quarta-feira, 19 de maio de 2021

Constrangimento?

 

O Supremo Tribunal Federal concedeu habeas corpus ao ex-ministro da Saúde, para que ele não responda perguntas que possam incriminá-lo nos processos em tramitação na Justiça, sob suspeita de omissão por parte dele.

O general vai enfrentar a CPI da Pandemia, tendo o direito de ficar em silêncio caso considere que alguma resposta durante o depoimento pode contribuir para incriminá-lo, tendo recebido a generosa proteção do Supremo, no sentido de que ele também não poderá ser alvo de reprimendas e ameaças de prisão em flagrante, no caso da acusação de prestar falso testemunho. 

Como não poderia ser diferente, logo surgiram ironias nas redes sociais, muitas afirmando que o general recorreu ao Supremo para buscar proteção na lei para não ser “torturado” ou “triturado” pela CPI, em referência mais propriamente ao regime militar.

Embora se imagine que o habeas corpus possa trazer benefício para o depoente, o fato em si não faz o menor sentido, porque ele, em ficar calado, poderá ou deixará de se defender, podendo assumir culpa pelo que for formulado em termos de acusação sobre práticas de atos comprometedores, o que seria oportunidade para esclarecer prontamente qualquer dúvida.

É bem possível que o general esteja certo ao recorrer à proteção do Supremo, mas fica a impressão de que ele, com isso, só demonstra insegurança sobre a correção da sua gestão, deixando muito claro que ela não tenha sido tão competente para os padrões recomendados para o combate à pandemia, posto que, ao contrário, não precisaria de se proteger, em termos jurídicos.

Caso ele tivesse seguro sobre o acerto das medidas praticadas na sua gestão, não precisaria temer por absolutamente nada, porque seus atos já falariam bem dele e ele tinha certeza antecipada de que não precisaria esconder nada, ficando calado, porque, na administração pública, o princípio é a transparência de tudo.

Em outras palavras, quem não deve, não teme, assim diz o ditado popular, mas o general demonstrou, ao pedir segurança jurídica sob a premissa de puder ser preso, ao se imaginar que ele realmente correria sério risco de ser preso e isso, se efetivando, seria muito grave e por demais vergonhoso, talvez não tanto para ele, que teve excelente oportunidade para prestar competentes serviços à frente ao Ministério da Saúde, mas para o Exército, a sua corporação, ao ver oficial general na prisão, por decorrência de incompetência na gestão pública civil.

          Agora, não pode haver nada mais deprimente e constrangedor do que o ex-ministro se esquivar de responder perguntas da CPI sobre seus atos no comando do mais importante órgão que seria o Ministério da Saúde, sob a incumbência de cuidar da saúde nesse processo da pandemia, mas os esclarecimentos importantes vão ficar sem resposta, deixando em eternas dúvidas importantes questões que têm o interesse da sociedade, que foi bastante atingida exatamente em razão das medidas demandadas por esse órgão, que tem obrigação constitucional de deixar os atos e fatos às claras, à luz do princípio da transparência, de suma relevância nos países sérios e civilizados, em termo políticos, administrativos e democráticos. 

À toda evidência, o benefício do habeas corpus funciona como claro retrocesso, por beneficiar a omissão da verdade e a clareza sobre os fatos, prejudicando diretamente o interesse público, uma vez que os esclarecimentos sobre as questões suscitadas podem contribuir para a adoção  de medidas capazes de se evitar falhas da administração pública e até mesmo contribuir para salvar vidas.

A verdade é que a proteção concedia ao general ex-ministro faz parte do regime democrático, o que vale dizer que foi assegurado a ele o direito de ficar calado, nos assuntos referentes à pessoa dele, porque ele não pode silenciar quando o assunto diz respeito a terceiros, mas essa medida confronta-se flagrantemente contra o famoso princípio dito costumeiramente pelo presidente da República, que não se cansa de pronunciar passagem bíblica de que “...e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará.” (João 8:32).

Enfim, espera-se que o ex-ministro se apresente diante da CPI imbuído do espírito de verdadeiro militar corajoso, com a fibra do homem de Caxias, tendo capacidade e discernimento para somente dizer a verdade sobre os fatos ocorridos sob a sua gestão no Ministério da Saúde, sob pena de ficar marcado para sempre na história como o general que se transformou em soldado medroso, acovardado, quando ele precisa dizer tudo sobre a verdade que jamais deveria faltar ao brasileiro, em especial neste momento de gravíssima pandemia do coronavírus, cujo combate foi comandado por ele.

Brasília, em 19 de maio de 2021

Nenhum comentário:

Postar um comentário