domingo, 27 de abril de 2014

Afronta ao decoro?

Segundo um repórter da revista Época, as investigações levadas a efeito na Operação Lava-Jato da Polícia Federal revelaram importantes descobertas sobre os relacionamentos entre o doleiro que já se encontra preso, por seu envolvimento no esquema fraudulento com recursos públicos, e, em especial, o mundo político tupiniquim, a exemplo da afetuosa troca de mensagens eletrônicas entre ele e um deputado do SSD-BA. O repórter qualificou de muito romântico o texto das mensagens transcritas, literalmente, na conversação interceptada pela Política Federal, na qual um diz para o outro que “Você sabe que tenho um carinho por vc e é muito especial. Te amo.” e outro diz “Eu amo você também. Muitoooooooooo.” e o papo continua nesse embalo carregado de muito amor, mas deixa transparecer que, por trás desse affaire, também haveria negócios entre eles, tanto que a Polícia Federal fez registro no seu relatório das mensagens trocadas entre ambos, destacando esse colóquio de singular intimidade. Não há dúvida de que as mensagens são bastante comprometedoras dos princípios do decoro e da moralidade, por serem totalmente incompatíveis com as atividades públicas. É evidente que a vida privada dos homens públicos não compete à sociedade se imiscuir nela e muito menos censurá-las, sob qualquer pretexto, mas são inadmissíveis as declarações amorosas, sem meios termos, no contexto em que o doleiro se encontrava em plena campanha de cooptação de políticos para traficarem influência junto aos ministérios e às empresas estatais, para a facilitação do encaminhamento dos projetos do seu interesse. A exemplo do que já ocorreu, de forma vergonhosa, com o envolvimento de um deputado do PT, em que este partido nada fez contra o parlamentar, em termos de punição, apesar de ele ter assumido, entre outras irregularidades, que realmente teria feito uso de avião alugado, em cortesia, pelo doleiro para que o parlamentar pudesse passear em férias com a sua família, salvo pressão para que ele renunciasse ao cargo, é bem muito provável que o partido a que o deputado gentil e amoroso é filiado também não tenha a menor vontade nem interesse em puni-lo, devendo ficar evidenciado mais um indecoroso caso de tolerância com a impunidade e com a desmoralização dos princípios do decoro e da moralidade, que os homens públicos têm a obrigação constitucional de observar, inclusive sob pena de responder por seus atos afrontosos e indignos. É de causar tremenda indignação se verificar que o parlamentar, sem o menor escrúpulo, se entrega completamente aos braços do doleiro, sabidamente em operação extremamente suspeita, sob os rigores que o homem público tem o dever de observar, quanto aos princípios da administração pública, em especial o da moralidade, como forma de dignificar o relevante cargo de parlamentar, tão desacreditado nos últimos tempos, justamente em virtude da conduta desrespeitosa de um deputado que se comporta em flagrante afronta ao princípio do decoro que o parlamentar tem a obrigação de observar, incondicionalmente. Urge que haja reformulação dos sistemas político-administrativos, como mecanismo capaz de possibilitar a purificação das atividades políticas e permitir que os maus representantes do povo sejam imediatamente extirpados das funções públicas eletivas, que não merecem tamanha indignidade como essa e outras que estão surgindo com frequência nos últimos tempos, possivelmente diante da evidente complacência predominante no escrachado e condenável corporativismo, que existe em potencial para apequenar as atividades políticas, em total prejuízo dos interesses públicos, as quais deveriam existir tão somente para o fortalecimento dos princípios democráticos. Acorda, Brasil!
 
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
Brasília, em 26 de abril de 2014

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