sábado, 12 de junho de 2021

Desrespeito aos princípios humanitários

 

O presidente da República voltou a dizer que as Forças Armadas poderão ir às ruas, pasmem, para “garantir a liberdade”, mas, ao contrário, não o farão para obrigar que as pessoas cumpram “toques de recolher”.

Em discurso, o presidente do país disse que “Tenho as Forças Armadas ao meu lado. Sou o chefe supremo delas. Jamais elas irão às ruas para mantê-los em casa. Poderão, sim, um dia ir às ruas para garantir a sua liberdade e seu bem maior, que é aquilo previsto pela Constituição”.

Frise-se que, há poucos dias, o mandatário brasileiro ingressou com mais uma ação no Supremo Tribunal Federal, para tentar rever o poder de Estados e municípios de adotar medidas para combate à epidemia de Covid-19 no país, mas a ação ainda não teve julgamento.

O presidente tem ameaçado editar decreto proibindo ações de controle da pandemia como o fechamento do comércio e a instituição de isolamento social, que ele chama de “toques de recolher”, mas, por enquanto, tem ficado apenas em intenção.

Como nesse caso, sempre que o presidente tem se referido a ações referentes ao combate à pandemia do coronavírus, invariavelmente é apenas no sentido contrário às medidas propriamente que poderiam se harmonizar para acabar com a doença, especialmente em sintonia com a incumbência constitucional que o obriga a ser cuidadoso na defesa da saúde e da vida dos brasileiros, algo que ele vem se empenhando até mesmo com exagerado interesse em se destacar com o autêntico vilão incentivador da disseminação da Covid-19, por exatamente pregar medidas antagônicas ao distanciamento do vírus, a exemplo de não usar máscara e mesmo assim se aglomerar com pessoas igualmente sem o uso dela, entre medidas censuráveis para o momento crítico da saúde dos brasileiros.

A verdade é que não à toa, já foi pregado e colado no presidente do país a deplorável cognominação de genocida, precisamente em razão do seu comportamento de pura rebeldia às medidas preventivas contra a Covid-19, que realmente elas não condizem com o mandatário do país com o mínimo de sensibilidade e amor aos princípios humanitários.

Salvo motivação especial, é incrivelmente inconcebível que o presidente do país fique martelando sempre o mesmo assunto que demonstra tão somente inutilidade para a solução de problema de saúde pública da maior gravidade, quando ele fica fazendo menção absolutamente desnecessária ao caso do emprego das Forças Armadas, que até poderia citar sim, mas para o fim de empregá-las em ações próprias ao combate da pandemia, como a mobilização para ajudar na vacinação ou outras medidas contrárias à disseminação do vírus, mas jamais no sentido de repressão, que refoge à sua finalidade institucional.

Vejam-se que o presidente do país fala em garantia da liberdade, com a maior naturalidade e banalidade, como se o país estivesse plenamente livre da pior desgraça do século, como se a pandemia do coronavírus nem existisse e que os brasileiros por igual estivessem imunes ao vírus e ainda no usufruto dos seus direitos normais da liberdade a que se refere a Constituição Federal.

As pessoas, inclusive as autoridades do país, precisam saber que os dispositivos da Constituição foram escritos para aplicação em tempos de paz, normalidade, inclusive no que diz respeito à saúde pública, contrariamente ao que acontece no presente momento, em que o Brasil se debate em verdadeiro estrado de guerra contra a gravíssima pandemia, que vem sendo ignorada exatamente por parte de autoridade da maior relevância, que deveria se conscientizar em sentido contrário do seu real comportamento de animosidade àquele que tentam tratá-la, em princípio, na forma da orientação emanada pelos órgãos especializados da saúde pública.

Não há desconhecer que a Constituição precisa sim ser respeitada e cumprida, inclusive e em especial, em situação de normalidade, o que não é o caso, mas o império do negativismo impede o reconhecimento da triste realidade do Brasil, onde o mandatário do país prefere comandá-lo como se nada estivesse acontecendo de gravíssimo, a ponto de criticar e censurar as autoridades que estão adotando as medidas preventivas consideradas necessárias, no âmbito da competência e da responsabilidade da incumbência obrigatória para todos os governantes conscientes sobre o verdadeiro valor da saúde e da vida dos brasileiros.

O governante com a relevância do presidente da nação, diante de situação da gravidade da Covid-19, seria extremamente elegante e simpático se tivesse compostura de estadista que demonstrasse o mínimo interesse sobre os assuntos relacionados com a pandemia, porque ela aflige fortemente até a alma da população, onde ele se empenhasse ao máximo para acabar com a incidência do vírus e ainda tivesse a iniciativa de acompanhar diretamente do fronte, do palco dos acontecimentos, procurando visitar os hospitais, dando apoio tanto aos doentes como aos profissionais da saúde, além de mostrar a sua preocupação com a desgraça dos brasileiros afetados pela pandemia, entre outras demonstrações de respeito aos princípios humanitários, porque isso faz parte do sentimento do verdadeiro homem público, que se valoriza em razão dos seus atos revestidos, sobretudo, da dignificação do ser humano.

A verdade é que o Brasil e, de consequência, os brasileiros, definitivamente, não merecem tratamento da pandemia do novo coronavírus, com resultados extremamente alarmantes, com a deplorável estatística registrando quase meio milhão de mortes, muitas das quais atribuídas à negligência, à vista de muitas atitudes consistentes na omissão, na má vontade, no desrespeito e negativismo, próprios da priorização da visível mediocridade como método preferencial para o tratamento do temível e letal vírus, à vista da preocupação, como no caso em comento, com medidas periféricas ao cerne da principal questão da saúde pública.

É preciso sim ter a consciência e a honestidade do reconhecimento de que essa deprimente situação de indiferença perdura exatamente porque os brasileiros, em boa parte, silenciam, se acomodam e praticamente dão aval aos envolvidos no comando das barbáries responsáveis pelo descaminho do combate à pandemia do novo coronavírus, tendo em vista que jamais tantas desgraças acontecem contra a saúde da população se houvesse demonstração, mínima que fosse, pela valorização da vida humana, como forma da sua salvação, compreendendo a priorização, em todos os sentidos, da guerra à Covid-19, com o empenho pleno do governo, que teria se encarregado de criar unidade de centralização nacional dos problemas, com a participação dos órgãos da federação, com a incumbência de somente cuidar das medidas próprias para a salvação de vidas humanas, com o embargo da politização, da mediocridade e de outras medidas incompatíveis com a realidade da crise instalada na saúde dos brasileiros.

A perplexidade chega ao ponto de ser relegada a questão principal da saúde pública para o mandatário do país voltar as suas atenções para a segurança pública, a exemplo do visto acima, como se ela tivesse alguma influência no combate à pandemia, fato este que bem demonstra o tamanho da irracionalidade administrativa, que é bem distanciada da necessidade dos cuidados prioritários a serem dados à saúde dos brasileiros, que vêm padecendo diante da mentalidade desfocada da gravidade da pandemia.    

Como os principais ingredientes, em momento de grave crise, deixaram de ser observados e empregados, conforme mostram os fatos, em que a vida da saúde se derrete em incompetência e irresponsabilidade e a autoridade principal do pais se preocupa em usar ou não as Forças Armadas, para a garantia da inexistente falta de liberdade da população, à vista de situação de excepcionalidade não capitulada na Constituição, felizmente pode-se considerar verdadeiro milagre a quantidade de mortes que poderia ser bem superior, ainda que alarmante, exatamente pela falta dos cuidados essenciais que deveriam ter sido adotados em caso onde o respeito aos princípios humanitários se impunha de maneira prioritária.                     

Brasília, em 12 de junho de 2021

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