terça-feira, 14 de abril de 2020

O insubstituível?


Comenta-se, nos bastidores palacianos que o ministro da Saúde, nesse noticiário sobre a sua possível saída do governo, exatamente por desentendimento de opiniões, teria questionado ao presidente da República quanto aos motivos pelos quais ele ainda não havia sido exonerado do cargo, a despeito de uma série de discussões nada republicanas entre ambos, que não condizem com o relacionamento respeitoso, civilizado e harmoniosa que precisa existir para a eficiência da administração do país.  
Ao contrário do relacionamento de alto nível e racionalizado entre superiores membros do governo, a todo instante surgem mensagens que não condizem exatamente com os bons propósitos de governo que precisa conseguir mostrar competência e eficiência, como estratégia política para a superação dos graves  problemas, principalmente na área de saúde, que tem sido o calcanhar de Aquiles da atual gestão, em face da pandemia do coronavírus.
Não se pode negar que a evidência da deterioração da situação pertinente à gestão da crise na condução das políticas de saúde pública é extremamente prejudicial à obtenção dos melhores resultados de gestão, exatamente porque a inexistência de diálogo entre comandante e subordinado deixa de haver coordenação e sintonia quanto à execução dos trabalhos pertinentes, que ficam a cargo do comandado, sem a supervisão daquele que é o responsável principal pela satisfação das necessidades públicas.
Na verdade, no caso em comento, até que o comandante tem sido enfático na defesa seus posicionamentos, quando entende que eles são os melhores para os brasileiros, a exemplo da liberação da hidroxicloroquina no tratamento do Covid-19 e da implantação do isolamento chamado vertical, onde se libera a população para o exercício das atividades comerciais, escolares, industriais etc., apenas promovendo o confinamento de idosos e pessoas possuidoras de doenças que precisam ser protegidas do coronavírus.
Ao contrário, no ministério responsável pela execução das políticas de saúde pública, prevalece outra linguagem completamente antagônica à da pretendida pelo presidente do país, que descarta o uso daquele medicamento e se mantém firme no isolamento social pleno, à vista de entendimentos com base em normas científicas, segundo justificativa do titular da pasta.
Não há a menor dúvida de que existem duas linhas de ações no mesmo governo, que apenas vem sendo executada aquela eleita pelo ministro da Saúde, por haver nela, segundo o seu assessoramento, muito mais probabilidade de sucesso, em termos de resultados satisfatórios para a saúde da população.
Ao contrário da política em execução, o presidente do país tem sido apenas figura decorativa do seu governo, que não tem autonomia de comando quanto às políticas que estão sendo adotadas em benefício do povo, ou seja, qualquer governo com o mínimo de organização administrativa, precisa falar, com absoluta clareza, a mesma língua na execução das políticas públicas, mas não é o caso da atual gestão, no que se refere à saúde.
Se a mensagem do presidente do país não prevalece é, com certeza, porque ele não tem absoluta convicção de que a sua posição é a melhor que se adeque aos interesses da população e, por isso mesmo, precisaria ser, necessariamente, implantada no país que ele comanda e se responsabiliza por seus atos, mas, não é assim que funciona na área da saúde pública brasileira, onde impera somente o entendimento do titular da pasta, que é o correto, desde que ela estivesse também em sintonia com o sentimento do presidente do país.
Agora, a partir do momento em que prevalecem as políticas concebidas pela ministro, que ainda vem criticando publicamente a pessoa do presidente do país, inclusive mandando recados inapropriados e desrespeitosos para ele, fica muito nítido que o comandante do governo foi desmoralizado pelo ministro,  perdendo completamente a credibilidade.
Além disso, o mandatário mostra infinita fragilidade, por não ter coragem para exonerar do cargo pessoa que conseguiu subverter a ordem natural da administração pública, quando é normal que o comandante diga o que precisa ser feito e o subordinado apenas bate continência e executa fielmente a determinação recebida.
Aqui não se discute o mérito sobre capacidade e eficiência, mas sim a notória quebra da dignidade da maior autoridade da República, que demonstrou não ter as necessárias sensibilidade e inteligência para solucionar grave crise interna do seu governo, que é da maior importância para a nação, porque ela jamais deveria ter alcançado o ápice como se encontra, em que um ministro se acha no direito de desafiar o presidente da República, a ponto de ficar nas entrelinhas o recado hipotético, segundo o qual: “se o senhor for macho, me exonere”, dando a impressão de que ele quer que aconteça exatamente assim, para quê?
Pode ser para potencializar a desmoralização do presidente da República, se ele nada fizer, que se mostra cada vez mais condescendente com a petulância de quem se acha o todo-poderoso no governo, imaginando que somente ele poderia ter implantado as políticas de combate ao coronavírus e que a sua saída será a total derrocada da saúde pública.   
Também pode ser para funcionar como jogada de marketing político, como maneira estratégica para catapultá-lo a alguma importante candidatura, no futuro, aproveitando o auge da sua fama, por ter encarado, sem medo, o presidente do país, a quem poderá, se for o caso, ser atribuída a culpa pelo que possa acontecer doravante, com a sua saída, evidentemente a depender da capacidade de reação do presidente, em colocar na pasta pessoa qualificada e competente.
Enfim, patenteada a cristalina e plena desmoralização do presidente da República, nesse episódio polêmico, por parte de subordinado que deveria ter o mínimo de juízo e consciência para entender que quem realmente manda no país e que ao ministro, mesmo certo de seus propósitos, resta ter a dignidade, como cidadão, de não ter polemizado em público com o seu chefe, e, agora, como profissional respeitável, a sabedoria de entregar o cargo, com as devidas desculpas, em razão do seu atrevimento de ter imaginado que era o suprassumo insubstituível do governo.
Diante da difícil crise institucional que perturba a ordem e os trabalhos no âmbito do governo, que contou com enorme contribuição do Palácio do Planalto, compete ao presidente da República ter o máximo de serenidade para se recompor com o restabelecimento da sua autoridade, contando com o melhor assessoramento especializado da saúde pública do país, e trocar o ministro da Saúde, aproveitando para estabelecer políticas competentes e eficientes, para serem executadas a uma só linguagem, em conformidade com as melhores orientações sobre o combate ao coronavírus, encerrando em definitivo esse triste capítulo da história republicana.
Brasília, em 14 de abril de 2020

Nenhum comentário:

Postar um comentário