sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Indecência em família

A Assembleia Legislativa do Estado do Maranhão aprovou, em regime de urgência, projeto de lei que já foi sancionado pela governadora, filha do senador e presidente do Senado Federal, tendo por finalidade a criação da Fundação da Memória Republicana Brasileira, entidade de natureza pública, que irá receber o acervo da Fundação José Sarney, alvo de extinção porque está sem recursos para a sua manutenção. Um prédio do século XVII, em São Luís, que havia sido doado à antiga fundação pelo Estado, será transferido para a nova entidade. A OAB (órgão seccional do Maranhão) decidiu impetrar Ação Direta de Inconstitucionalidade na Justiça, questionando a constitucionalidade da lei que, na prática, "estatiza" a Fundação José Sarney. Com essa norma legal, os cofres do Estado ficam obrigados a custear a manutenção da fundação, que terá o senador como patrono. Custa acreditar que um Estado, exemplo de “desenvolvimento” social e econômico, cuja história contemporânea vem seguidamente pontificando como marco de “moralidade e de honradez” de seus governantes, venha agora, de forma, promíscua tentar burlar o arcabouço jurídico para beneficiar a não menos digna família do ilustre senador e ex-presidente da República. A aludida medida governamental fere nitidamente os princípios da impessoalidade, da moralidade e da ética previstos na Constituição Federal e ainda acena para a inobservância do princípio fundamental da licitação, que é obrigatória em casos que tais. Na atualidade, isso configura privilégio indecente e reprovável pela sociedade, que não pode silenciar diante de abominável absurdo com seus dinheiros. É bastante lamentável que nem mesmo o estreito cerco que a mídia vem promovendo contra os casos recorrentes de corrupção e de maus tratos com o gerenciamento dos parcos recursos públicos seja suficientemente capaz de, ao menos, restringir a incidência de casos típicos das piores monarquias, como este aqui aludido, em que tudo ao rei e à plebe as bananas, se existirem. Urge que os governantes se conscientizem de que o patrimônio público pertence integralmente à sociedade brasileira e qualquer procedimento que não tenha por propósito servir-lhe como bem maior constitui ferimento aos princípios da administração pública e improbidade administrativa, passíveis de enquadramento de seus autores em crime de responsabilidade. Acorda, Brasil!

ANTONIO ADALMIR FERNANDES
 
Brasília, em 28 de outubro de 2011

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