quinta-feira, 15 de setembro de 2016

O dever da Suprema Corte


Existe o entendimento unânime entre os juristas de que a Constituição corre séria ameaça caso sejam mantidos os direitos políticos da ex-presidente da República petista, que deveria ter sido inabilitada, por força da penalidade do impeachment.
Não obstante, tudo indica, segundo opiniões colhidas aqui e ali, que o Supremo Tribunal Federal não pensa em alterar o status quo, ou seja, não há interesse em invalidar o estado de direito, embora seus integrantes considerem o fatiamento inconstitucional, o que representa incoerência jurídica.
Uma ministra do Supremo disse que “Alterar agora o que foi definido no Senado poderá colocar o país sob uma grande instabilidade política”.
Isso não é exatamente o que pensam os juristas brasileiros, que estão certos de que o erro protagonizado pelo Senado Federal, no caso da habilitação política da ex-presidente punida com o impeachment, pode ser corrigido pelo Supremo, sem o menor risco da ocorrência de instabilidade política.
Segundo um professor de direito administrativo da PUC-SP, “Está muito claro que o vício está na manutenção dos direitos políticos da ex-presidente e não na perda do mandato. E a decisão deve ser revista apenas onde existe o vício que está no quesito do fatiamento”.
A dúvida quanto ao exame da matéria pelo Supremo foi suscitada de vez com a decisão de uma ministra, indeferindo, in limine, as ações impetradas contra o processo do impeachment, no que tange ao fatiamento, com questionamento sobre a separação das votações da cassação e da perda dos direitos políticos.
É evidente que o mérito ainda será objeto de julgamento pelo plenário da corte, que não tem previsão quando isso possa ocorrer.
A preocupação é que a separação das punições capituladas no art. 52 e seu parágrafo único possa contribuir para a disseminação de entendimentos que levem à enxurrada de petições de servidores públicos, questionando seu enquadramento de punições de inabilitação para o exercício funções e cargos púbicos, com vistas ao restabelecimento de seus direitos políticos.
Ressalte-se que, no período de 2003 a julho deste ano, 4.962 servidores foram demitidos do serviço público por envolvimento em irregularidades, os quais foram enquadrados na Lei da Ficha Limpa, ficando inelegíveis por oito anos. A depender da decisão do Supremo, eles poderão tentar, na Justiça, a reabilitação de seus direitos para o exercício de cargos públicos.
Conforme o caso, parlamentares cassados, condenados e até presos podem tentar a recuperação de seus direitos políticos e até a voltar a receber remuneração dos cofres públicos, a exemplo de um ex-deputado petista pelo Paraná, que está preso em Curitiba, por corrupção, e foi cassado em dezembro de 2014.
Um especialista em Direito Público e doutor em Direito Civil Comparado afirmou que “Em ações de improbidade administrativa, ou mesmo de infrações penais, você tem como consequência o afastamento do cargo e inabilitação. Abrir um precedente, a meu ver, é perigosíssimo em termos de instabilidade. Em tese, todos aqueles que de alguma maneira passaram por um processo semelhante poderiam reclamar esse direito”.
Outro jurista disse que o entendimento do Senado “Cria um precedente brutal. Pela Constituição, é indissociável a punição de perda dos direitos políticos. O efeito da sentença é justamente esse. Não pode alguém cometer um crime de responsabilidade e ser novamente eleito na eleição seguinte”.
Um respeitado jurista afirmou que o Supremo pode decidir declarar a inconstitucionalidade apenas para os casos vindouros, evitando anular a votação do impeachment, uma vez que, “Na eventualidade de alterar e considerar inconstitucional teria de expelir nova votação, e isso estabeleceria o caos absoluto. A essa altura, eu tenho a impressão de que é inconstitucional, mas a competência é do Senado”.
Já um professor de Direito disse que “Mesmo que não haja a aplicação da separação para casos de outros políticos, esse se torna um forte argumento para os parlamentares tentarem mudar a Lei da Ficha Limpa, grande conquista da sociedade.”.
Nos bastidores do Supremo, há o clima segundo o qual a avaliação dos ministros é de que não haverá interferência no julgamento do Senado, mas o forte desejo dos juristas é o de que bastaria a Excelsa Corte tão somente fazer o dever de casa de se manter a lógica do resultado do impeachment da petista e anular a segunda votação que manteve, de forma indevida, os direitos dela, como forma de harmonização do texto constitucional com a realidade fática e de se permitir que a Constituição possa respirar soberanamente aliviada do solavanco provocado por conveniência absolutamente injustificável.
É evidente que a Suprema Corte de Justiça do país não pode fechar os olhos para barbárie contra o ordenamento jurídico pátrio, sob pena de ter a sua reputação tripudiada e forçosamente ela se equipara às mentalidades pobres e pouco preocupadas com o aperfeiçoamento dos princípios jurídicos.
Convém que ainda seja sopesada a incumbência institucional de a Excelsa Corte zelar pelo fiel cumprimento dos princípios constitucionais, conquanto compete exclusivamente a ela, entre outras relevantes atribuições, a correção dos graves erros na aplicação dos dispositivos da Carta Magna, notadamente quando se trata de caso que pode abrir grave precedente prejudicial à segurança jurídica, o que é absolutamente inconcebível em país civilizado e cônscio da sua responsabilidade quanto à imperiosa necessidade do aperfeiçoamento do ordenamento jurídico. Acorda, Brasil! 
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
Brasília, em 15 de setembro de 2016

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