Na
Argentina, um açougueiro perseguiu e matou um ladrão que o tinha assaltado no
seu estabelecimento comercial e levado o dinheiro do caixa, fato que
intensificou a polêmica sobre atos de "justiça
feitos com as próprias mãos".
O
açougueiro foi solto depois de quatro dias preso, em meio a apelos da
população, de seus familiares e até mesmo do presidente do país.
Dias
antes desse episódio, também na Argentina, um médico havia matado, com quatro
tiros, um assaltante que tentara roubar seu carro, no momento em que saía do
consultório.
Os
dois cidadãos disseram que se arrependeram da reação violenta que tiveram
depois de terem sido abordados pelos assaltantes.
Os
aludidos casos causaram enorme repercussão negativa naquele país, onde
episódios semelhantes estão acontecendo com frequência, deixando a população
perplexa e preocupada, diante do crescimento da insegurança, que obriga o
cidadão trabalhador perseguir o ladrão até a morte, quando isso seria
dispensável se houvesse maior participação da segurança pública da incumbência do
Estado, que se omite e termina sendo cúmplice com a criminalidade, que tem muita
facilidade para agir, de forma violenta contra a sociedade.
O
ministro da Justiça argentino disse que "Andar armado, fazer justiça com as próprias mãos ou praticar
linchamentos não são o caminho correto", tendo ressaltado que "desta vez quem morreu foi o delinquente, mas
muitas vezes quem morre é a vítima", dando a impressão de que tudo vai
continuar como antes, no quartel de Abrantes, principalmente porque a vítima
foi o criminoso, e nada será feito para, ao menos, minimizar o estado de
calamidade que grassa naquele país.
O
jornal La Nación ressaltou que "Ao menos que como sociedade queiramos
empreender o caminho sem retorno da lei da selva, não cabe outra postura que
não a defendida pelo ministro", tendo ressaltado o grau de estresse
que impactaram o açougueiro e o médico, que agiram sob forte emoção, resultado
do "altíssimo grau de impotência com
o qual muitos (Argentinos) vivenciam
o drama da insegurança e do baixo índice de condenações judiciais".
O
citado jornal disse que “a crise de
segurança só será contornada com mais policiamento nas ruas, mudanças legais e
mais efetividade do Poder Judiciário, se não quisermos que a justiça com as
próprias mãos substitua a justiça dos tribunais".
O
presidente da Argentina, em apoio aos movimentos de rua pedindo a liberdade do
açougueiro, disse que "Ele
(açougueiro) deveria estar com sua
família, tranquilo, tratando de refletir sobre tudo o que aconteceu, enquanto a
Justiça toma uma decisão".
Uma
ativista de direitos humanos daquele país afirmou que "É incorreto que jornalistas, políticos e até
o presidente opinem sobre esses casos. Os juízes se sentem pressionados. Além
disso, a vingança está sempre fora da lei. Eles (médico e açougueiro) dizem que se pudessem voltar no tempo, não
teriam feito o que fizeram. Não sei se é apenas estratégia da defesa, mas o que
fizeram é lamentável".
O
pai do suspeito do assalto apelou no sentido de que o açougueiro "Pague pelo que fez. Ninguém tem o direito de tirar a vida de outra pessoa. Não buscaremos
vingança. Será a justiça divina que assumirá esta responsabilidade".
O
câncer da criminalidade é mal que se infestou no mundo todo, com maior
predominância nos países cujos governos desprezaram, por completo, o dever constitucional
de cuidar da segurança e da ordem públicas, permitindo que a criminalidade se
organizasse e tomasse conta dos setores que deveriam ser dominados pelo
policiamento da incumbência constitucional do Estado, que não esboça o mínimo
esforço para reverter o quadro de precariedade existente no âmbito da segurança
pública, que padece de investimentos e de políticas prioritárias para combater,
com eficiência, a delinquência.
É
de se lamentar que a sociedade seja obrigada a agir em defesa própria, exatamente
em razão da indiscutível incompetência do Estado, que deveria priorizar
políticas referentes à saúde, educação e segurança pública, entre outras ações
públicas, como forma de melhorar a presença do Estado em setores essenciais às
melhorias das condições de vida da população.
É
evidente que o violento revide ao crime passou a ser natural, diante da
impotência e do estresse causados em razão da enorme falta de proteção da
incumbência constitucional do Estado, que até pode investir muito na segurança
pública, mas o faz com pouco efetividade e eficiência, permitindo que a
criminalidade se expanda sem resistência, ficando o povo à mercê da
delinquência, que cresce inversamente ao preparo da segurança que devia ser
disponibilizada para a garantia da proteção da sociedade e do seu patrimônio.
À
toda evidência, é notória a precariedade da segurança pública, que tem
propiciado inclusive que a população chegue ao ponto de decidir fazer justiça
com as próprias mãos, a exemplo dos casos que se sucedem com muita frequência,
quando, ao contrário disso, a Constituição obriga que o Estado proteja e dê
segurança à sociedade, por meio dos mecanismos instituídos e mantidos na forma
da lei.
Urge
que os brasileiros se conscientizem sobre a necessidade de se exigir que as
autoridades incumbidas das políticas de segurança pública priorizem medidas
capazes de transformar a situação de lamúria e de precariedade de proteção em plena
garantia de condições capazes de reduzir a criminalidade e de assegurar que a justiça
seja feita somente pelas instituições legalmente incumbidas desse mister, tudo
na forma dos ditames constitucionais. Acorda, Brasil!
ANTONIO
ADALMIR FERNANDES
Brasília,
em 24 de setembro de 2016
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