segunda-feira, 14 de junho de 2021

Descartar a máscara?

 

A intenção do presidente da República é de flexibilizar o uso da máscara facial contra a Covid-19, em consonância com o estilo desdenhoso dele, ao longo da pandemia do coronavírus, em que pese ela ainda ser amplamente recomendada por cientistas.    

A novidade presidencial acontece no dia em que o total de óbitos atingiu o patamar alarmante de 482.019, mas isso não impediu de o presidente do país afirmar que "Nosso ministro (da Saúde) vai ultimar um parecer visando a desobrigar o uso de máscara por parte daqueles que já tenham sido vacinados.”.

O presidente se mostra coerente com as suas atitudes públicas, posto que ele vem aparecendo em compromissos sem o uso da máscara, inclusive em aglomerações e viagens pelo Brasil, já tendo dado declarações questionando os benefícios do uso dela.

Em países onde o controle da doença atinge percentual de vacinados bem maior do que o Brasil, discutem-se o relaxamento do uso de máscaras para quem foi imunizado, mesmo sob críticas da comunidade científica, que ainda entende que há necessidade desse importante equipamento, diante da sua serventia preventiva da Covid-19.

Observa-se que o Centro de Controle de Doenças dos Estados Unidos da América anunciou, em abril, que pessoas com a vacinação completa podem deixar de usar máscaras na maioria dos lugares, à exceção da rede de transportes, hospitais e prisões, por exemplo.

Enquanto o governo britânico vem conduzindo estudos nesse sentido, com vistas à avaliação sobre a possível flexibilização de medidas preventivas contra a Covid-19, incluindo a exigência de máscaras.  

O diretor da Sociedade Brasileira de Infectologia afirmou que "Os Estados Unidos e a Europa começaram a discutir isso com baixos níveis de contágio, mortes e variantes circulantes. É outra realidade, absolutamente incomparável com o Brasil".  

Um epidemiologista professor da Universidade Federal do Maranhão disse que "Lá fora, a decisão foi tomada baseada na alta eficácia das vacinas, uma cobertura vacinal que já chegou a 50%, e a circulação viral baixa. Há um controle muito maior do que o nosso. No Brasil, a doença está solta. Não faz sentido do ponto de vista técnico".  

Por seu turno, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) afirmou, no último dia 9, que a pandemia no Brasil "se configura como de alto risco, com ligeira queda no número de óbitos, mas manutenção da transmissão do vírus e taxa de ocupação de leitos muito elevada na maioria dos Estados e capitais: ‘Vinte estados e o Distrito Federal, bem como 17 capitais, encontram-se com taxas de ocupação iguais ou superiores a 80%.’". 

No momento, há a observação de que a taxa de transmissão da Covid-19, no Brasil, teve ligeira queda, segundo a universidade Imperial College, estando em 0,99, vinda, há duas semanas, de 1,02.

Quando essa taxa é maior de 1, significa que o vírus está se espalhando de maneira exponencial, mas a pandemia só é considerada controlada quando o índice é mantido abaixo de 1, por algumas semanas, algo que não foi ainda atingido pelo Brasil, notando-se que ainda há vários Estados em situação crítica.

Um professor da Sociedade Brasileira de Infectologia esclareceu que "O Brasil tem particularmente hoje infecções por variantes. Elas representam de 85 a 90% das novas infecções".   

A pessoa que já teve Covid-19 e deixa de usar máscara, em cenário de circulação significativa do vírus e suas variantes, está sujeita à reinfecção, sendo potencial transmissora para outras pessoas, segundo afirmou um especialista. 

O diretor da Sociedade Brasileira de Infectologia afirmou que "A gente sabe que ter tido covid diminui a probabilidade, mas não elimina o risco de ter a doença de novo. E a gente já sabe que a variante P.1 é capaz de reinfectar quem já foi infectado. Existem estimativas de que no surto em Manaus do fim do ano, e início do atual, cerca de 30% das infecções com a P.1eram reinfecçõesTodo mundo que está infectado corre o risco de transmitir. E há os assintomáticos, que têm risco de menor de transmitir, mas podem transmitir". 

Médicos brasileiros entendem que as vacinas administradas no Brasil, em especial a CoronaVac, a mais numerosa no país, têm percentuais altos de proteção contra gravidade e mortalidade pela Covid-19.

Eles dizem que a margem de proteção contra a infecção é menor, o que vale dizer que, mesmo as pessoas vacinadas, há previsão de que número importante de pessoas ainda vá ter a doença, foto este que a desobrigação do uso da máscara seria imprudência. 

Um infectologista declarou que "Você tem uma parcela importante de vacinados que ainda pode se infectar e transmitir. Liberar a ausência de máscara para esses grupos vai facilitar muito a perpetuação da circulação viral, isso não vai acabar nunca. E tem também a questão de qual é a eficácia da vacina contra as variantes. Não tem a mínima chance dessa ser uma medida embasada cientificamente". 

Os especialistas acrescentam que, em alguns países, autoridades e cientistas estão começando a testar, no dia a dia, a validade da ideia de "imunidade coletiva", conhecida também como “imunidade de rebanho”, que consiste quando o número de pessoas com imunidade contra um patógeno chega a patamar segundo o entendimento que a doença é considerada controlada. 

Isso porque alguns países estão atingindo número considerável de pessoas vacinadas, em combinação com a baixa circulação do vírus, assim entendida como oportunidade experimental para a verificação da hipótese da imunidade coletiva, situação esta que o Brasil ainda não se enquadra, em termos médico-sanitários. 

Autoridades norte-americanas descartaram a ideia da criação de "passaporte de vacina", que seria espécie de prova de imunização de alguém, porque isso serviria de argumento para a alegação da violação da privacidade.

Na verdade, há o sentimento e até mesmo preocupação no sentido de que o eventual relaxamento do uso da máscara se transforme na ideia de liberação geral, evidentemente com extensão para as demais medidas preventivas contra a Covid-19. 

Ou seja, trata-se de medida com possível implicação de sério perigo, no Brasil, que ainda atravessa o longo vale dos martírios, em termos da incidência da doença, à vista de muitas mortes e hospitais se virando para o atendimento da demanda da doença.

Com isso,  ainda não é aconselhável, sob o prisma médico-sanitário, a liberação da máscara, que tem sido símbolo contra o vírus, ante a possível indevida e equivocada interpretação ou até mesmo sensação de plena liberdade de não se precisar se prevenir, porque nem máscara precisa mais, quando os acontecimentos conspiram justamente a mostrar a premência de todas as medidas preventivas, sob  pena de infecções continuadas. 

É preciso que a população não se iluda quanto à garantia de imunidade já adquirida, para se aderir à ideia infundada de se abandonar as máscaras ainda no epicentro das ocorrências de contaminação, em especial nos casos de aglomerações, ante os enormes riscos que ainda não foram afastados, senão na cabeça de quem nunca vislumbrou a existência perigosa da Covid-19.

O presidente do país disse que seu governo estuda desobrigar o uso de máscaras entre pessoas que já tiveram a infecção ou que já foram vacinadas, embora os fatores supracitados influenciariam em ambos os casos, o que significa que ele não tem a menor noção do crime que pode praticar, ante a implantação da dispensa do uso da máscara, quando o Brasil ainda não oferece a necessária e tranquila segurança para se garantir a eficácia das medidas pretendidas por ele.

Ou seja, o presidente do país pode até ter por base dados equivocados ou talvez precisamente seguindo situações próprias de outras nações com peculiaridades completamente diferentes do Brasil, cujos pressupostos estão bem distantes da situação brasileira, na certeza de que aqui ainda se convive intimamente com a doença à flor da pele, sem a menor sinalização do arrefecimento das medidas preventivas, salvo, repita-se, na cabeça de quem nunca se preocupou com a “gripezinha”.

Essa absurda e precipitada ideia de se descartar o uso da máscara, sem que tenha base minimamente científica, eis que ainda persistem os graves ingredientes da Covid-19, somente tem por fundamento estratégia política, no sentido de se tentar transmitir para a população que a doença se encontra sob controle, quando os resultados estatísticos ainda mostram altos índices de infecções e de mortes, fatos estes que melhor seria que somente se manifestassem sobre o coronavírus quem realmente demonstra ter preocupação com o combate à pandemia e a prevenção da vida dos brasileiros.

No estágio atual da Covid-19, o bom senso e a racionalidade recomendam que somente quem entende de medicina e sanitarismo deveria se manifestar, ficando terminantemente impedido de opinar sobre a doença pessoa leiga, que não tem competência médica para tratar do assunto, porque normalmente o seu entendimento sempre vai na direção contrária às práticas aplicáveis à espécie e contribuem para prejudicar o trabalho competente e responsável, sabendo que apenas este deve ser levado em consideração em grave crise da saúde pública, à vista de sua real importância para a preservação da vida dos brasileiros.  

Brasília, em 14 de junho de 2021

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