoa
nomeada seria capaz de prestar esse serviço especial a ele.
Esse fato pode caracterizar verdadeiro abuso de
autoridade, pela tentativa de se mudar, de certa forma, a operacionalidade do
órgão, que funcionava com notória eficiência, sem qualquer anormalidade,
simplesmente para que fosse possível a obtenção de elementos do interesse do
presidente, obviamente com a nova direção.
Não fosse o sentido essencial da promessa de
campanha eleitoral, de que se pretendia a moralização da administração do país,
em todos os sentidos, esse vergonhoso e inaceitável ato presidencial nem teria
sido notado pela sociedade, porque todos os governos sem princípios fazem procedimentos
semelhantes e nem sempre são sentidos, mas, nessas condições, realmente é
absolutamente inadmissível que o órgão responsável pela condução de assuntos da
maior relevância nacional, inclusive com a incumbência das principais investigações
sobre atos irregulares contra a administração pública, possa ser transformado
em veículo de manipulação com viés político, com a possibilidade de o seu dirigente-mor
passar a ser facilitador de acesso às suas informações, em forma de relatórios
sigilosos, mesmo que seja ao presidente da República, à vista da seriedade
quanto ao sigilo que é essencial ao êxito de seus trabalhos.
É lamentável que o presidente do país seja insensível
sobre questão tão elementar, não percebendo que a nomeação de pessoa que tem vínculo
com alguém da família dele e com ele próprio, já que ela foi seu segurança na
campanha eleitoral, caracteriza absoluta falta de ética na administração pública,
independentemente da capacidade profissional, porque é preciso, sobretudo, sopesar
a necessidade da observância dos princípios da moralidade e da impessoalidade, em
casos que tais, como forma de satisfação do interesse público.
Nos países sérios e evoluídos, em termos de administração
pública, seus presidentes jamais insinuariam o aparelhamento de órgão do Estado,
com a nomeação de pessoas da sua confiança, de modo que a instituição passasse
a atuar em condições de satisfazer interesses pessoais e visivelmente ilegais, a
exemplo da obtenção de relatórios confidenciais, na maneira preconizada pelo
presidente tupiniquim, segundo informação do ex-ministro da Justiça, que é confirmada pelo próprio ato de nomeação, porque
a pessoa indicada para o cargo é a mesma que seria empurrada goela abaixo, que não
foi aceita pelo ex-juiz.
É evidente que precisa se entender que a decisão em
causa tem caráter preliminar, diante da possibilidade de recurso ao Supremo,
embora não reste a menor dúvida de que o servidor envolvido tenha vínculo de amizade
com família do mandatário e que os últimos fatos vindos à baila mostram a
inquietação do presidente em querer ter acesso a informações produzidas pela
Polícia Federal, o que somente seria possível com a colocação de pessoa da inteira
confiança dele.
Não obstante, na linha do entendimento da Justiça, é
preciso ficar claro que os brasileiros não concordam com o desvio de finalidade,
na forma como feita por meio do ato impugnado, à vista do sentimento maior de moralização
da administração do país, que não é mais aceitável qualquer deslize, por menor
que ele seja, porque o somatório de pequenos descuidos contribui para a
esculhambação sem conserto.
Urge que a sociedade, consciente sobre a sua
responsabilidade cívica e patriótica, também repudie o ato impugnado pela
Justiça, como demonstração de que o presidente da República precisa primar pela
devida observância dos princípios republicano e democrático, com embargo de
outras cogitações, por mais relevantes que sejam, ante a supremacia do
interesse público.
Brasília,
em 29 de abril de 2020