A
imprensa brasileira vem noticiando que um dos filhos do presidente da República
assumiu, em definitivo, o principal cargo referente às comunicações do governo
federal, sem ter qualquer vinculação com o serviço público, estando trabalhando
de maneira graciosa, em condições nada republicana.
À
toda evidência, essa situação absurda e esdrúxula vem causando enorme incômodo
a partidos e políticos da oposição, conforme demonstrado em ações práticas e
efetivas, consistentes na impetração de recursos na Justiça Federal, solicitado
que o mencionado cidadão seja proibido de ocupar qualquer gabinete no Palácio
do Planalto, além de determinar que ele não pratique, mesmo que informalmente,
qualquer ato ou política próprios do governo.
Um
dos partidos aponta as suspeitas de que, mesmo sem cargo no Executivo, o
vereador licenciado do Rio de Janeiro tem orientado não somente a comunicação
digital do governo como pronunciamentos e declarações do próprio presidente do
país, dando como exemplo as manifestações dele contra o isolamento social em
combate à pandemia do novo coronavírus.
A
aludida agremiação alegou, na citada petição, ipsis litteris: “Ao
desempenhar ilegalmente atribuições na Presidência da República, cometeu, em
tese, crime de usurpação de função pública”.
O
partido solicita ainda à Justiça Federal que, em caso de decisão favorável ao
recurso, a sentença pertinente seja remetida à Câmara dos Vereadores do Rio do
Janeiro, com vistas às medidas que possam levar à cassação do mandato do citado
político.
Mesmo
que o parlamentar tenha se afastado do cargo de vereador da cidade que já ostentou
o charmoso título de Maravilhosa, parece muito estranho que alguém se eleja
para o exercício de determinado cargo público e se proponha a exercer, de forma
absolutamente irregular, diante da falta de vinculação oficial, outro cargo
completamente sem o devido amparo legal, ou ainda pior, em contrariedade a
dispositivo do Código Penal Brasileiro.
É
consabido que configura prática de delito contra a administração pública, na
forma prevista no art. 328 do Código Penal, a pessoa que executa ato para o
qual não tenha sido nomeado, que pode ser o caso do filho do presidente, que
tem gabinete dentro do Palácio do Planalto, sem competência legal para tanto,
eis que ele não foi nomeado para exercer qualquer função em nome do serviço público.
O
citado art. 328 tem o seguinte teor: “Usurpar o exercício de função pública.”,
por indivíduo sem qualquer vinculação com os quadros do serviço público.
O
disposto nesse mesmo artigo estipula que quem for enquadrado nesse crime está
sujeito à reclusão de três meses a dois anos.
O
exato sentido de usurpação condiz com a situação em que o particular finge
possuir qualificação de servidor público, investido de poderes inexistentes,
para o fim da prática de atos pertinentes ao poder público, que pode perfeitamente
ser o caso desse cidadão, que certamente ele não se afastaria do relevante
cargo de vereador para ficar à disposição da Presidência da República, conforme
comprovado pela imprensa escrita, somente para mostrar a sua elegante simpatia.
A
verdade é que a maior culpa não pode ser atribuída somente ao ingênuo usurpador,
mas sim da parte de quem permite que, em pleno século XXI, com os avanços da
modernidade da administração científica, essa prática ridiculamente abominável,
por ser irregular e inaceitável, se concretize à luz do dia, diante da nação
desinformada do que realmente isso significa, sob a lupa dos princípios da transparência,
moralidade e legalidade.
Isso
só demonstra incompetência e falta de experiência gerencial, porque todo gestor
público precisa se cuidar para que seus atos estejam, no mínimo, revestidos da legalidade,
evitando que absurdo dessa natureza fique exposto à visão pública, como se
fosse algo comum e normal na gestão pública, quando se trata de ato
recriminável.
O
mesmo vereador filho presidencial incumbido, informal e indevidamente, pela
estratégia digital do pai, mas deveria ser do governo, se nomeado para tanto, atacou
o vice-presidente da República em postagem no Twitter, nesta sexta-feira, por
meio de forte e grave insinuação de que ele conspira para derrubar o governo do
seu pai.
Esse
fato tem o condão de pôr querosene na fogueira com temperatura prestes a se
tornar fora de controle, cujo incêndio pode se alastrar perigosamente no âmbito
militar, que tem passado por situação bastante tensa dentro da sua ala no
governo, por não ter conseguido contornar os sucessivos e gigantescos conflitos
entre o presidente, os governadores e seu próprio ministro da Saúde, no que
concerne à gestão da enorme crise causada pelo novo coronavírus.
Ou
seja, além de se encontrar desempenhando função irregular, por não ter sido
designado oficialmente, dando a entender que há algo mais do que estranho nisso,
o filho do presidente ainda parte para a briga direta com membros importantes do
Executivo, o que bem evidencia que o seu DNA paternal, nada conciliador e
ponderado, só contribui para elevar os atritos no âmbito do governo, conforme
mostram os fatos.
Não
à toa que os resultados de pesquisas de opinião pública apontam para enormes
dificuldades para o presidente conquistar a popularidade entre os brasileiros,
à vista justamente da visível falta de sensibilidade e competência mostrada
seguidamente por ele.
Na
verdade, o presidente do país já teve bastante tempo para aprender minimamente que
administrar o país com as grandezas continentais do Brasil não tem mistério nem
dificuldade, porquanto é preciso apenas boa e generosa pitada de competência,
bom senso, racionalidade e inteligência, evitando a todo custo se desgastar em
discussão cujo assunto precisa ser analisado e resolvido, essencialmente, por
especialistas e entendidos por suas experiências nas respectivas áreas.
O
presidente brasileiro precisa somente confiar o desempenho das principais e
importantes funções públicas a quem estiver legalmente habilitado para tanto, não
permitindo, jamais, que familiares se intrometam no seu governo, porque isso só
afiança e atesta completa e cabalmente incapacidade para administrar o país, à
vista de seus próprios atos, que são, em grande maioria, desaprovados pelos
brasileiros.
O
governo cônscio da sua obrigação primordial de zelar pelo elevado padrão de
moralidade e legalidade da gestão pública, teria cuidado para se evitar a
suscitação de questões como essa envolvendo o seu filho, notadamente porque ele
é absolutamente prescindível, salvo se o mandatário quiser exatamente que a sua
gestão esteja permanentemente cercada de polêmicas, como forma de desviar o
foco da imprensa para escândalos que são mais atraentes do que a ansiada eficiência
da administração do país.
Urge
que os brasileiros, no âmbito da sua consciência cívica e republicana,
manifestem-se em repúdio a atos da administração pública sem o devido amparo
legal e exijam do mandatário máximo do país que se esforce quanto à fiel
observância ao compromisso de posse, acerca da necessidade de ser seguida a
Constituição Federal e a legislação pátrias.
Brasília,
em 4 de abril de 2020
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