quinta-feira, 16 de abril de 2020

A canseira do coronavírus?


Desta feita, o ministro da Saúde foi reclamar diretamente a uma revista e não poupou palavras para relatar sobre o degaste que tem vivido, nos últimos meses, com o seu relacionamento com o presidente da República, em função das medidas que ele precisa tomar no combate ao novo coronavírus. 
Segundo o ministro, já são "60 dias tendo de medir palavras. Você conversa hoje, a pessoa entende, diz que concorda, depois muda de ideia e fala tudo diferente. Você vai, conversa, parece que está tudo acertado e, em seguida, o camarada muda o discurso de novo. Já chega, né? Já ajudamos bastante".  
O ministro disse que não há chance de ficar no governo, porque "São 60 dias nessa batalha. Isso cansa”, tendo garantido que fica no cargo "até encontrarem uma pessoa para assumir meu lugar".
O ministro também fez questão de alertar sobre o desafio de quem vier a ocupar o seu lugar, tendo afirmado que "Não sei, mas acho que o vírus se impõe. A população se impõe. O vírus não negocia com ninguém. Não negociou com o (Donald) Trump, não vai negociar com nenhum governo". 
Como se pode perceber, com muita clareza, a entrevista em apreço tem aquele tom de nítido desprezo ao presidente da República, quando ele conduz a conversa afirmando a sua superioridade sobre ele, o qualificando como sendo despersonificado e despreparado, alegando que eles acertavam providências, mas, logo em seguida, o chefe mudava de ideia e dizia para fazer algo completamente diferente do acordado, ou seja, “o camarada muda o discurso de novo”.
Essa forma de tratamento atribuída ao presidente do país bem demonstra o quanto o ministro faz questão de acentuar o seu desprezo à autoridade presidencial, que, aliás, a propósito, tem todo direito de decidir da forma que bem entender e mudar de ideia quantas vezes quiser, posto que ele, quer queira, quer não, foi eleito para comandar as políticas públicas, que podem estar certas ou erradas, a dependerem de avaliação sobre os seus resultados, e, quanto a isso, o ministro só tem duas alternativas: aceitar caladinho as ordens e as múltiplas ideias subsequentes do comandante ou não aceitá-las, entregando o cargo, sem nenhum direito de criticá-lo, notadamente porque não é da competência de subordinado senão ponderar e sugerir a melhor maneira para as políticas serem realizadas pelo governo.
Não obstante, o ministro não teve dignidade para reclamar das mudanças de ideias absurdas do presidente, quando era mantido no cargo sem o efeito do terrível desgaste, apenas o fazendo agora, como forma de aproveitar o momento para tentar se transformar em vítima da visível incompetência palaciana, ao alegar que foram 60 dias medindo palavras, quando ele, ao contrário do que diz, em várias entrevistas não pensou muito nem mediu as palavras para disparar torpedos contra o seu chefe, a exemplo das palavras duras ditas no Fantástico, com endereço claro e nominal ao presidente.
Na ocasião, o ministro disse que o povo não sabe a quem ouve, se a ele ou o seu chefe, evidenciando aí atestado público de dissintonia entre ambos.
Não há a menor dúvida de que o ministro demonstra desconhecer o verbete “humildade”, que cabe normalmente no vocabulário das pessoas inteligentes, que parece não ser o caso dele, ao se deixar que a vaidade tomasse conta de seus sentimentos, depois de perceber que seu trabalho à frente do Ministério da Saúde o havia elevado junto à opinião pública bem mais do que o dobro da preferência da população, frente ao próprio presidente da República, chegando a ter mais de 70% da simpatia dos entrevistados, fato este que pode ter provocado reação de extrema anormalidade no ministro, para quem deveria apenas ter continuado realizando seu trabalho normalmente, considerado de nível aceitável, nas condições sabidamente precárias da saúde pública brasileira.
Além de se sentir a maior autoridade sobre saúde pública, por terem as suas ideias contrariadas permanentemente por quem tem a direção geral da nação, o ministro ainda tem a petulância de afirmar que “Já ajudamos bastante”, dando a entender que ele e a sua equipe fizeram além do que devia ter sido feito, tendo realizado trabalho excepcional.
          Fica evidente que, mais uma vez, o ministro comete a gravíssima indignidade de declarar absurdo como esse, porque o trabalho dele não tem nada de ajuda, mas sim do estrito cumprimento do dever funcional, como todo servidor público que é contratado ou nomeado precisamente para executar, com competência e eficiência, as funções para as quais ele se compromete a realizar perante à sociedade e que, para tanto, ele é devidamente remunerado, o que compreende objetivamente que não se trata de ajuda coisa nenhuma, mas sim da efetividade do dever de bem realizar os serviços de obrigação do Estado, que seriam feitos senão por ele, mas por outro servidor do mesmo nível, quiçá sem nenhuma arrogância e ainda com mais competência e eficiência do que vem sendo realizados até o momento, à vista da má vontade de quem demonstra extrema onipotência.
É óbvio que o vírus já demonstrou que realmente tem o poder de se impor, conforme alegado pelo ministro, mas é preciso muita determinação, além de entrega ao compromisso público, para enfrentá-lo com todas as forças, porque somente assim ele será exterminado, sem necessidade de negociação, mas sim com a força da competência que existe nos brasileiros que amam o que fazem, sem visarem outros projetos de vida, nem mesmo políticos.
Realmente, senhor ministro da Saúde, com a presente entrevista, fica patente que não somente Vossa Excelência se cansou com a fatídica maratona imposta pelo terrível coronavírus, mas também os brasileiros, que não vêm o momento da sua saída e da entrada de outro profissional médico, com as baterias superacumuladas de energia, que demonstre capacidade, tolerância, inteligência e disposição para cuidar, com o maior empenho possível, do monstruoso combate à presente pandemia, tendo a humildade de compreender que a nítida incompetência administrativa se supera facilmente quando está em jogo a causa maior dos brasileiros, consistente na preservação da sua vida, que vale qualquer sacrifício, a despeito de quaisquer opiniões, mesmo que estapafúrdias, vindas de onde vierem, porque a história vai contar apenas a síntese do profícuo trabalho em benefício da população.
Brasília, em 16 de abril de 2020

Nenhum comentário:

Postar um comentário