domingo, 2 de maio de 2021

E agora, fazer o quê?

          No dia de hoje, milhares de manifestantes bolsonaristas saíram às ruas, sendo que muitos dos quais foram ao gramado em frente ao Congresso Nacional com faixas pedindo intervenção militar.

Uma das faixas continha os seguintes dizeres “PELO AMOR DE DEUS, SENHOR PRESIDENTE JAIR BOLSONARO! QUEREMOS QUE DECRETE ESTADO DE SÍTIO POR CALAMIDADE PÚBLICA!”.

Em vídeo publicado hoje pelo canal “Cafezinho com Pimenta”, no Youtube, os manifestantes na Esplanada carregam faixas com as frases: “Intervenção militar com Bolsonaro no poder” e “Presidente Bolsonaro acione as Forças Armadas (FFAA)”.

Com o pretexto do Dia do Trabalho, os manifestantes gritam “Bolsonaro, eu autorizo”, em referência à fala do presidente do país, que, no dia 14 de abril, disse que esperava “um sinal do povo” para agir.

Entre os grupos de extrema direita, a fala do presidente foi interpretada como um pedido de autorização para endurecer a relação com os demais Poderes.

A propósito, o mencionado Estado de Sítio, previsto no art. 137 da Constituição Federal, pode ser acionado em três hipóteses, em situações diferentes, a saber: a) comoção grave de repercussão nacional; b) fatos que comprovem a ineficácia de medida tomada durante o Estado de Defesa; e c) declaração de estado de guerra ou resposta a agressão armada estrangeira.

O Estado de Sítio é decretado pelo presidente da República, após ouvir os Conselhos da República e da Defesa, havendo necessidade do relato das justificativas para tanto ao Congresso Nacional, que deve decidir por maioria absoluta sobre a autorização para o implementá-lo, podendo impedi-lo, caso não haja o consentimento.

Ou seja, não tem como se adotar medida de exceção, no presente momento, exatamente por falta de motivação específica e qualquer ato que o presidente adotar foge do figurino constitucional e, se o fizer de qualquer maneira, o presidente estará fadado a se passar por ditador, porque não tem como se alegar que o fez por vontade da população, porque isso não tem o menor sentido, exatamente porque o ato administrativo precisa estar jungido à legalidade e esta somente pode servir de amparo para o que for licito e justificável perante o interesse público.

Por seu turno, a toda evidência, as manifestações que pedem golpe militar no país são absolutamente inconstitucionais e contrárias aos princípios democrático e republicano, além de serem passíveis de objeto de Inquérito dos Atos Antidemocráticos aberto no ano passado por decisão do Supremo Tribunal Federal, a pedido da Procuradoria Geral da República.

É preciso frisar que, no Estado Democrático de Direito, é normal que as pessoas se reúnam em movimento de protesto, por diversas maneiras, mas, especial, para a demonstração da sua insatisfação, evidentemente por algum motivo que esteja em desarmonia com os direitos de cidadania, por medida agressiva contra as liberdades ou outros fatos que não se refiram à vontade da implantação de atos de exceção.

O presidente da República precisa se conscientizar de que ele, como estadista, principal autoridade da nação, não pode liderar, como fez, movimento dessa ordem, exatamente porque foge da sua competência institucional.

Caso o presidente do país precise de apoio do povo para decidir sobre matéria de super relevância nacional, o único caminho constitucional deverá ser feito por meio de plebiscito, ouvindo-se o povo, em termos de assunto devidamente justificado e às claras, como precisa agir os governos evoluídos e modernos, porque é precisamente assim que agem os presidentes cônscios sobre a sua competência funcional, em estrita consonância com os princípios da competência, da transparência e da responsabilidade.

Na verdade, o que o presidente do país fez, ao implorar o apoio do povo, tem todas as características de atos irresponsáveis e ditatoriais, porque eles não encontram amparo na Constituição e somente têm assento na cabeça fora dos parâmetros da governabilidade responsável e competente, centrada nos princípios da legalidade e do compromisso com a seriedade imperante na gestão pública.

E agora, o que vai precisamente fazer o presidente da República, depois de receber maciço apoio popular, exatamente de pessoas que têm o mesmo pensamento de desequilíbrio e irresponsabilidade quanto ao respeito aos princípios constitucionais da legitimidade, da competência e responsabilidade?

Certamente que qualquer ato que o presidente do país tomar, no presente momento, não tem respaldo na Constituição Federal, precisamente diante da inexistência de fato concreto a motivá-lo e justificá-lo, salvo as insipientes, tresloucadas e inconstitucionais manifestações das pessoas, implorando pela decretação de atos igualmente antidemocráticos e inconstitucionais, que somente poderiam partir de quem demonstra desconhecer a verdadeira atribuição do estadista consciente sobre a sua responsabilidade pelos destinos da nação, que precisa ser comandada sob a égide da segurança, da competência, da seriedade, da legalidade e da responsabilidade.

Mesmo que país esteja se passando por momento de instabilidade institucional, que não é o caso do Brasil, exatamente porque os poderes da República estão funcionando em situação de normalidade, o presidente da República deve se apresentar à nação com a autoridade que seu cargo impõe, procurando demonstrar equilíbrio e firmeza nos seus atos e jamais evidenciando qualquer forma de tensão como vem fazendo o mandatário brasileiro.

Espera-se que o presidente da República não se deixe influenciar pelos sentimentos de incompetência, insensatez, desequilíbrio, insegurança e irresponsabilidade, de modo que qualquer ato adotado com base nesses princípios poderá simplesmente levar à decretação do final do seu governo, que, no entendimento de muitos especialistas em política, ele ainda sequer teve início, exatamente diante de muitas medidas adotadas não se harmonizarem com as atribuições de verdadeiro estadista, a exemplo desse pedido de apoio para algo que o povo sequer tem conhecimento do que se trata.

De qualquer modo, se for de extrema necessidade, caso o presidente da República se digne a adotar ato com a intenção de solucionar alguma questão relevante de interesse da população, que a medida pertinente realmente seja revestida de inquestionável constitucionalidade, de modo a satisfazer plenamente a sua instituição, observados os princípios fundamentais do Estado Democrático de Direito.               

          Brasília, em 2 de maio de 2021

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