sexta-feira, 2 de dezembro de 2016

Estímulos à corrupção e à impunidade

O Congresso Nacional, em demonstração de desespero, contra-ataca com verdadeiro arsenal de projetos de leis que objetivam blindar os congressistas contra as investigações da Lava Jato, à semelhança do que já aconteceu na Itália, com as investigações da Operação Mãos Limpas.
A pressa para aprovação de paredão no Congresso contra as investigações corre contra o tempo, na tentativa de se opor às confissões em massa de executivos da empreiteira Odebrecht, que vêm sendo consideradas ponto nevrálgico do megaescândalo que envolve muitos homens públicos importantes, como parlamentares, governadores e políticos de quilate superior, acusados de desvio de bilhões de reais dos cofres públicos.
Os congressistas tentam, sem o menor escrúpulo, não somente proteger os corruptos que estão em atividade, mas limitar as ações do Ministério Público e da Justiça, com medidas de intimidação e de restrição do trabalho comprovadamente proveitoso para o interesse público, em contrariedade à mentalidade inescrupulosa de parlamentares, que estão agindo deliberadamente em defesa de seus interesses.
A propósito da motivação do Congresso, o presidente da Associação de Juízes Federais do Brasil disse que "Quanto mais se aproximam as investigações de quem está no poder, mais reações surgirão. Se a impunidade perder força, aqueles que se imaginavam imunes à justiça criminal buscarão criar mecanismos que impeçam a continuidade da investigação".
Não à toa que a Câmara de Deputados detonou o projeto que versava sobre importantes medidas contra a corrupção objeto das investigações da Operação Lava-Jato, que, de forma paradoxal, houve a aprovação pelos deputados para investigação e punição aos investigadores e à Justiça, em razão de possível abuso de autoridade, evidentemente no caso de denúncia contra corrupto, que passam a ter o direito à imunidade, à impunidade e ao poder de punir aquelas autoridades.
Caso seja aprovada pelo Senado Federal a nova versão sobre a censura aos investigadores e à Justiça, os congressistas corruptos podem ficar a salvo das investigações, inclusive da Lava-Jato e do julgamento da Justiça, na expectativa da sua isenção de culpa e da punição aos agentes públicos incumbidos das investigações.
O procurador-geral da República advertiu para que o país não esqueça as lições da megainvestigação de corrupção na Itália, ao lembrar as 13 medidas aprovadas pelo Parlamento italiano para abalar a operação "Mani pulite", pondo pá de cal nas investigações e no julgamento dos corruptos italianos, em benefício da impunidade, tal qual como pretendem a maioria dos corruptos que estão no Congresso brasileiro.
O relator do pacote anticorrupção já previa, bem antes do golpe ao combate à corrupção dado pela Câmara, o nervosismo dos deputados com a iminência da aprovação da delação da Odebrecht, tendo dito: "Sem dúvida alguma isto preocupa e talvez explique as tentativas de limitar as investigações. Há muitas pessoas que têm problemas com a Lava Jato".
Enquanto isso, o presidente do Senado Federal não disfarça a irritação contra a Polícia Federal, o Ministério Público e a Justiça Federal, depois que foram presos quatro policiais legislativos, por suspeitas de realização de varreduras de interesse particular de senadores.
Após o citado incidente, o senador alagoano, que é réu e responde a outros onze processos no Supremo Tribunal Federal, a maioria relacionada com a sua ligação na roubalheira na Petrobras, apresentou projeto de sua autoria para punir "abusos de autoridade" de agentes públicos e pediu o corte nos pagamentos das aposentadorias de membros do Poder Judiciário que tenham cometido faltas contra a administração pública.
Não há dúvida de que a proposta do presidente do Senado tem por objetivo possibilitar a criminalização de juízes, em função do seu eficiente trabalho, que passa a ser censurado e acompanhado em se tratando do envolvimento de políticos.
A personalidade do presidente do Senado já é bastante conhecida exatamente em razão de seus atos, alguns dos quais são objeto de exame pelo Supremo, há bastante tempo, e todos tratam do envolvimento dele em atos irregulares, nada compatíveis com o exercício de cargos públicos, quanto mais com o que diz respeito à presidência daquela casa legislativa, que deve ser ocupada por pessoa de conduta ilibada, chamada ficha limpa, em respeito aos princípios da dignidade, moralidade e legalidade, entre outros.
À vista das denúncias sobre a prática de irregularidades amontoadas no Supremo contra o presidente do Senado, fica claro que as atitudes dele contra a Polícia Federal, o Ministério Público e a Justiça Federal se destinam exclusivamente a resultar em algo que possa livrá-lo das investigações e dos processos em andamento na Justiça, ficando evidente também a sua índole nada republicana, por não visar à satisfação do interesse público, mas sim às suas finalidades pessoais e políticas, conforme mostram os fatos.
A sociedade espera piamente que os demais senadores tenham responsabilidade e dignidade cívicas de compreender a delicadeza do grave momento, em que uma pessoa insensata e insensível tenta mobilizar o Senado para aprovar medidas em seu favor, porém elas são conflitantes com os sentimentos de moralização perseguidos pelos brasileiros.
O certo é que jamais uma pessoa com os predicativos apinhados de máculas por denúncias de corrupção teria condições de comandar a casa legislativa da maior relevância do país, cujos integrantes têm a responsabilidade de não dar respaldo às absurdas medidas de iniciativa que tem por objetivo somente estimular a corrupção e a impunidade, tão repudiadas pelos brasileiros, que anseiam desesperadamente pela moralização do país.
Convém que a sociedade se mantenha em eterna vigilância, ficando atenta às manobras que possam ser perpetradas pelos congressistas, diante da sua disposição de impedir que os fatos delituosos possam ser investigados, os corruptos não sejam condenados e se dê basta à impunidade, com injustificável prevalência do estímulo aos atos delitivos, para o gáudio dos maus políticos, que fazem da vida pública atividade profissional em defesa de seus interesses pessoais, em detrimento das verdadeiras causas nacionais. Acorda, Brasil! 
ANTONIO ADALMIR FERNANDES

Brasília, em 02 de dezembro de 2016

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